Denise Alves Fungaro: vida, desafios e a Química como lugar de representatividade negra

Este texto biográfico é fruto da pesquisa em andamento que faz parte do projeto de extensão “Cientistas negras brasileiras: visibilidade na Química e na Física”, desenvolvido no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro, campus Nilópolis, na Baixada Fluminense. A escolha da pesquisadora Denise Alves Fungaro, cientista, negra, mulher e mãe, se deu a partir do estudo de sua trajetória acadêmica e profissional, visto que desenvolve um trabalho de excelência na área da Química. O artigo foi elaborado a partir de dados encontrados em seu currículo Lattes e de uma ampla entrevista formada por trinta e cinco perguntas que buscou conhecer melhor sua história e conquistas. A entrevista foi realizada por uma plataforma de videoconferência e durou cerca de uma hora e quarenta minutos. A entrevista ocorreu em tom de conversa e foi muito proveitoso ouvir a pesquisadora relatar sobre sua trajetória de vida, assim como suas experiências profissionais.

Denise Alves Fungaro é pesquisadora do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN-CNEN/SP) de São Paulo. Nasceu na cidade de São Paulo, em agosto de 1959. A sua família era de classe média baixa. Os seus pais tiveram pouco acesso à escola, e concluíram apenas o ensino primário. No entanto, observando a dedicação de Denise pelos estudos, não pouparam esforços para que ela pudesse se formar, dando todo o suporte necessário. Sua mãe desenvolveu diversos trabalhos para ajudar no orçamento familiar, como lavar roupa e cozinhar para outras pessoas e seu pai era zelador de um prédio no centro de São Paulo.  

Denise não teve muitos amigos por morar em um prédio que, diferentemente dos atuais, não dispunha de um pátio de lazer. Em casa, ou com os primos da mesma idade, gostava de brincar com objetos que despertam a curiosidade, como montar e desmontar peças, olhar para o céu e pensar como seria se tivesse uma luneta, além de gostar de misturar substâncias em pequenos potes e imaginar a construção de um robô com alguns ferros e outros utensílios.

Muito estudiosa, frequentou escolas públicas durante toda a educação básica. Gostava muito de matemática e de português, principalmente de escrever e ler. Em 1970, quando iria cursar a quarta série primária, hoje 5º ano do ensino fundamental, seus pais resolveram matriculá-la em uma escola no centro de São Paulo, na Praça da República que era mais próxima de sua residência, podendo ir sozinha para que tivesse mais autonomia. A troca de escola não foi uma tarefa simples para a época, pois, de acordo com o estudo de Barreto (2001), a legislação da Secretaria de São Paulo, em 1968,

promoveu a reorganização do currículo da escola primária em dois ciclos: o nível I, constituído pelas 1ª e 2ª séries e o nível II, pelas 3ª e 4ª séries, com o exame de promoção somente na passagem do 1º para o 2º nível e ao final deste. As notas deveriam ter caráter exclusivamente classificatório para fins de reagrupamento dos alunos em classes no ano seguinte. (BARRETO, 2001, p. 106).

 

Com este cenário posto, não era permitido trocar de escola pública, então, o pai de Denise recorreu a um assessor do governador, que residia no prédio onde trabalhava. Ele escreveu uma carta de “recomendação” e Denise conseguiu ser matriculada. Neste ano, a mãe de Denise cortou o seu cabelo bem curtinho para agilizar os preparativos para a ida à escola. Isso fez com que os novos colegas de sala “implicassem” com ela, a chamando de “homenzinho”. Embora a professora defendesse Denise das implicâncias dos novos colegas, esse fato foi um marco para sua vida. A mudança de escola, a construção de outras amizades, a nova imagem de si mesma, por ter um cabelo crespo e muito curto, foram novos desafios vivenciados.

