Emicida, Projota e Rashid, os Três Temores

Juntos, eles têm mais de 600 mil seguidores no Twitter e mais de 1 milhão de “curtidas” no Facebook. Sem contar mais as milhões de visualizações de seus vídeos no YouTube. Os rappers Emicida, Projota e Rashid, três dos maiores rappers do Brasil atualmente, farão no Rio, pela primeira vez, um show da turnê dos Três Temores, nesta sexta-feira, na Fundição Progresso. O projeto reúne os músicos no palco, cantando raps de suas carreiras solo e algumas músicas assinadas pelo trio. Dias antes da apresentação, os MCs deram uma entrevista por e-mail à Megazine. Eles falaram sobre suas expectativas para o show, a turnê, o crescimento do rap e a volta dos Racionais MC’s, grupo idolatrado igualmente pelos três

Como é o público carioca? Rola identificação como em SP?

PROJOTA: O público carioca tem muitas coisas em comum com a gente. Eles são em boa parte aqueles caras que fazem rimas pelas ruas também, e carregam uma força muito especial. São exigentes, mais ou menos como em São Paulo, e se diferenciam do resto do pais. Tenho vários amigos no Rio. É como se fosse meu bairro vizinho. Gosto de reencontrar os amigos e curtir essa cidade incrível.

EMICIDA: É sempre um prazer fazer show no Rio, passar pela cidade, ainda que a trabalho e na correria, e circular por essas paisagens que dispensam comentários. O público é sensacional, energia incrível.

RASHID: A rapaziada do Rio sempre nos recebe muito bem. As apresentações são sempre bem quentes. Não só pelo clima quente da cidade, mas também pela energia do show! Pensando pelo lado artístico, é loko tocar numa cidade que é berço de muitos dos grandes compositores da nossa música brasileira, dentro e fora do rap.

Como tem sido a turnê dos Três Temores até aqui? Algum show em especial?

RASHID: Quando você junta três amigos de longa data que estão conseguindo seu espaço e destaque com sua arte no mesmo palco, todo show é especial. Esses caras são ídolos para mim, e graças a isso eu aprendi muito nessa turnê. Foram dois meses viajando e tocando em quase todas as principais capitais do país, para até 10 mil pessoas.

Como é a dinâmica das apresentações? Vocês improvisam muito no palco? Como se revezam no microfone?

PROJOTA: Cantamos as músicas que temos em conjunto, e os maiores sucessos de cada MC, sendo que os outros sempre seguem no palco apoiando na segunda voz, isso é uma interação muito bonita, mostra que, mesmo nos encontrando pouco nos palcos hoje em dia, ainda mantemos uma sintonia que é natural.

RASHID: Não ensaiamos, nosso ensaio é na prática e os erros são raros…

EMICIDA: Nada engessado, que não possa mudar. A ideia é que o show se desenrole em clima descontraído, como é a nossa relação fora dos palcos.

Por que a ideia de fazer os Três Temores deu tão certo?

PROJOTA: O momento dos três MCs é muito bom, nenhum ofusca o outro, não há estrelismo, há, sim, um grupo de rap fazendo aquilo que mais ama, com amizade, companheirismo e a felicidade de dividir aquele momento.

RASHID: Um participou da formação artística do outro, e viu o outro crescer e obter destaque. Foi um raio que caiu três vezes no mesmo lugar! Cada um soma nesse projeto com a bagagem que adquiriu na estrada.

EMICIDA: Acredito que seja bom tanto para os MCs quanto para o público ver seus representantes unidos, celebrando o próprio trabalho nos palcos.

Vocês três cantaram juntos na época do Na Humilde Crew? O que mudou?

PROJOTA: Eu diria algo que resume isso muito bem: tudo mudou, nada mudou.

RASHID: Passaram-se alguns anos né? Vieram CDs, shows, viagens, responsabilidades, mulheres, mudanças de casa e até filhos, no caso do Emicida. A gente amadureceu muito e em pouco tempo, e isso acrescenta muito na nossa música também.

EMICIDA: Cada um achou seu espaço dentro do hip hop e do mercado, e todos vêm conseguindo melhorar cada vez mais a própria estrutura, trabalhar de modo cada vez mais profissional.

Vocês são os maiores rappers do país. E o hip hop nunca esteve tão forte. O que significa isso para os três?

EMICIDA: Nunca ousaria dizer que sou o maior rapper do país. Mas vejo, é claro, com bons olhos esse momento do rap. No entanto, o trabalho que eu faço é para que a minha mensagem, através da minha música, tenha força para ir além dessa boa fase. E espero sinceramente que o movimento de forma geral atravesse esse momento, faça bom proveito, aprenda e chegue ao fim dele – sabemos que altos e baixos são inevitáveis – mais forte, estruturado, disseminando o progresso entre todos os que trabalham e correm atrás.

PROJOTA: Vivo intensamente cada dia da minha carreira, como se amanhã eu não fosse mais ter voz, então preciso gravar o melhor rap hoje, preciso fazer o melhor show hoje, sempre assim. Sou muito feliz e me sinto abençoado, precisamos manter os pés no chão e a mente focada, os julgamentos virão, precisamos saber quem somos, e conhecer os motivos da nossa luta, para não nos perdermos no caminho.

RASHID: Tem muitos outros rappers nessa seleção, eu apenas agradeço por também ter sido convocado. É um ótimo momento para o hip hop e para o rap, e isso tem um valor muito grande para mim. Estou realizando meu sonho e ainda estou contribuindo para esse fortalecimento do movimento. É tipo um bônus para mim, entende?

