Os Estados Unidos aguardam, a partir desta segunda-feira (19), o veredicto do júri sobre a morte de George Floyd, um homem negro assassinado em 25 de maio do ano passado em Minneapolis, após um policial branco permanecer por quase 10 minutos ajoelhado em seu pescoço.
Depois de três semanas de julgamento, em que os jurados ouviram mais de 40 testemunhas e revisitaram, diversas vezes, as imagens e a voz estremecida de Floyd suplicando “eu não consigo respirar”, os argumentos finais foram apresentados nesta segunda. Agora, o júri, composto por sete mulheres e cinco homens, vai debater a portas fechadas até chegar a uma conclusão unânime sobre as acusações que recaem sob Derek Chauvin, 44, o agente que ajoelhou em Floyd.
O hoje ex-policial é acusado de assassinato e homicídio culposo e pode receber pena de até 40 anos de prisão. O júri pode decidir condenar ou absolver Chauvin de todas, algumas ou nenhuma dessas acusações. Embora as diretrizes de Minnesota exijam uma sentença mais curta, de até 15 anos, para alguém como Chauvin, sem condenações anteriores, os promotores pediram ao juiz do caso, Peter Cahill, que dê ao ex-policial mais tempo se ele for considerado culpado.
Apesar do julgamento estar avaliando a culpa de apenas um homem, ele é simbólico para os EUA que têm um histórico de assassinatos de jovens negros por policiais. Caso Chauvin seja condenado, o veredicto pode trazer um certo alívio e uma sensação de acerto de contas após a onda de protestos liderados pelo movimento Black Lives Matter que circularam o mundo todo, nos quais a imagem de Floyd tornou-se símbolo da luta antirracista e contra a violência policial no EUA.
Uma absolvição, no entanto, poderia levar a uma nova onda de manifestações e a uma sensação ainda maior de desesperança no sistema de Justiça no país. Com o aumento dos protestos nos últimos dias, as autoridades estaduais reforçaram as precauções de segurança em Minneapolis.
A torre onde fica a sala do tribunal foi cercada por arame farpado, empresas próximas fecharam suas janelas com tábuas e as escolas públicas vão ter aulas remotas a partir de quarta-feira (21). Soldados da Guarda Nacional foram enviados, e veículos militares se tornaram uma visão comum nas ruas da cidade.
Ao apresentar seu caso ao longo de mais de duas semanas, os promotores reuniram testemunhas emocionadas, policiais que afirmaram que as ações de Chauvin violaram as políticas do departamento e especialistas médicos que disseram ao tribunal que Floyd morreu de asfixia.
Em sua argumentação nesta sexta, o promotor do gabinete do procurador-geral de Minnesota, Steve Schleicher, disse aos jurados para “acreditarem em seus olhos” enquanto reproduzia, mais uma vez, o vídeo da morte de Floyd. Inúmeras vezes, Schleicher repetiu uma frase: “Nove minutos e 29 segundos”, o tempo em que o joelho do policial ficou pressionado contra o pescoço de Floyd. “Se você está fazendo algo que machuca alguém, e você sabe disso”, disse Schleicher, referindo-se à conduta do policial, “você está fazendo de propósito”.
A argumentação da defesa durou dois dias, e apenas duas testemunhas foram chamadas: um especialista que disse que as ações de Chauvin foram apropriadas e um médico que contestou a determinação do Estado de que o Floyd morreu de asfixia e classificou a causa da morte como “indeterminada”.
Chauvin se declarou inocente de todas as acusações e renunciou ao seu direito de testemunhar perante os jurados. O principal advogado de defesa, Eric Nelson, reiterou na segunda que ele havia se comportado como qualquer “policial razoável”, argumentando que ele seguiu seu treinamento de 19 anos na força.
Nelson ainda disse que os promotores estavam errados ao rejeitar sua teoria de que o monóxido de carbono do escapamento do carro da polícia que estava próximo de Floyd poderia ter contribuído para a morte. E voltou aos argumentos sobre o uso de opióides pela vítima.
Um dos principais pontos levantados pela defesa ao longo do julgamento foi de que Floyd teria usado drogas antes da ação e que isso teria levado à sua morte. De fato, foram encontrados traços de metanfetamina e de fentanyl (um tipo de opióide) no corpo de Floyd, e a namorada dele confirmou que o casal era usuário de drogas. Médicos convocados pela acusação, porém, disseram que não há indícios de que Floyd tenha tido uma overdose. Segundo um deles, o homem não seria capaz de falar com os policiais e provavelmente estaria inconsciente se estivesse nessa situação.
A defesa de Chauvin entrou com dois pedidos para mover o caso para fora do condado de Hennepin (onde Minneapolis está localizada), ambos recusados pelo juiz. A equipe de defesa do ex-policial tentou essa abordagem antes de começar a seleção do júri, e o juiz negou. Então, quando surgiu a notícia de que a cidade de Minneapolis havia chegado a um acordo civil com a família de US$ 27 milhões, a defesa levantou a questão novamente. O juiz, outra vez, recusou-se a mover o julgamento.
A defesa argumentou que a publicidade em torno do caso em geral (e depois do acordo, especificamente) comprometeria o direito de Chauvin a um julgamento justo. “Não acho que exista nenhum lugar no estado de Minnesota que não tenha sido objeto de muita publicidade neste caso”, disse o juiz Cahill.
O julgamento foi transmitido ao vivo, algo incomum nos EUA, e mostra a importância do caso em um país onde homens negros têm cerca de 1 chance em 1.000 de serem mortos pela polícia, segundo uma pesquisa da academia nacional de ciências dos EUA do ano passado.
Só neste mês de abril, houve mais duas vítimas. Adam Toledo, 13, foi morto em Chicago, baleado por um policial mesmo após levantar as mãos, e Daunte Wright, 20, foi morto a tiros em Minnesota (a menos de 20 km da cena da morte de Floyd), em uma abordagem de trânsito.