Além destes desafios, quando ingressou na nova escola, Denise sentiu muita dificuldade em acompanhar as aulas, pois as matérias não eram as mesmas da escola anterior. Este dado é interessante, pois a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº4.024, de 20 de Dezembro de 1961, não previa um núcleo comum de disciplinas e conteúdos. Por tal razão, cada escola tinha a liberdade de trabalhar com os conteúdos que desejasse. A exigência do núcleo comum para todas as escolas só se deu na Lei nº 5.692, de 11 de agosto de 1971, que definiu o seguinte:

Art. 4º Os currículos do ensino de 1º e 2º graus terão um núcleo comum, obrigatório em âmbito nacional, e uma parte diversificada para atender, conforme as necessidades e possibilidades concretas, às peculiaridades locais, aos planos dos estabelecimentos e às diferenças individuais dos alunos (BRASIL, 1971).

Denise não usufruiu desta mudança, pois somente anos depois os currículos sofreram alterações. Desta forma, com dificuldades em acompanhar os novos conteúdos, precisou ter aulas particulares para não fracassar na escola. As aulas eram pagas e  quem as ministrava era a própria professora da turma, no contraturno escolar. As dificuldades mostraram que Denise deveria se esforçar ainda mais para acompanhar a turma e honrar todo o esforço de seus pais. Ela continuou na mesma escola, e fez provas para ingressar no Colegial, hoje equivalente ao Ensino Médio. 

Na adolescência, Denise não ia a festas ou eventos, preferia ler livros de diversos gêneros, sendo o seu favorito os de mistério, como por exemplo, os da autora Agatha Christie. Quando ingressou no ensino médio, começou a estudar Química, mas não teve aulas contínuas e por vezes diversas disciplinas ficaram sem professores. Esta realidade é explicada pelo contexto histórico da Ditadura Militar brasileira. De acordo com Ferreira e Bittar (2006):

 

A combinação entre crescimento quantitativo, formação acelerada e arrocho salarial deteriorou ainda mais as condições de vida e de trabalho do professorado nacional do ensino básico, tanto é que o fenômeno social das greves, entre as décadas de 1970 e 1980, teve como base objetiva de manifestação a própria existência material dos professores públicos estaduais de 1º e 2º graus (FERREIRA e BITTAR, 2006, p. 1166).

 

O perfil dos professores mudou durante este período. O arrocho salarial contribuiu para que muitos desistissem da profissão, deixando lacunas nas salas de aula. Além disso, a proletarização do magistério significou o empobrecimento econômico e a depauperação do capital cultural que o professor possuía. Conforme Ferreira e Bittar (2006, p. 1162), “a velha formação social composta de profissionais liberais – como advogados, médicos, engenheiros, padres etc. – constituía um cabedal cultural amealhado em cursos universitários de sólida tradição acadêmica”. Diferentemente, o magistério, durante a Ditadura Militar, passou a ter em seus quadros professores formados em licenciaturas instituídas pela reforma universitária em cursos aligeirados de formação, com graves consequências culturais. Este cenário também contribuiu para a baixa qualidade na educação do ensino básico e público neste período.

Quando foi para o terceiro ano do ensino médio, Denise sentiu dificuldade nas matérias pela constante ausência de professores e as greves que ocorreram nos anos finais da década de 1970.  Pensava em fazer a graduação em alguma área da ciência, mas não tinha nada definido. Seus gostos voltavam-se para Biologia e Química. Denise tinha receio da reprovação no vestibular, já que não estava cursando um ensino médio que lhe dava condições para o concurso. Como não era o universo de seus pais, não teve orientações para melhor definir qual área gostaria de estudar, mas entendia que precisava ser aprovada na Universidade de São Paulo (USP), por ser uma instituição pública e, principalmente, gratuita. 

Com algumas lacunas de aprendizagem deixadas durante o ensino médio, pela falta de professores e pela baixa qualidade na educação, Denise fez um curso pré-vestibular para concorrer com melhores condições. Com sacrifício, seus pais financiaram seu curso por um ano e foi aprovada na USP. Sua escolha sempre foi voltada para a ciência e com este objetivo escolheu o curso de Bacharelado em Química com atribuições tecnológicas. Vale o destaque para o fato do curso escolhido estar em um ambiente novo, com propostas que deveriam prever as exigências legais da época. Em um documento do Instituto de Química da USP, é relatado que, “considerando o momento histórico da época, a nova instituição, com um espírito comunitário e integrador, se coloca um grande desafio expresso no seu lema Scientia Vinces, ou seja, vencerás pela Ciência” (Instituto de Química, 2013, p. 9).

