Pesquisadora norte-americana mostra complexidade das famílias negras brasileiras

Elizabeth Hordge-Freeman visitou a Universidade em junho

Por Jessica Mello, da PUC

A complexidade das famílias negras brasileiras foi exposta pela pesquisadora norte-americana Elizabeth Hordge-Freeman, da University of South Florida, dos Estados Unidos, em visita à PUCRS no mês de junho. Ela falou sobre as percepções adquiridas nos cinco anos em que pesquisou no Nordeste para entrevistar e observar como essas famílias lidam com a questão de raça e como ensinam seus filhos a conviver com a diferença. O estudo, que será lançado em formato de livro em outubro deste ano, tem como tema A cor do amor: traços raciais, estigma e socialização racial nas famílias negras brasileiras. “Descobri que elas funcionam de maneira complexa e contraditória. São capazes de reproduzir o racismo e as hierarquias sociais, mas também de resistir e combater o preconceito, porém, em sua maioria, vivem em uma ‘acomodação crítica’, ou seja, adaptam-se inconscientemente às situações impostas”, afirmou.

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A pesquisa identificou que os pais têm várias estratégias para proteger e preparar seus familiares para a sociedade e, algumas vezes, as táticas podem ser traumáticas. “Encontrei pessoas que tentavam mudar as características físicas de bebês, como o formato do nariz, para chegar próximo ao padrão de beleza dos brancos, e muitas mulheres que alisam o cabelo para ter o que julgam ser uma aparência melhor no mercado de trabalho”, exemplificou. Por outro lado, Elizabeth encontrou famílias que não aceitam ideias preconceituosas sobre pessoas negras relacionadas à beleza ou às competências, por exemplo. Esse grupo, a pesquisadora classifica como transgressores. “Essas famílias têm estratégias muito criativas para lidar com essas questões e são muito interessantes”.

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Enquanto coletava o material, que será publicado no livro, Elizabeth deparou-se com a situação de dez mulheres que marcaram sua estada no Brasil. Elas eram filhas de criação. Mulheres que foram adotadas, mas que vivem no que ela chama de “escravidão moderna”. “Com uma delas, conversei por mais de 12 horas e ela falou para mim: ‘Elizabeth, eu perdi os melhores anos da minha vida’. E eu não consigo aceitar isso. A questão é que elas se consideram da família e, por causa dos laços afetivos, fica ainda mais difícil denunciar a exploração”. Por isso, em março do próximo ano, por meio de uma parceria da PUCRS com a University of South Florida, Elizabeth passará um período no País como bolsista Fulbright para sua próxima pesquisa: Filhas de segunda classe. Adoção formal como escravidão moderna. “Eu não tenho a solução para esse problema, mas acredito que, com pesquisa e coleta de dados, ficamos mais perto de entender a situação e de poder eliminar isso”, disse ela.

Foto: Camila Cunha - Ascom/PUCRS
Foto: Camila Cunha – Ascom/PUCRS

Durante seis meses, a norte-americana irá em busca de histórias de mulheres brancas, no Rio Grande do Sul; negras, na Bahia; e indígenas, no Amazonas, com o objetivo de compreender como as raças moldam essas experiências e se pode ser um fator determinante para o futuro dessas mulheres, além de descobrir como elas lidam com essa questão. “Seria interessante promover uma perspectiva mais ampla da visão que as pessoas têm do Brasil. Eu quero mostrar que, mesmo com as diferenças regionais, temos essa história de escravidão que vem influenciando as características culturais de vários lugares, mas acredito que vou perceber que as particularidades regionais podem moldar esse fenômeno”, reflete.

 

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