A importância da representatividade negra na literatura infantil

O incentivo à literatura infantil não é somente “coisa de criança”, sobretudo, quando falamos sobre representatividade negra. Logo, a representatividade negra na literatura infantil também não é “coisa” somente de papais e mamães de pele negra. Instigar leituras com protagonismo negro pode ser algo que auxilie pais e mães a moldar e estimular o respeito e a percepção da diversidade racial e social do nosso país em suas crianças.

O avanço dos movimentos de luta contra o preconceito racial no Brasil não vem de hoje e o atual momento em que a luta antirracista está em voga, só demonstra um grito de séculos de silenciamento em que as temáticas negras vêm sofrendo com diversas manifestações de racismo que está solidificado no racismo estrutural. Portanto, o estímulo à aquisição de literaturas infantis que retratem a diversidade racial, com personagens negros, precisa ser valorizada e demonstrada às crianças através do despertar de um imaginário que se revela durante as leituras, escutas e visualizações de imagens. É importante olharmos com bastante atenção para a disponibilidade e o acesso a literaturas infantis que abordem a diversidade racial que oferecemos as nossas crianças.

Buscando quebrar paradigmas e costumes tão enraizados de uma cultura fortemente influenciada por padrões coloniais e europeus, os movimentos de luta contra o preconceito racial têm levantado grandes esforços para promover a popularização de uma literatura infantil afrocentrada com foco em histórias e personagens negros que retratam a beleza de suas realidades na estética, poética e no estilo de produções literárias de intelectuais negros que em alguns casos, retratam sutilmente a realidade das questões raciais e sociais do Brasil.

Independente do pertencimento étnico-racial da criança e/ou da família, a diversidade racial e a valorização da cultura negra, bem como a dos povos originários, precisam estar presentes nas prateleiras das nossas casas e escolas demonstrando através das literaturas infantis as diversidades raciais e culturais que possuímos indo contra as praticas racistas de uma nação que se ergueu, se nutriu e ainda se nutre a partir de fortes influências culturais, ancestrais e religiosas de povos de diversas origens.

Povos estes que são os nativos que aqui viviam no momento do falso “descobrimento”, que foram escravizados, massacrados e ainda resistem; os negros africanos, seres humanos que foram sequestrados de suas nações e também maltratados, subjulgados, menosprezados e escravizados que aqui chegaram com suas tradições e mão de obra forçada; e também os europeus que aqui se instalaram e colonizaram a tudo e a todos a partir da falácia da soberania racial.

Enquanto pais, mães e educadores, as escolhas de livros infantis, devem ser pautadas também na representatividade de personagens negros, negras e nativos, que ilustrem, além da beleza e diversidade de suas estéticas e costumes, as realidades culturais destes povos proporcionando para as crianças a naturalização da diversidade e o respeito ao próximo e principalmente o sentimento de pertencimento com modelos reais e positivos que refletem a realidade e que são fundamentais na formação de indivíduos conscientes de si e do próximo.

Sobre a autora:

Lídia Carlos Vieira é mãe, geógrafa, especialista em geoprocessamento, educadora social, membra pesquisadora do Núcleo de Pesquisas em Raças, Gênero e Performances Negras (NUPERGEPE – Coletivo Erês). Vem atuando como uma profissional multidisciplinar integrando ações da geografia, sobretudo da geografia humana e cultural, com ações nos movimentos sociais e dentro das políticas públicas com jovens em vulnerabilidade social em territórios periféricos. É artista, produtora cultural e também pesquisadora das tradições das culturas negras.

Lídia Carlos Vieira (Foto: Maxwell Vilela)

** ESTE ARTIGO É DE AUTORIA DE COLABORADORES OU ARTICULISTAS DO PORTAL GELEDÉS E NÃO REPRESENTA IDEIAS OU OPINIÕES DO VEÍCULO. PORTAL GELEDÉS OFERECE ESPAÇO PARA VOZES DIVERSAS DA ESFERA PÚBLICA, GARANTINDO ASSIM A PLURALIDADE DO DEBATE NA SOCIEDADE. 

+ sobre o tema

Põe teu preconceito no armário que quero passar com meu amor

Estava nesses dias do final de semana às voltas...

Nosso amor preto sobreviveu aos navios negreiros: invoquemos!

Memórias de agruras regem as poucas páginas destinadas a...

Eu sou… Hipólita! Território Lovecraft e a contemporaneidade jazz afrofurista revolucionária de Sun Ra

A série televisiva “Território Lovecraft” tem gerado uma série...

Uma cidade e um complexo industrial sob o mito da democracia racial

A região do Vale do Paraíba, Sul Fluminense do...

para lembrar

Pandemia afeta a volta ao trabalho para a mulher negra

Análise do PNAD/IBGE de momentos distintos do cenário nacional...

Se os privilegiados estão cansados, imagine os negros

   Não venho armado de verdades decisivas.      ...

Mapeamento de trancistas afro do estado do Rio de Janeiro

A atividade de trançar cabelos tornou-se um modo de...

Sinto muito, Evelyn não morreu

Na agenda de retomar um projeto civilizatório, no dia...

E se o estuprador é seu namorado?

Eu já comecei a escrever essa história muitas vezes. Parece que num momento eu sei o que quero dizer, e no segundo seguinte faltam...

Meu lugar de fala

Me gritaram: negra! e muitos falaram que não, que era parda. Me gritaram: negra! e alisaram o meu cabelo. quanto mais liso, mais aceita. aí é só não usar...

O algoritmo e a internet: a invisibilidade do corpo negro nas redes sociais

Nesses últimos tempos, tem sido bastante comum a discussão por parte de perfis de pessoas negras conhecidas na internet o quanto suas postagens são,...
-+=