Denise, a única jovem negra aos 18 anos de idade, em um curso com propostas inovadoras, ingressou na Universidade de São Paulo em 1978 e teve outros desafios a vivenciar no processo educativo. Mais uma vez ela afirma que teve dificuldade no primeiro ano do curso porque não teve todos os conteúdos referentes à Química no ensino médio e precisou estudar muito para tirar o mínimo da nota exigida. Outra questão é que, como Denise morava longe da universidade, tinha que pegar dois ônibus e, por ser um curso integral, não podia trabalhar. As realidades vividas por Denise retratam as relações educacionais desiguais vividas por brasileiros e brasileiras de diferentes classes sociais. Sobre esta questão convém destacar a pesquisa de Passos e Gomes (2012) quando relatam sobre as relações entre sistema de ensino e as classes sociais. Nesta citação, traz uma análise a partir da realidade de camadas populares. Destaca que,

O ingresso no ensino superior, por exemplo, ocorre entre aqueles que se dedicam aos estudos e reconhecem o valor e a importância que tem a escolarização. Durante o percurso escolar, esses estudantes precisam vencer as limitações e as desvantagens que advêm da atmosfera cultural de seu meio (PASSOS e GOMES, 2012, p. 257).

É importante ressaltar, e acrescentar, que o sucesso da escolarização não é obtido apenas por ultrapassar barreiras individuais. O apoio financeiro dos pais de Denise colaborou para que ela se mantivesse no curso integral. Este fato fez muita diferença para a continuidade dos estudos.

Quanto à questão de gênero, Denise lembra que, na sua turma, o número de mulheres era equivalente ao de homens, porém ela era a única aluna negra a ingressar e a se formar em 1983. No contexto que Denise viveu é interessante reforçar que, conforme aponta Leta (2003):

Apesar da recente institucionalização da ciência brasileira, foi também nos anos de 1980 e 1990 que as mulheres brasileiras aumentaram sua participação no setor. A falta de dados sistemáticos no Brasil sobre a formação e o perfil dos recursos humanos na educação superior e na ciência, assim como a falta de dados sobre o financiamento do setor dificultam muito a contextualização dessa discussão” (LETA, 2003, p. 274).

Fazendo um paralelo, através de plataformas de registro de dados como a Plataforma Lattes, podemos verificar que, na atualidade, muitas mulheres já ultrapassaram os homens no quesito de obtenção de títulos de Doutorado em diversas áreas. De acordo com a plataforma, em 2015, tivemos o percentual de 52% de mulheres Doutoras em Química, contra 48% de homens no Brasil. Entretanto, o parâmetro de análise é somente o de gênero, pois a plataforma não disponibiliza dados numa perspectiva racial. Para complementar esta informação, o estudo realizado no mesmo ano, com dados do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), revelou que apenas 7% das pesquisadoras com bolsa de Produtividade em pesquisa do CNPq eram negras (TAVARES et al, 2015). Portanto, é possível constatar, a partir dos dados destas duas fontes, que embora o número de mulheres na área da Química tenha crescido nas últimas décadas, a proporção de mulheres negras ainda é inferior. Logo, Denise faz parte desta estatística.

No último ano da graduação, Denise fez iniciação científica. Porém, não foi possível continuar, pois o volume de leituras e o tempo necessário para as atividades de pesquisa conflitavam com o curso, que era integral. Foi pragmática e dedicou-se apenas ao currículo. Após a conclusão da graduação do curso de Bacharelado em Química com atribuições tecnológicas e em Licenciatura em Química (neste período era possível se graduar nos dois tipos de curso), tinha grande expectativa de conseguir um emprego, visto que, de acordo com seu depoimento, “fez a graduação em uma excelente universidade”. Mas a realidade não foi essa. Denise não encontrou emprego. Quando concluiu, em 1983, havia poucas empresas de Química em São Paulo, a maioria era multinacional onde, neste período, não havia iniciativa para a promoção da equidade de gênero.

