Concursos do Judiciário destinarão 20% das vagas para negros, decide CNJ

O Conselho Nacional de Justiça aprovou nesta terça-feira (9/6) a criação de cotas de 20% para negros e pardos autodeclarados em concursos do Judiciário. A nova regra para cargos de servidores de todos os tribunais e para todos os concursos da magistratura. Como o Supremo Tribunal Federal não se submete ao CNJ, o tribunal ainda não está obrigado a ter cotas raciais.

por Pedro Canário no Conjur

A discussão no CNJ foi provocada pelo próprio presidente do órgão, o ministro Ricardo Lewandowski. Quando proferiu palestra na Universidade Zumbi dos Palmares, em São Paulo, o ministro se comprometeu a estudar formas de se implantar cotas raciais no Judiciário.

De acordo com o Censo do Judiciário, organizado pelo CNJ, a magistratura é uma carreira homogênea, predominantemente branca. Dos 17 mil juízes em atividade hoje no Brasil, só 36% são mulheres. E 14% se declaram pardos, 1,4% se dizem pretos e 0,1% se reconhecem como indígenas. A conclusão do estudo é que o juiz brasileiro é um homem branco heterossexual de 45 anos, casado e com filhos.

A decisão desta terça no CNJ seguiu o voto do relator, o conselheiro Paulo Teixeira. Segundo ele, ainda há poucas iniciativas afirmativas para de reserva de vagas. Ele cita algumas iniciativas de Judiciários estaduais, como do Paraná, e do Ministério Público do Rio Grande do Sul.

O conselheiro Fabiano Silveira, que havia pedido vista do processo, ao devolver o assunto nesta terça-feira, disse que a reserva de 20% nas vagas poderia ser ineficaz, uma vez que diversos tribunais não conseguem preencher os postos para magistratura atualmente. “A lógica que predomina é que há sobra de vagas. Faço ponderação para que a resolução pelo menos contemple a faculdade de o tribunal estabelecer um bônus de pontuação. Não estamos dizendo que deve adotar, mas que pode combinar reserva com bônus de acordo com suas experiências”, disse.

Com essa recomendação, as cortes poderão adotar outras medidas, além das cotas, como oferecer mais pontos a candidatos negros, ou mesmo oferecer cursos preparatórios para que tais candidatos participem com maior chance nos concursos, o que diferencia a regra da Lei 10 558/2002 (Lei de Cotas).

A data é histórica, afirma Silveira. “Além da reserva mínima obrigatória de 20% dos cargos disponibilizados em concurso, os tribunais poderão adotar outros instrumentos que garantam o acesso dos negros à magistratura, como, por exemplo, bônus na pontuação ou incentivos a cursos preparatórios destinados a essa específica finalidade. A política aprovada hoje terá a duração de 10 anos. Ganha o país. Ganha o Poder Judiciário. Ganha a cidadania. É o reencontro com a nossa verdade multicultural e multiétnica”, comemora o conselheiro.

O Departamento de Pesquisas Judiciárias enviou parecer ao conselheiro afirmando que 22,5% dos negros, em nível nacional, que prestam concursos para magistratura estão dentro dos “parâmetros de inclusão” na carreira. Portanto, o ideal é que o Judiciário nacional, de forma geral, tenha um índice 22,5% de negros em seus quadros.

Entretanto, Paulo Teixeira afirma que a estatística não se reproduz em todos os estados. No Rio Grande do Sul, por exemplo, diz, a cifra cai para 5,1%. Na Bahia, sobe para 33%.

Por isso a proposta dele foi para que a cota fique em 20%, mas deixando as particularidades de sua aplicação para cada concurso.

Data de validade
Teixeira também avalia que esse tipo de ação afirmativa existe para corrigir uma distorção. Portanto, devem ter uma espécie de data de vigência.

O conselheiro levantou que Lei 12.990/2014, que criou cotas para concursos do Executivo Federal, por exemplo, tem validade de dez anos.

E mais uma vez o CNJ se depara com diferenças regionais. Segundo Paulo Teixeira, a Justiça do Trabalho demoraria  entre sete e oito anos para alcançar a meta de 22,5%. Mas nenhum outro ramo do Judiciário demoraria menos de nove anos para alcançar o mesmo nível, afirma o conselheiro.

O ideal, portanto, para ele, mais uma vez é que se uniformize a cota em 20% para todos os ramos do Judiciário. O comportamento seria parecido, mas os prazos cairiam para cinco anos na Justiça do Trabalho e seis anos nas demais vertentes.

Para avaliar a efetividade da medida, o Censo do Judiciário fará um estudo sobre os efeitos das cotas. A resolução vale até o dia 9 de junho de 2024.

Clique aqui para ler a proposta aprovada.

+ sobre o tema

Relatório da Anistia Internacional mostra violência policial no mundo

Violência policial, dificuldade da população em acessar direitos básicos,...

Aos 45 anos, ‘Cadernos Negros’ ainda é leitura obrigatória em meio à luta literária

Acabo de ler "Cadernos Negros: Poemas Afro-Brasileiros", volume 45,...

CCJ do Senado aprova projeto que amplia cotas raciais para concursos

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado...

Polícia que mata muito demonstra incompetência de governos de SP, RJ e BA

Ninguém em sã consciência espera que um policial lance...

para lembrar

STF Terá 20% das Vagas de Concursos para Negros

Segundo o texto da resolução assinada nesta quarta-feira 18...

Seminário sobre igualdade racial na mídia defende militância e aproximação étnica

Fonte: Sindicato dos Jornalistas - Os veículos de comunicação desde...

Cotas têm o potencial de mudar o perfil da sociedade brasileira, afirma Nilma Lino Gomes

A nova ministra da Secretaria de Políticas de Promoção...

‘Sucesso’ norueguês inspira Europa a adotar cotas para mulheres em empresas

Turid Solvang: 'Cotas ajudaram a profissionalizar recrutamento' Por Ruth Costas Quando...
spot_imgspot_img

CCJ do Senado aprova projeto que amplia cotas raciais para concursos

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou nesta quarta-feira (24), por 16 votos a 10, o projeto de lei (PL) que prorroga por dez...

Brancos, vamos falar de cotas no serviço público?

Em junho expira o prazo da lei de cotas nos concursos públicos. A proposta de renovação apresentada pelo governo Lula e elaborada de forma interministerial tem sofrido...

O Brasil branco é um produto de cotas

Quem observa a oposição às cotas raciais nas universidades e no serviço público é capaz de pensar que o Brasil nunca adotou cotas anteriormente. Errado. O...
-+=