‘Tentar silenciar a minha voz é um ato ILEGAL’, diz autora de poema que gerou polêmica na PM

A poetisa e professora Lívia Natália, autora do poema “Quadrilha”, estampado em outdoor na cidade de Ilhéus, como parte do projeto Poesias Nas Ruas, se manifestou através das redes sociais, após a polêmica e protestos da Polícia Militar, alegando “intolerância e preconceito” com a categoria (clique aqui). “Quando escrevi o poema “Quadrilha”, no extremo sentimento pelos mortos do Cabula, os meninos do Rio de Janeiro ainda não tinham sido alvejados por mais de cem tiros. Mas Amarildo já havia desaparecido e Joel, aquele menino, morto. Quando escrevi o poema, havia anos que o Carandiru com seus 111 mortos já estava quase esquecido”, escreveu a artista em “Nota de Escurecimento” no Facebook, acrescentando que, após viralização da foto do outdoor, ela e sua obra passaram a ser “expostas em manifestações que nascem de uma polarização político-partidária mas que, no entanto, exortam à misoginia, racismo e outras violências”.

Do Bahia Notícias 

Nos versos, a poetisa faz críticas a execussões de jovens negros pela PM | Foto: Divulgação / Aspra
Nos versos, a poetisa faz críticas a execussões de jovens negros pela PM | Foto: Divulgação / Aspra

No texto, Lívia Natália rechaça o partidarismo e reafirma seu papel social. “Primeiramente, afirmo que, entre a esquerda e a direita político-partidária, eu continuo sendo uma mulher negra, portanto, a mim pouco importa a guerra político-partidária que se quer montar, mas não admito que o meu poema, a minha obra e a minha imagem sejam utilizadas para um fim tão mesquinho. Pede-se que respeite a Instituição, e eu, como cidadã, EXIJO RESPEITO”, disse a professora, destacando ainda o fim da censura oficial na década de oitenta para descartar a possibilidade de calar-se nos dias atuais. “Tentar silenciar a minha voz é um ato ILEGAL, que atenta contra os direitos do cidadão”, afirma, revelando ainda ter recebido “recebido uma enxurrada de mensagens, declarações, recados e e-mails que são profundamente agressivos e que buscam me inspirar medo, que buscam me fazer ter vergonha do que escrevi, e que tentam desmentir o que a poesia representou”, reiterando que o poema deve ser mantido por dois meses em exposição.

Ainda na nota, a artista disse ter consciência de que “em todos os lugares há pessoas que desempenham o seu trabalho com compromisso, humanidade e competência”, mas que não se pode “escamotear a verdade endossada pela Anistia Internacional em relatório de 2015”, referente ao grande número de homicídios cometidos pela Polícia Militar brasileira. “Muitos homens e mulheres honradas fazem parte da corporação, imagino, sem demagogia, inclusive que seja a maioria. No entanto, apesar de o espírito corporativo manifestado ser natural, o corpo da Instituição que foi forjada para nos proteger precisa exercitar a auto-crítica e assumir as suas limitações”, propõe, acrescentando que a responsabilidade deve ser partilhada em todos os níveis das administrações governamentais.

“Este poema apenas diz uma verdade que todos nós engolimos e sua ampla recepção apenas reforça a sua força e a força da literatura, numa sociedade tão desprovida de sensibilidade. Eu não quero temer a farda de homens e mulheres que aí estão para nos proteger, os homens e mulheres negras que são a maioria da população baiana, e grande alvo das várias violências institucionalizadas também não!”, completa a artista.

+ sobre o tema

Por preconceito, negros inteligentes são vistos como brancos

    por Carol Castro Pare e pense: ninguém se envergonha em...

Contra o preconceito

A ONG Terra da Luz promove hoje mesa-redonda sobre...

E se Brecht fosse Negro?

“E se Black fosse Brecht, Negrxs seria. Eu derrubo qualquer...

Campanha de segurança da Polícia Militar revolta entidades raciais em Ribeirão Preto

Cartazes foram afixados em ônibus, Polícia Militar diz em...

para lembrar

Após depoimento de atriz, 30 pessoas terão sigilo quebrado por ofensas a Taís Araújo

Atriz que foi alvo de comentários racistas prestou depoimento...

Audio: Entrevista coletiva do Exmo Senhor Ministro Enrique Ricardo Lewandowski

Entrevista coletiva do Exmo Senhor Ministro Enrique Ricardo...

Racismo aterroriza estudantes portugueses na Polónia

O medo e a tensão estão a crescer entre...

A violência em São Paulo e o papel da mídia

Por Eduardo Guimarães, no Blog da Cidadania A região...
spot_imgspot_img

Violência política mais que dobra na eleição de 2024

Foi surpreendente a votação obtida em São Paulo por um candidato a prefeito que explicitou a violência física em debates televisionados. Provocações que resultaram...

Carandiru impune é zombaria à Justiça

É um acinte contra qualquer noção de justiça que 74 agentes policiais condenados pelo massacre do Carandiru caminharão livres a partir de hoje. Justamente na efeméride de...

Doutorando negro da USP denuncia racismo em ponto do ônibus da universidade; testemunhas gravaram gesto racista

Um aluno de doutorado da Universidade de São Paulo (USP) denunciou ter sofrido racismo em um ponto de ônibus no Conjunto Residencial Universitário (CRUSP), na Cidade...
-+=