Neste contexto, dialogando com Leta (2003), identificamos que houve crescimento da participação de mulheres nas atividades de Ciência e Tecnologia, mas as chances de sucesso e reconhecimento na carreira ainda eram reduzidas na década de 1980.

Dessa forma, sem acesso ao mercado de trabalho nas empresas privadas, Denise precisou de outra estratégia para se manter financeiramente. Então decidiu ingressar no Mestrado em Química Analítica na USP e a bolsa passou a ser sua renda durante esse período. No curso de Mestrado sua pesquisa teve como objeto de estudo as reações eletroquímicas. Em sua dissertação, foi avaliada a síntese do complexo de cobalto monovalente e dipiridila, pela reação do complexo de cobalto divalente e dipiridila com borohidreto de sódio, caracterizando a formação do complexo em meio aquoso, com a utilização de técnicas eletroquímica e espectrofotométrica.  

Denise decidiu seguir pela carreira acadêmica, e logo após terminar o Mestrado, em 1988, adentrou o Doutorado em Química Analítica. O seu tema de pesquisa foi complementar ao do Mestrado. Investigou o mecanismo da reação de síntese do complexo de cobalto monovalente e dipiridila, em meio aquoso e não aquoso, envolvendo a reação catalítica de redução química acoplada com a reação eletroquímica. Recebeu pela USP o título de Doutora em Química, em 1993.

Enquanto não abria concurso público, se dedicou a sua preparação e em 1995, foi aprovada para o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN-CNEN/SP). Assim, iniciou sua carreira como pesquisadora e orientadora de Pós-graduação. 

Ao ingressar, o IPEN estava reorganizando um Centro de Pesquisa e, atentado às exigências, discussões e aos recursos da época, foi dada ênfase às questões que envolviam o meio ambiente. Neste cenário, alguns dos pesquisadores se empenharam em desenvolver projetos de pesquisas nessa área, por conta dos recursos e investimentos disponíveis. Este foco de pesquisa é justificado, conforme o contexto econômico apontado a seguir:

Em 1992 realizou-se, na cidade do Rio de Janeiro, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (Cnumad), conhecida como “Rio-92” ou “Cúpula da Terra”, abordando a questão ambiental em âmbito público de maneira nunca antes feita, culminando com a publicação de documentos que sintetizaram as preocupações dos povos do planeta com relação à questão ambiental (Hogan 2007). (POTT e ESTRELA, 2017, p. 275).

Nesse mesmo período, Denise teve contato com outros pesquisadores que indicaram um professor da Universidade de Coimbra que estava desenvolvendo um sensor capaz de detectar poluentes em água, e se interessou pelo projeto. A pesquisadora entrou em contato com o professor e submeteu um projeto para a Fundação de Apoio à Pesquisa de São Paulo (FAPESP), para que tivesse recursos para o desenvolvimento da pesquisa. Seu projeto foi aprovado, e em 1997, Denise iniciou o pós-doutorado na área de Eletroquímica aplicada ao Meio Ambiente, na Universidade de Coimbra.

Na época da realização do pós-doutorado, Denise era solteira e morava com sua mãe e seu pai infelizmente já havia falecido. Para a pesquisadora, o pós-doutorado foi uma experiência fantástica, que a possibilitou aprofundar seus conhecimentos e realizar pesquisa e, além disso, teve a oportunidade de conhecer países da Europa. Já no final do pós-doutorado, no período de férias, ela conseguiu levar a sua mãe para conhecer outros países, como uma forma de retribuir todo o esforço durante sua trajetória escolar. Ter acesso a essa oportunidade foi algo que, para Denise, só o estudo foi capaz de proporcionar. 

