Judith Butler escreve sobre ataques no Brasil e defende que ‘teoria de gênero’ não é ‘ideologia’

Em artigo para a Folha, a filósofa escreveu sobre sua teoria de gênero e ataques sofridos no País.

Por Ana Beatriz Rosa, do  Huffpost Brasil

 Photo: Getty Images

Em outubro, a filósofa norte-americana Judith Butler foi convidada para mediar a palestra “Os fins da democracia” no Sesc Pompéia, em São Paulo. No entanto, acabou por ser recebida com gritos de “queimem a bruxa” na porta do evento e campanhas contrárias à sua presença no Brasil nas redes sociais.

Pouco mais de um mês após o ocorrido, Butler escreveu um artigo para a Folha de São Paulo em que comenta os ataques sofridos no País e que foi publicado neste domingo (19).

“Para aqueles que se opuseram à minha presença no Brasil, ‘Judith Butler’ significava apenas a proponente de uma ideologia de gênero, a suposta fundadora desse ponto de vista absurdo e nefasto, alguém —aparentemente— que não acredita em restrições sexuais, cuja teoria destrói ensinamentos bíblicos e contesta fatos científicos.”

No texto, Butler aproveita o espaço para explicar suas ideias a respeito da teoria da performatividade de gênero. De acordo com ela, o livro Gender Trouble, que escreveu há 30 anos, busca entender a formação de gênero e discutir a noção de que a expressão de gênero é um direito, não é uma “ideologia”.

As ideias da autora nos ensinam que cada indivíduo tem um gênero atribuído em seu nascimento e, ao longo da vida, um conjunto de expectativas lhes é atribuído pelas instituições sociais: mulheres e homem possuem posições tradicionais previsíveis.

O que Butler questiona é, justamente, como a sociedade trata aqueles que não se sentem inteiramente identificados com estes papéis, e o quanto de liberdade existe neste questionamento.

“Quantos de nós ainda acreditamos que o sexo biológico determina os papéis sociais que devemos desempenhar? Quantos de nós ainda sustentamos que os significados de masculino e feminino são determinados pelas instituições da família heterossexual e da ideia de nação que impõe uma noção conjugal do casamento e da família?​”, indaga a filósofa.

Para ela, algumas pessoas convivem tranquilamente com o gênero que lhes foi atribuído. E não há nada de errado nisso. Porém, existem pessoas que “anulam o senso mais profundo de quem são e quem desejam ser” para se conformarem com as normas sociais.

“Para essas pessoas é uma necessidade urgente criar as condições para uma vida possível de viver”, defende.

Neste espectro, Judith lembra a violência sofrida por mulheres pelo simples fato de serem mulheres. Ainda, retoma os índices de homofobia e transfobia no País, que trouxe para o Brasil “a fama de ser o país mais conhecido pelo assassinato de pessoas LGBT.”

“Meu compromisso é me opor às ofensas que diminuam as chances de alguém viver com alegria e dignidade. Assim, sou inequivocamente contra o estupro, o assédio e a violência sexual e contra todas as formas de exploração de crianças”, argumenta.

No artigo, ainda, Judith Butler retoma como a ideia de gênero foi apresentada como ideologia, principalmente em ambientes da igreja católica.

De acordo com ela, pesquisadores próximos da instituição construíram o estereótipo de que as pessoas que estudam questões de gênero negam qualquer diferença natural entre o sexo e defendem que a sexualidade não precisa de qualquer restrição.

“Então fiquei pensando: por que um movimento a favor da dignidade e dos direitos sexuais e contra a violência e a exploração sexual é acusado de defender pedofilia se, nos últimos anos, é a Igreja Católica que vem sendo exposta como abrigo de pedófilos, protegendo-os contra processos e sanções, ao mesmo tempo em que não protege suas centenas de vítimas?”, questiona.

Leia o artigo completo na Folha.

+ sobre o tema

Mulheres quilombolas criam biojoias e digitalizam vendas: ‘Trabalho de base’

O projeto Arte Solidária Michelin Ouro Verde, parceria da...

Parceria garante curso de qualificação profissional a mulheres quilombolas

Quarenta mulheres estão fazendo parte do curso de Atendimento...

Diante do machismo de Putin, Alexandra Kollontai não silenciaria

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, declarou, em dezembro...

para lembrar

Fusão ministerial é “apagão histórico”, afirmam juristas e especialistas

O Instituto Patrícia Galvão ouviu juristas, especialistas, pesquisadores e...

Feminicídio: Sobrinha-neta de Sarney foi estuprada por cunhado antes de ser morta, diz polícia

A polícia do Maranhão apresentou, na manhã desta quarta-feira...

Por que dá gosto ver Serena Williams jogar

Eu vi muitas gerações irem e virem no tênis,...

O único medo de Nury, uma mulher negra que cresceu em Montevidéu, no Uruguai

Numa calçada de uma rua não muito movimentada, pelo...
spot_imgspot_img

Órfãos do feminicídio terão atendimento prioritário na emissão do RG

A Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) e a Secretaria de Estado da Mulher do Distrito Federal (SMDF) assinaram uma portaria conjunta que estabelece...

Universidade é condenada por não alterar nome de aluna trans

A utilização do nome antigo de uma mulher trans fere diretamente seus direitos de personalidade, já que nega a maneira como ela se identifica,...

O vídeo premiado na Mostra Audiovisual Entre(vivências) Negras, que conta a história da sambista Vó Maria, é destaque do mês no Museu da Pessoa

Vó Maria, cantora e compositora, conta em vídeo um pouco sobre o início de sua vida no samba, onde foi muito feliz. A Mostra conta...
-+=