Héteros fazendo papel de gays são mais frequentes que gays interpretando héteros

De Daniel Day Lewis a Oscar Magrini, muitos atores héteros já viveram gays no cinema, na TV e no teatro. O que não é banal, muito menos tendência, são atores homossexuais encarnando personagens heterossexuais

por Reinaldo Glioche

Mesmo no teatro, espaço mais aberto para experimentações, são raros os casos de atores gays interpretando papeis de héteros. Por que isso ocorre? Sean Hayes, o Jack do finado (e saudoso) seriado “Will & Grace”, motivou um polêmico artigo na revista Newsweek em 2010 ao viver na Broadway um tipo rústico e mulherengo na peça “Promises, Promises”. Na avaliação do articulista Ramin Setoodeh, Hayes falhava em convencer como um tipo macho e sedutor simplesmente porque sabíamos de antemão de sua homossexualidade. Para Setoodeh, a homossexualidade é parte do charme de Hayes e nesse aparente elogio, o articulista vê o ator confinado a certo perfil de personagem gay.

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O bonitão Matt Bomer vive um heterossexual na série “White Colar”, mas ele já integrava o elenco da série antes de anunciar publicamente sua homossexualidade. Boatos maldosos em Hollywood dizem que ele perdeu a vaga como Christian Grey na adaptação hollywoodiana do best-seller “50 tons de cinza” justamente por ser gay. Uma nota curiosa é que ele era justamente o favorito das fãs que chegaram a criar pôsteres promocionais com o ator como Christian Grey. À época da escolha do protagonista do filme, Bomer estava nos cinemas como um striper em “Magic Mike”, personagem heterossexual.

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Zachary Quinto, outro recém-saído do armário, parece conseguir desvencilhar-se desse estigma. Em filmes como “Margin call – o dia antes do fim” (2011) e “Qual seu número?” Quinto vive heterossexuais, mas não é exatamente o protagonista desses filmes. O crítico do site IndieWire, Max o´ Connell acredita que no caso de Quinto, um ator de status consolidado com participação na franquia “Star Trek” e na série “Heroes”, a assumida homossexualidade tem menos impacto do que em um ator ainda em busca de espaço.

Opinião semelhante tem o ator Rupert Everett, que assumiu sua homossexualidade em 2009 (doze anos depois de brilhar como o amigo gay de Julia Roberts em “O casamento do meu melhor amigo”). Os boatos circundando a sexualidade de Everett sempre existiram, mas ele interpretou heterossexuais, e pegadores, em filmes como “O marido ideal” (1999), “O clube dos mulherengos” (2001) e na série “Justiça sem limites”. Depois que saiu do armário, desabafou em uma polêmica e muito repercutida entrevista a uma rádio inglesa em 2010, Hollywood lhe fechou as portas.

Ser gay na ficção é bom para a carreira

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James Franco disse outro dia que “nas circunstâncias certas” faria cenas de sexo real. O depoimento foi dado no lançamento do filme “Interior. Leather bar”, misto de documentário e ficção que co-dirigiu. Na obra, ele imagina como seriam os 40 minutos cortados do filme “Parceiros da noite” (1980), em que Al Pacino vive um policial que mergulha na cena underground gay da Nova Iorque oitentista para investigar um assassinato. Em “Uivo” (2010) e “Milk – A voz da igualdade”, James Franco viveu personagens gays e se viu às voltas com boatos sobre ser homossexual no que respondeu que “sua maior mágoa é não ser gay”. De qualquer jeito, Franco fiou-se como ícone da cena LGBT, não só por sua beleza e atitude, mas também pela defesa, no cinema e na vida, dos direitos da comunidade.

 

Personagens gays representaram o ponto da virada para muitos atores heterossexuais em suas carreiras. Rodrigo Santoro era o galã da novela “Mulheres apaixonadas” e viver o travesti Lady Di no filme “Carandiru” (2003) foi “libertador”, nas palavras do próprio ator à época; ele voltaria a viver um gay em “O golpista do ano”, filme que ainda tinha Ewan McGregor e Jim Carrey vivendo personagens homossexuais com uma entrega elogiável.

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Philip Seymour Hoffman surgiu no radar do público cinéfilo como Scoot J., o contra-regra apaixonado pelo ator pornô vivido por Mark Wahlberg em “Boogie Nights: prazer sem limites” (1997). Hoffman ainda viveria um travesti em “Ninguém é perfeito” (1999) e ganharia o Oscar ao interpretar o escritor homossexual Truman Capote no filme“Capote” (2005).

Heath Ledger, em “O segredo de Brokeback mountain” (2005), e Colin Firth, em “Direito de amar” (2009), reposicionaram suas carreiras e ganharam respeito como atores de talento dramático ao interpretarem personagens homossexuais. Ambos também foram indicados ao Oscar pelos desempenhos.

No Brasil, Mateus Solano amealhou prêmios e elogios efusivos por sua caracterização de Félix, que começou como a bicha má de “Amor à vida” e acabou mobilizando o Brasil em torno de uma improvável história de amor com Niko (Thiago Fragoso). O personagem foi tão marcante que, não só elevou o status do ator na Globo, emissora em que trabalha, como lhe rendeu férias de um ano para descansar a imagem.

O premiadíssimo Daniel Day Lewis debutou no cinema na pele de um gay que se apaixona por um paquistanês em “Minha adorável lavanderia” (1985). O filme discute o preconceito em duas frentes aliando a homossexualidade à questão da imigração.

Ser gay não necessariamente é ser feminino. Esse conceito parece encontrar resistência no seio da cultura pop. Aplaude-se o ator que renuncia a uma percepção dominante de masculinidade em favor de caracterizações majoritariamente sensíveis e fidedignas do universo gay, mas se ressente da possibilidade de dar a um ator gay a oportunidade de exercer seu ofício com a mesma liberdade. De investigar aquilo que ele não é: um homem heterossexual em um filme em que a heterossexualidade seja um elemento valioso da narrativa.

Fonte: IG

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