Um ano depois, quando retornou do pós-doutorado, a cientista deu prosseguimento à linha de pesquisa relacionada à eletroquímica aplicada ao meio ambiente e para isso foi necessária a aquisição de equipamento importado. Durante o período de espera dos trâmites de compra, iniciou uma segunda linha de pesquisa paralelamente. A linha de pesquisa na área de eletroquímica após certo tempo foi direcionada para outros pesquisadores do Instituto em colaboração e a segunda linha de pesquisa tornou-se a principal.

A linha de pesquisa “Desenvolvimento de Materiais de Valor Agregado¹ a partir de Resíduos: Caracterização e Aplicação Ambiental”, coordenada por Denise, é desenvolvida até os dias atuais, junto com uma equipe de orientandos constituída por pós-doutorandos, doutorado, mestrado, alunos de iniciação científica e estágio.

A pesquisa tem como objetivo o desenvolvimento de materiais de valor agregado a partir de diferentes tipos de resíduos (coprodutos de combustão do carvão; cinzas do resíduo de cana de açúcar; resíduos agrícolas; resíduo da indústria terciária de alumínio, entre outros). A primeira etapa consiste na síntese e caracterização dos materiais obtidos a partir das diferentes matérias-primas. A segunda etapa é direcionada à avaliação do uso dos materiais de valor agregado produzidos em diversas aplicações ambientais, tais como: material adsorvente no tratamento de efluente aquoso e na captura e sequestro de carbono, biocarvão em telhado verde, adição em matriz cimentícia, entre outros. 

A sua trajetória, marcada pela inovação na pesquisa em seu campo, proporcionou efetivamente para o recebimento de prêmios. Os projetos relacionados a linha de pesquisa de Denise, a levaram a receber diversos prêmios, conforme descritos no quadro a seguir:

Prêmio Título do trabalho Ano da premiação
BRAMEX Ambiental da Câmara de Indústria, Comércio e Turismo Brasil-México “Contribuição à preservação ambiental em região de complexo carboelétrico” 2005
Prêmio Fernando Cerviño Lopes – Novas Técnicas de Reciclagem do Sindicato dos Profissionais de Química de São Paulo “Sistema de tratamento de efluentes e resíduos sólidos oriundos da indústria hidrometalúrgica e baterias exauridas” 2005
Troféu “Raça Negra” outorgado pela ONG AFROBRAS (Sociedade Afrobrasileira de Desenvolvimento Sócio Cultural) Categoria “Conjunto da Obra” (considerando os valiosos préstimos à causa da cidadania e em especial o da educação) 2006
Prêmio Internacional da Água de Cannes (França) da UNESCO “Zeolite synthesized from fly ash as an adsorbent to the decontamination of wastewater” 2006
Prêmio Fernando Lopez Cerviño- Novas Técnicas de reciclagem – Sindicato dos Químicos, Químicos Industriais e Engenheiros Químicos do Estado de São Paulo  “Reciclagem de resíduos gerados em usina termelétrica para aplicação na remoção de corante em água” 2007
1ª Edição Prêmio FIEMA na Feira Internacional de Tecnologia para o meio ambiente em – Bento Gonçalves, Rio Grande do Sul “Ecomaterial: desenvolvimento e aplicação de zeólita sintetizada a partir de cinzas de carvão na remediação de efluentes e solos contaminados” 2008
1° Prêmio Enfil de Inovação em Tecnologia Ambiental  Categoria Dissertação: “Desenvolvimento de tijolos com incorporação de cinzas de carvão e lodo provenientes de estação de tratamento de água” 2013
Premio “Best student research poster in ecotoxicology”. Congresso SETAC Australasia – Melbourne  “Removal of Colour and Reduction of Toxicity in Reactive Dyes Using Zeolites From Coal Fly Ash. Doutorado de Patricia Cunico Ferreira orientada pela pesquisadora Dra Denise Alves Fungaro 2013
Prêmio “Kurt Politzer de Tecnologia e Inovação” da Associação Brasileira de Indústria Química Produção de Sílica Gel e Nanosílica de Alta Pureza a partir de Cinzas da Biomassa de Cana-de-Açúcar com Alto Potencial de Comercialização 2016
Certificado de Reconhecimento como “Amiga do International Workshop on Advances in Cleaner Production” (IWACP) Apresentação de artigos em todos os eventos do IWACP com Menção Honrosa. 2017

Quadro 1: Relação de prêmios obtidos e anos de premiação. Fonte: currículo Lattes

A cientista afirma que o recebimento de prêmios é um incentivo à continuidade do trabalho e à valorização de toda uma equipe que se dedica nos projetos de pesquisa, onde as dificuldades são superadas. Tais prêmios representam valor para a comunidade científica e acadêmica. 

