A revolta dos moradores do complexo de favelas da Maré

A guerra civil brasileira parece longe de acabar.

por : Leonardo Mendes Do DCM

Sim, estamos em guerra, e se você não viu, é melhor desligar a Globo.

A revolta dos moradores do complexo de favelas da Maré, no Rio de Janeiro, na noite dessa segunda-feira, é só uma pequena amostra do que pode estar por vir. Centenas de pessoas protestaram contra o assassinato de moradores do bairro promovido pelos disparos do exercito contra uma van.

E a culpa não é da Petrobras, da corrupção, do PT, mas sim de todo um sistema que entrou em colapso.

Talvez quem segurasse as pontas fosse a Globo, a Veja, o Boris Casoy, enfim, a mídia a serviço da sustentação do sistema.

Mas essa mídia está ruindo, e a internet é a ferramenta de libertação do povo da alienação bovina que há tanto tempo é submetido.

E é impressionante também por quanto tempo esse sistema conseguiu funcionar.

Como conseguiu fazer com que as pessoas não se revoltassem antes.

Não a revolta da “TV Revolta”, dos “Revoltados On line” e outros que estão chateadíssimos com tudo o que está ai, e culpam a derrota do Aécio pelos males do país e por não conseguirem viajar mais vezes para Miami.

Mas a revolta de quem já vive numa guerra civil há muito tempo e sem perspectivas.

O que acontece hoje por exemplo na Universidade Federal do Rio de Janeiro é a prova do quanto essas pessoas são capazes de suportar, mas que tudo deve ter um limite.

Falo dos faxineiros, copeiros, porteiros, recepcionistas e todos os demais funcionários terceirizados que estão mais uma vez sem receber os seus salários, num jogo de empurra-empurra (da culpa) que estoura sempre do lado mais fraco.

Muitos desses funcionários moram na Maré ou em outras favelas, pois recebem um salário mínimo, e praticamente não há como morar em outro lugar com um salário desses.

O que impressiona, é que nem esse mínimo lhes é garantido.

O que impressiona mais é como conseguem sobreviver sem salário ou herança, e como a sociedade parece fechar os olhos para os seus problemas.

É algo que acontece há muitos anos.

A terceirização é a forma que o capitalismo/neoliberalismo mais desumano encontrou de destruir o serviço público e os direitos trabalhistas. E são inúmeros os casos de empresas responsáveis por esses terceirizados que simplesmente desaparecem em laranjas. Que decretam falência, abrem com outros nomes, ou exploram a mão-de-obra nos limites legais da escravidão e então abandonam o empregado à própria sorte.

Em geral, esses funcionários são absorvidos por outras empresas que vencem novos contratos, depois de passarem alguns meses sem dinheiro nenhum.

O que impressiona então é que ainda tenham disposição para trabalhar nessas condições.

Mas é isso, ou a fome, a mendicância, ou o bolsa-família, caso tenham filhos.

Ou então o tráfico, o assalto à mão armada, as penitenciárias.

Para os que resistem, os que ainda mantêm seus empregos e acordam de madrugada para pegar o trem lotado, demoram duas horas para ir, mais duas para voltar, cumprem jornadas de 10 horas e retornam a uma favela sitiada, sob tiros que vem de todos os lados – da polícia, do exército, dos moradores que não resistiram -, a revolta parece também uma questão de tempo.

A mão invisível do mercado que nos governa estará sempre suja de sangue.

E se há alguma perspectiva, ela ainda parece muito longe das urnas, do impeachment, de qualquer governante.

Mas ainda assim resiste, no levante da Maré, na greve dos garis, dos professores, na conscientização de que a Globo mente, e que suas repórteres boazinhas a caça de buracos nas calçadas de São João do Meriti são um engodo. Nas frentes de resistência que surgem e ainda podem surgir por todos os lados.

A revolução não será televisionada, enquanto não houver a regulamentação da mídia, mas, como disse Bauman, talvez ela já esteja em curso.

+ sobre o tema

Ascensão econômica desde 2003 não modifica valores políticos, diz pesquisa

Estudo mostra que população associa ganhos dos últimos 10...

Marcos Coimbra: O “povão” e a nova maneira de avaliar os candidatos

Por Marcos Coimbra, no Correio Braziliense   A...

5 coisas que você deve saber antes de considerar ir morar no exterior

Outro dia compartilhei um texto no Facebook no qual...

Campanha Justiça por Miguel recebe apoio de artistas

Nesta quarta-feira (2), artistas, militantes, ativistas, advogados e familiares...

para lembrar

Pearls Negras conquistam público em turnê europeia

Trio de garotas do Vidigal faz música misturando pop,...

Fica MUF: Museu de Favela está perdendo seu espaço

A ONG Museu de Favela - MUF é uma...

Correspondente de guerra

Todo favelado é correspondente de guerra e, pior, sem...

Curiosidade sobre como vivem pobres alimenta turismo nas favelas

No início do século 20, a curiosidade sobre como vivem os pobres já instigava a elite vitoriana, quando os chamados cidadãos de bem visitavam...

Com poesia e didatismo, “Favela” exala o perfume de uma “flor em resistência”

A Jatropha phyllacantha, flor que nasce no sertão baiano, é o fio (buquê?) condutor para que Adriele Oliveira leve o leitor a um universo...

Favela: A verdadeira startup brasileira?

Nas últimas semanas tem sido apresentado uma série de reportagens, nos mais variados órgãos de nossa imprensa, em que destaca as favelas enquanto exemplos...
-+=