O que fez o rap crescer tanto no Brasil?

EMICIDA: Acho que a internet aproximou outros públicos do rap. E creio também que, nesses últimos tempos, o espaço que gente como eu e Criolo conseguiu, em alguns lugares onde o rap não costumava circular, tenha ajudado.

RASHID: Vários fatores. Muita gente vem trabalhando para isso. Também não tenho dúvidas de que as pessoas estão com a mente aberta para o que a gente tem a dizer. É isso que faz o rap crescer, a capacidade de conversar com o coração das pessoas, é o lance da identificação: “Parece que esse cara aí tá falando da minha vida!”. Foi por isso que eu comecei a ouvir rap.

Como vocês acham que o hip hop contribui para a sociedade bagunçada em que vivemos?

PROJOTA: Você fala através da sua música com moleques de 15, 16 anos. Esses moleques refletem, mudam seus hábitos, discutem com os amigos e crescem com uma consciência diferenciada. Foi o que aconteceu comigo 10 anos atrás. Há quem diga que uma música não consegue mudar uma vida. Então as centenas de pessoas que me dizem o contrário todos os dias estão mentindo? Elas falam a verdade, e é isso que me mantém sempre no rumo.

EMICIDA: Acho que da forma mais óbvia, que é por meio das mensagens que a gente estiver disposto a passar pelas letras, mas também usando a exposição que conseguimos em redes sociais, por exemplo, e todos os outros canais para jogar luz sobre temas que cada um acreditar que precisa vir à tona.

RASHID: O rap me fez começar a ler, a pesquisar e a começar a entender, ou tentar entender o mundo. Porque ele fala diretamente com o moleque sentado na esquina, com a menina voltando da escola, com o cara procurando emprego, etc… O rap tem uma mensagem tanto para a pessoa cheia de certezas quanto para a pessoa cheia de dúvidas. Esse é o papel do rap: mostrar que por mais subestimado que você seja, ninguém conhece sua motivação interior, então você pode ser o que você quiser. Pois esse é o caso do próprio movimento rap: sempre foi subestimado, mas continuou batalhando para crescer.

A mesma sociedade costuma chamar o jovem de alienado, desinteressado. Vocês concordam? Por quê?

EMICIDA – Há jovens alienados, idosos alienados, músicos alienados, jornalistas alienados, assim como há jovens politizados, preocupados, conscientes. Claro que começa por eles, mas a discussão vai muito além.

Os Racionais MCs estão lançando disco novo. O que o grupo siginifica pra vocês e pra nova cena do rap?

EMICIDA: Eles, sim, podem e devem ser reverenciados como o maior grupo de rap do país, que abriu caminho e inspirou, certamente, toda essa geração, na qual eu obviamente me incluo. A nova cena só tem a agradecê-los. Muitos de nós certamente não estariam no rap se não fosse a mensagem, a inspiração dos Racionais.

PROJOTA: São os maiores, ídolos absolutos e formadores da pessoa que sou hoje. Falo isso como individuo, e não só como MC. Eles mudaram minha vida, junto com outros expoentes da nossa música. Sou extremamente grato, e declaro isso de peito aberto todos os dias.

RASHID: Racionais MC’s é simplesmente o maior grupo de rap do país, e um dos maiores e melhores do mundo. O disco dos caras vai parar o Brasil, como sempre parou… Temos que respeitar muito isso e trabalhar pesado, se quisermos chegar a esse nível um dia. É isso que eu tenho para dizer sobre eles. Não são só referência, são inspiração para mim.

Já existe uma nova geração de rappers surgidos após o sucesso de vocês. Qual a importância disso?

PROJOTA: Continuidade. O rap é muito maior do que eu. Sou apenas um grão dessa areia, e me sentir assim me faz acreditar que muito ainda está por vir. Torço para que surjam mais de nós, com suas diferenças, com suas formas de expressar os sentimentos, e que essa expressão nunca se perca em meio à alienação do mundo.

EMICIDA: São novas vertentes, gente abordando outros temas, agradando a novos públicos, uns com qualidade, outros não. Movimenta o mercado, faz surgir gente interessante. Vamos ver como isso vai se desenrolar. Quem vai ficar e quem vai sumir quando essa maré baixar.

No rap, existe um espírito de ajuda mútua. Os músicos colaboram muito uns com os outros. Como isso contribui?

PROJOTA: Devo muito a muitas pessoas, e sei que já contribuí para muitas outras, exatamente pelo fato de não haver estrelismo, egoismo ou medo de perder espaço. Se for para minha carreira acabar amanhã, só depende de mim, e, se for assim, que seja. No fim, o que vai ficar serão minhas músicas e minha contribuição para as pessoas. A maioria de nós entende dessa forma, e existe um sentimento de felicidade sempre que vemos um de nós abrindo uma porta.

EMICIDA: Esse espírito está na essência do movimento, nas letras, no modo como muitas vezes os eventos eram e ainda são organizados, com poucos recursos financeiros, mas muita boa vontade. Contribui para que o movimento esteja aí, sempre vivo, mas ainda acho que o rap precisa de mais união, organização em torno da própria maneira de trabalho.

RASHID: É a materialização do que falamos em nossas letras! Falamos de união, de que somos iguais. E quando nos juntamos para fazer um som, somos exatamente isso, estamos vivendo o que pregamos. Gosto de fazer música com pessoas que são próximas de mim e quando me identifico com o trabalho da mesma, porque a música é como um filho. Temos um grande leque de opções no rap quando falamos em talento. Sem contar que o público gosta muito disso… e nós também.

 

 

 

 

Fonte: O Globo

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