O objetivo da linha de pesquisa de Denise também é que os estudos saiam de dentro dos laboratórios para chegarem às indústrias, colaborando para a geração de empregos e a formação de recursos humanos de alto padrão. Denise, como mulher negra cientista, traz em sua história desafios para estudar, se aprimorar e fazer a diferença dentro da sua área de formação. Quando recebe prêmios, possibilita que outras jovens negras possam se inspirar e considerar que é possível ser uma cientista.

Além dos prêmios recebidos por seus estudos, a pesquisadora também possui patentes de inovação, que foram submetidas a pedido de depósito entre os anos de 2008 e 2017, identificados no quadro a seguir:

Patente Ano
“Zeólitas de cinzas de carvão e sua utilização como material adsorvente de íons metálicos em efluentes e na remediação de solo” 2008
“Compósito Magnético baseado em zeólitas de cinzas de carvão e sua utilização como material adsorvente de íons metálicos em efluentes” 2008
“Zeólitas de cinzas de carvão e sua utilização como material adsorvente para remoção de corantes em efluentes”. 2008
“Zeólita de cinzas de carvão modificada por surfactante como material adsorvente, seu processo de preparação e sua utilização” 2010
“Compósito magnético de zeólita e Processo para preparação” 2011
“Compósito magnético de zeólita de cinzas de carvão como material adsorvente para remoção de corantes em efluentes” 2013
“Nanomaterial adsorvente a partir de resíduo proveniente do sistema de dessulfurização dos gases de combustão por via semi-seca: Processo de preparação e aplicação” 2016
“Cdzfa-1 – Compósito de cinzas de carvão modificado com beta ciclodextrina” 2016
“Processo de produção de nanosílica a partir de cinzas de resíduo de cana-de-açúcar” 2017

Quadro 2: Relação dos pedidos de depósito de patente de acordo com o ano. Fonte: Currículo Lattes

Denise hoje é casada e tem uma filha de 9 anos, atua no IPEN há 25 anos e está à frente de diversos projetos de pesquisa. Chama a atenção o fato relatado pela pesquisadora, de que durante todo esse tempo de trabalho, ela teve apenas dois orientandos negros. Uma questão que colabora para voltarmos ao tempo, quando ingressou na graduação na USP, onde ela era a única aluna negra no curso de Bacharelado em Química, em 1979.  A reflexão a ser feita é pensar as razões pelas quais as pessoas negras não estão em determinados espaços acadêmicos.

Pensando em uma discussão racial, Denise afirma que não tinha parado para pensar em preconceitos ou racismo vivenciados durante sua trajetória escolar, acadêmica e profissional, até participar de um evento realizado em 2008 pela Sociedade Brasileira de Progresso para Ciência (60ª. Reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – Mesa Redonda: “O Negro e a Ciência no Brasil”) junto com outra pesquisadora da área de Física. Ao estudar sobre o assunto, Denise afirma ter feito um “exercício” de relembrar seu percurso na escola e na USP. Constatou que durante todos os anos de formação não teve professores negros ou professoras negras, única aluna negra na graduação e na pós-graduação. Questionou durante a entrevista: “Se estes alunos e alunas negros estão matriculados nos cursos, hoje em dia, por que não fazem parte dos grupos de pesquisas?”.

Denise a partir destas reflexões, passou a dar atenção e a acompanhar o trabalho de pesquisadores que se dedicam a esse tema. Afirma que agora tem um olhar crítico sobre questões que envolvem relações raciais e educação.

