Priscila sempre gostou de escrever, mas foi aos 14 anos de idade que descobriu na poesia aconchego e redenção. Atravessou a avenida barulhenta e perigosa da adolescência e hoje, aos 21 anos, se entrega aos inúmeros sabores que a literatura possui. Encontrou na escrita um refúgio da hostilidade do ambiente escolar. As violências verbais sofridas por colegas de classe e professores ecoa em sua memória como um impulso para continuar acreditando no amor pela poesia. Sua maior motivação no aprofundamento dos estudos e persistência na escrita foi a humilhação que recebeu de uma professora na 3ª série que disse que filha de pedreiro jamais faria faculdade. “Pode sonhar, sonhar não paga! Mas, filha de pedreiro nunca vai fazer faculdade!” disse a professora chamada Marisa. E este nome jamais saiu-lhe da memória. Hoje, Priscila consegue driblar a mágoa das palavras e transformá-las em arte.
Nasceu em São Roque (SP) e residiu por 7 anos em Valença (BA), de onde captou os cheiros de peixe fresco e azeite de dendê que margeavam a orla da cidade e cenas até hoje presentes em sua literatura. Trabalhou como professora eventual, garçonete, feirante e auxiliar de pedreiro, sendo este último junto com seu pai. Publica suas artimanhas artísticas em redes sociais e no blog pessoal.
Sua escrita percorre o caos e o rancor em uma busca por resignação das suas desventuras pessoais. Além disso, impunha o papel como uma arma no protesto daquilo que acredita que precisa de mudança. O livro que está publicando chama-se “A Marcha das Efêmeras” e reúne contos sobre mulheres que compartilham desventuras e preterimentos. A diversidade étnica das personagens deixa claro que não é um livro de contos escrito para leitura breve. São histórias curtas, porém densas e que exigem reflexão. Priscila conta que cada personagem será reconhecido pelos leitores, na visão cruel ou compadecida de um pai, uma mãe, uma tia, uma vizinha… “Todos nós conhecemos Bias Ritas, por exemplo. Seja na família ou na vizinhança, mas todos nós enxergaremos os contos personificados em situações cotidianas. O reflexo do outro em nós pode não ser o nosso reflexo no outro. Mas, de alguma forma modificamos alguém e nos deixamos modificar.” diz Priscila.
Por ter ficado desempregada, Priscila enfrenta dificuldades para cobrir os custos com a Editora. Seu editor é compreensivo e auxilia Priscila, entendendo os prazos de pagamentos. Mas, sem ter como efetuar os pagamentos, ela resolver criar esta Vakinha Online.
Prólogo do livro: [Lembranças inesquecíveis e uma ambiciosa revolta. Memórias que eu gostaria de não recordar, mas que eu não deveria deixar de contar. Escrever como quem grita. Encontros e desencontros pintados com sangue. Caminhos e descaminhos embebidos em suor morno e uma súbita compaixão. Memórias de mulheres marginalizadas e a imaginação andando atenta e melancólica. Onde me couber haverá uma tragédia. Onde houver mulher haverá um grito de socorro.]
Trechos de um dos contos (se julgar interessante escrever):
[… Bia Rita é um caso perdido. E eu, sou fissurada por casos perdidos. Na imensidão de um mundo que não viu, ela brilhou quando subiu com a fumaça. Seus cigarros foram seu único cobertor. Único capaz de suportar este cheio de corpo mal lavado. Cabelo com lãs de coberta dos tempos de infância. Dotada de uma inércia hereditária, de dentes careados e hematomas aqui e acolá, Bia Rita era cachaça que não se deveria beber. Bebi. Porém, a sina de todo poeta aspirante a marginal é escrever sobre flores secas entre rachaduras no asfalto, faixas de pedestres com marcas de sangue e descrever o som dos sinos enferrujados. E cá estou cultivando memórias e caminhando angustiada pela orla… -Trecho de “Banguela só queria morrer no mar”]
[… Corpos soltos. E cada vez mais presos. De tempos em tempos perdia o rumo da voz. Cantava demasiadamente ou retinha-se em um silêncio depressivo. Participava de concursos imaginários. Delirava. Vestia-se com uma cortina velha. Flores nos cabelos e olhar brilhante. Como a morte que cai mansa. Como a vida que vai manca. E calada descansava dos delírios. Passava semanas sem ouvir alguém e não trabalhava. Aí, só ouvia o mar. A maré que vai e volta. Que mente, que pede perdão, que desata. Ata palavras em mansidão. A mansidão dentro de Bia Rita. Porém, haviam turbulências. Desde muito pequena demonstrava sinais de que andaria a esmo. Buscava abrigo em vagões abandonados para os seus sonhos calados e seu corpo maltratado. Ensino incompleto. Sem recordações do ponto de parada. Sem séries ou lembranças proveitosas de História ou Ciências. Tabuada em péssima linha. Sabia um pouco sobre tricô. Um pouco sobre tapetinho de retalhos. Um pouco sobre pequenos furtos. Um tanto sobre mentiras. Calculava rotas de fuga com facilidade. Burlava o meio-fio, catava a presa e corria. Isso há anos. Desde criança furtando o tempo. Ela sabia que poderia se cansar e adoecer. Tinha medo. Sofria…] – Trecho do conto: Banguela só queria morrer no mar]