A série de desastres produzidos pela publicidade brasileira inclui, entre outras coisas, objetificação da figura feminina, culpabilização da vítima e culto ao padrão branco de beleza. Confira as 10 propagandas mais machistas e racistas do último ano
Anna Beatriz Anjos e Jarid Arraes, Revista Fórum, no Pragmatismo Politico
Palmolive – “Longo Sedutor”
A propaganda voltada ao cuidado com os cabelos reforça a mensagem de que as cantadas seriam profundamente desejadas pelas mulheres. Fazendo um trocadilho com o ato de cantar uma música, o vídeo mostra uma mulher sendo abordada, incluindo até mesmo toques físicos, por causa de seu belo cabelo. O tema das cantadas tem ganhado força no Brasil, evidenciando a prática como algo invasivo e violento, que constrange e amedronta mulheres. A Palmolive, no entanto, prefere não acompanhar o avanço social.
TRESemmé – “Selagem Capilar”
Com a frase “meu cabelo liso ressalta o melhor de mim”, a marca de produtos capilares exibe uma modelo negra como símbolo de sua propaganda. A mensagem é clara: o melhor que uma mulher negra pode possuir em si é algo que se faz notar apenas com a aproximação ao padrão de beleza branco. É verdade que algumas pessoas de pele escura têm os cabelos naturalmente lisos, mas basta um pouco de consciência e responsabilidade social para perceber, preferencialmente antes de aprovar a peça publicitária, que vivemos uma epidemia de alisamentos e que o cabelo crespo ainda é alvo dos mais agressivos tipos de rejeição e preconceito.
Mr. Músculo
Para vender produtos de limpeza, a marca recorre à antiquíssima ideia de que os afazeres domésticos são tarefas femininas. Em suas peças publicitárias, são exibidas mulheres cuidando da limpeza, preocupando-se com a manutenção da casa e caindo de exaustão após uma faxina. Para piorar, a empresa chegou a publicar uma peça afirmando que a mulher só poderá buscar seus objetivos e sonhos depois de limpar a casa.
Posto Ipiranga
Na campanha lançada neste início de 2015, a rede de postos de combustível expõe uma imagem completamente estereotipada e infiel dos povos indígenas brasileiros. Primeiro, porque os retrata com características claramente trazidas da América do Norte – exemplo é o cocar dos índios apaches, nativos dos EUA, que nada têm a ver com os adereços utilizados por nossas comunidades tradicionais. Além disso, ridiculariza os indígenas, utilizando-se do velho e preconceituoso clichê de que são burros e menos civilizados do que o branco ocidental.
Skol
O anúncio da marca de cervejas trouxe à tona os aspectos mais machistas e violentos do Carnaval. Ignorou, sobretudo, a noção de consentimento, algo que ocorre corriqueiramente em nosso país, mas é levado às últimas consequências no feriado em questão. A peça dá a entender que a negação da mulher às investidas sexuais alheias pouco importa, principalmente se tiver consumido bebidas alcoólicas – como a divulgada pela propaganda – ou se estiver vestida com roupas curtas, encaradas por si só como “convite” e “permissão” à invasão de seu corpo.
Ministério da Justiça – “Bebeu, Perdeu”
Em campanha para combater o consumo de álcool por parte de crianças e adolescentes, o Ministério da Justiça acabou produzindo uma peça extremamente machista, que culpabiliza a mulher vítima de atos praticados sem o seu consenso, desde um estupro à divulgação de vídeos íntimos – o famoso revenge porn. Dessa forma, insinua, ainda, que as mulheres que bebem, por exemplo, pedem para ser abusadas e, por isso, não têm direito a nenhum tipo proteção. Depois da desastrosa repercussão da propaganda nas redes, o órgão a retirou de circulação e pediu desculpas em sua página no Facebook.
Itaipava – “Verão”
Mais um anúncio machista que, acima de tudo, objetifica e hiperssexualiza a figura da mulher. Ao fazer a comparação entre o volume de cerveja contido nos recipientes comercializados pela marca e o silicone dos seios da modelo, a peça a coloca à disposição dos homens, que podem, teoricamente, escolher a “embalagem” de sua preferência. Além disso, ainda exalta o padrão de beleza branco e esbelto, que dificilmente deixa espaço a quem não corresponde a ele, como as mulheres gordas e negras (estas, quando atingem visibilidade, aparecem de maneira ainda mais sexualizada).
Fast Shop – Semana da Mulher
Uma das mais catastróficas peças produzidas para “comemorar” o último Dia Internacional da Mulher, reforça o estereótipo sexista de que as tarefas relacionadas à vida doméstica são responsabilidades exclusivamente femininas. Como se não bastasse, sugere a compra de uma máquina de lavar para que a mulher, vista sempre como uma dona de casa, “tenha mais tempo livre”. A loja responsável por tal infelicidade parece ter esquecido que a “jornada dupla” socialmente imposta às mulheres trabalhadoras, é um fardo enorme que lhes toma tempo e as impede, muitas vezes, de manter maior foco em questões profissionais, como podem fazer os homens sem nenhum impeditivo.
Always – 0% Vazamentos
Em um dos maiores desastres da publicidade brasileira, a marca de absorventes tentou engatar uma campanha de conscientização sobre fotos e vídeos íntimos publicados sem o consentimento das mulheres. O equívoco foi imenso: até mesmo a ONG Safernet, que deveria ser responsável pelo conteúdo informativo e legal, reforçou a ideia de que as mulheres são culpadas pelas fotos vazadas, indicando que não tirem fotos íntimas caso não queiram aparecer na internet. Em nenhum momento a propaganda falou sobre a responsabilidade dos homens que divulgam o conteúdo sem permissão e de forma criminosa. Para completar o desastre, a Always exibiu a modelo Sabrina Sato como atrativo sexual para chamar atenção da audiência durante a campanha.
Risqué – “Homens que amamos”
Com o objetivo de “homenagear” os homens por comportamentos sexistas, a marca de esmaltes achou que seria uma boa ideia reforçar o clichê do “homem que ajuda” ao lançar sua nova coleção – porque para um homem basta cozinhar o jantar ou lavar alguns pratos sujos de vez em quando para conquistar o amor das mulheres. Entre outras máximas sexistas, a marca de esmaltes não promove nenhum conteúdo positivo para o público feminino, além de propagar uma heteronormatividade equivocada, já que muitas mulheres nem sequer se sentem sexualmente atraídas por homens.