A ausência de pessoas negras em diversas áreas de formação e em determinadas profissões reflete o racismo que faz parte da estrutura de nossa sociedade, conforme aponta   Almeida (2019) quando afirma que o racismo fornece sentido, a lógica e a tecnologia para a reprodução das formas de desigualdade e violência que moldam a vida social contemporânea.

Nesse contexto, Denise é uma das poucas pesquisadoras negras do Brasil, que desenvolve projetos e pesquisas na área da Química, extremamente relevantes para a nossa sociedade. Contar esta história e fazer este registro busca dar visibilidade a esta mulher que pode ser inspiração para meninas e jovens negras que estão nos bancos escolares, com livros didáticos de Química que trazem exemplos de cientistas homens e brancos. Uma Química que ainda se mostra como algo inatingível, para poucos, ou para os “iluminados”. Denise mostra, com sua história de vida, que mulheres negras nas ciências precisam ser conhecidas, lidas, estudadas e divulgadas em busca de novas referências para as próximas gerações. 

 

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Sílvio Luiz de. Racismo Estrutural. São Paulo: Sueli Carneiro; Pólen, 2019.

BARRETTO, Elba Siqueira de Sá. MITRULIS Eleny. Trajetória e desafios dos ciclos escolares no País. Revista estudos Avançados 15 (42), 2001.

 

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, LDB. 4.024, de 20 de Dezembro de 1961.

 

_______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, LDB. 5.692, de 11 de Agosto de 1971.

 

FERREIRA JR., Amarilio; BITTAR, Marisa. A ditadura militar e a proletarização dos professores. Educ. Soc. , Campinas, v. 27, n. 97, p. 1159-1179, dezembro de 2006. 

 

FUNGARO, Denise A. Disponível em: < http://lattes.cnpq.br/8846838825034067>. Acesso em 28/05/2020

 

Instituto de Química: Universidade de São Paulo:  2013 / Universidade de São Paulo. Instituto de Química; coordenação de: Frank Herbert Quina. São Paulo: Instituto de Química, 2013. Disponível em http://www3.iq.usp.br/uploads/tinymce/usuario108/iq2013.pdf. Acesso em 07 de junho de 2020.

 

LETA, Jacqueline. As mulheres na ciência brasileira: crescimento, contrastes e um perfil de sucesso. Estud. av.,  São Paulo,  v. 17, n. 49, p. 271-284,  Dec.  2003.   

 

PASSOS, Guiomar de Oliveira, GOMES Marcelo Batista. Nossas escolas não são vossas: as diferenças de classes. Educação em Revista. Belo Horizonte. v.28 n.02, p.347-366. jun. 2012

 

POTT, Crisla Maciel; ESTRELA, Carina Costa. Histórico ambiental: desastres ambientais e o despertar de um novo pensamento. Estudos av.,  São Paulo,  v. 31, n. 89, p. 271-283,  Apr.  2017.   

 

TAVARES, Isabel; BRAGA, Maria Lúcia de Santana; LIMA, Betina Stefanello. As negras e os negros nas bolsas de formação e de pesquisa do CNPq, 2015. Disponível em: <http://www.cnpq.br/documents/10157/66f3ea48-f292-4165-bf7b-8d630bdc8f9f>.


 ¹De acordo com a pesquisadora, entende-se por material de valor agregado, o produto de reaproveitamento de resíduos de processos industriais e agrícolas, que pode ser aplicado em inúmeras aplicações ambientais. Dessa forma, diminuindo os impactos ambientais causados pelo descarte indevido na natureza.

 

** ESTE ARTIGO É DE AUTORIA DE COLABORADORES OU ARTICULISTAS DO PORTAL GELEDÉS E NÃO REPRESENTA IDEIAS OU OPINIÕES DO VEÍCULO. PORTAL GELEDÉS OFERECE ESPAÇO PARA VOZES DIVERSAS DA ESFERA PÚBLICA, GARANTINDO ASSIM A PLURALIDADE DO DEBATE NA SOCIEDADE. 

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