Pai investiga assalto por conta própria e irmãos são soltos após um mês presos; defesa aponta falha no reconhecimento

Enviado por / FonteG1

Eles foram reconhecidos por uma das vítimas pela cor da pele, uma camisa cinza e um boné. Em nota, a SSP informou que "na ocasião, os suspeitos foram reconhecidos por duas vítimas", porém, a defesa alega que no momento do reconhecimento os dois jovens foram colocados ao lado de uma única pessoa que não tinha semelhanças com eles.

A Justiça mandou soltar na sexta-feira (1º) dois jovens negros de Diadema, na Grande São Paulo, que estavam presos há um mês, suspeitos de roubar dois carros. A defesa de Luiz César Marques Júnior, de 24 anos, e Gustavo Marques, de 20 anos, conseguiu a revogação da prisão preventiva após o pai dos jovens reunir provas por conta própria.

O roubo de um dos veículos ocorreu na Rua Paquistão, em São Bernardo do Campo, por volta das 18h47, porém, a família alega que no mesmo horário, Luiz e Gustavo estavam em um bar com o pai no bairro Campanário, em Diadema.

Eles foram reconhecidos por uma das vítimas pela camisa cinza escura, um boné branco e por serem negros e foram presos no dia 1º de março.

“Não escutaram a gente no momento, o que a gente falou eles simplesmente ignoraram. A Justiça precisa parar com isso, a base de roupa não é base para condenar alguém, procurar investigar mais, olhar pelas pessoas, não pela cor, mas pelo ser humano”, afirmou Luiz César Marques Júnior.

O pai dos jovens conseguiu com a ajuda dos moradores do bairro reunir imagens das câmeras de seguranças que mostram o trajeto que eles fizeram até o bar, desde que saíram de casa por volta das 17h59, até o horário em que chegaram no bar às 18h20. Pelas imagens também é possível os dois jovens no local até às 19h30.

“Em momento algum deram chances de defesa para os meninos, eu acho que todo homem tem o direito de defesa, mas o sistema não dá o direito, principalmente da gente que é negro”, afirma Luiz César Marques, pai de Gustavo e Luiz.

Segundo a defesa, as câmeras de segurança do local estavam com atraso de 1h27 no dia do ocorrido. Foi pedido a perícia da gravação, mas a juíza do caso indeferiu.

De acordo com o boletim de ocorrência, por volta das 18h47, criminosos assaltaram uma mulher e levaram o carro, um VW/Voyage em São Bernardo do Campo. