Milícia no Rio, algumas perguntas

Tática bangue-bangue não combaterá a milícia porque é, ela mesma, uma tática miliciana

“O crime organizado que não ouse desafiar o poder do Estado”, disse Cláudio Castro enquanto 35 ônibus e um trem eram incendiados no Rio de Janeiro. À realidade coube consumar a ironia: é como se os fatos expusessem a inevitabilidade do caos que a falta de política de segurança já anunciara. Lembro de García Márquez em “Cem Anos de Solidão”: “O mundo era tão recente que muitas coisas careciam de nome e para mencioná-las se precisava apontar com o dedo”; apontar, sim, mas na cara de quem?

O governador quer que acreditemos que é uma luta de mocinhos contra bandidos; ele, claro, do lado dos primeiros. Quem dera a realidade fosse tão simples quanto sugere o maniqueísmo. Se fosse, a caça à cúpula de milicianos resolveria. Eis algumas questões. Pergunta 1: as autoridades fluminenses, de hoje e outrora, precisam explicar como permitiram que as milícias crescessem 387% em 16 anos, ocupando uma área de 64 Copacabanas. A resposta é que milícia lucra a partir e para o Estado. Sem desvendar os laços econômicos e sem controlar acesso a armas, nada será resolvido.

Pergunta 2: o governador precisa explicar por que nomeou, para chefiar a Polícia Civil, um policial influenciador digital homenageado por deputado ligado a miliciano; a resposta é que, em parte, a milícia manda no estado que nem sequer possui uma Secretaria da Segurança Publica.

Pergunta 3: os governos fluminense e federal precisam explicar por que jogar policiais de outros estados no Rio, via Força Nacional, resolveria a questão. Resposta: não resolverá. Pergunta 4: o MP-RJ precisa explicar por que, em 2021, extinguiu o órgão que apura má conduta de PMs (Gaesp).

Pergunta 5: Castro precisa explicar por que policiamento ostensivo também é seletivo: em 2019, apenas 6,5% das operações policiais no Rio ocorreram em áreas de milícia. Sem dizer como isso fortalece o mercado imobiliário das milícias, nada será resolvido. A tática de bangue-bangue não combaterá a milícia porque é, ela mesma, uma tática miliciana.

+ sobre o tema

Racismo no Futebol e Ações Afirmativas – Por: Maurício Gentil

  Aconteceu mais uma vez, no âmbito do...

Família denuncia PM por agredir menina negra de 15 anos

De Douglas Belchior No último sábado, 12, cerca de 20...

Beyoncé se manifesta sobre protestos em Baltimore

Cantora Beyoncé também pediu doações para instituição que luta...

Torcida do Zenit pede ao clube para não contratar gays, negros e latinos

  Torcedores do Zenit, de São Petersburgo, na Rússia, causaram...

para lembrar

As cotas avançam no cinema nacional

A política de cotas adotada pelo Ministério da Cultura...

Guia de Enfrentamento ao Racismo na Mídia

O Observatório Negro divulga, neste 13 de...

Patricia Collins: “Os EUA têm instituições democráticas, mas não têm uma democracia”

A socióloga e ativista estadunidense Patricia Hill Collins cita...

Estudantes realizam protesto na Câmara contra Bolsonaro

Em programa de TV, o parlamentar se manifestou contra...
spot_imgspot_img

Marca de maquiagem é criticada ao vender “tinta preta” para tom mais escuro de base

"De qual lado do meu rosto está a tinta preta e a base Youthforia?". Com cada metade do rosto coberto com um produto preto,...

Aluna é vítima de racismo e gordofobia em jogo de queimada na escola

A família de uma adolescente de 15 anos estudante do 9º ano do Colégio Pódion, na 713 Norte, denunciou um caso de racismo e preconceito sofridos...

Atriz Samara Felippo presta depoimento em delegacia sobre caso de racismo contra filha em escola de SP

A atriz Samara Felippo chegou por volta das 10h desta terça-feira (30) na Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância, no Centro de São Paulo. Assista o...
-+=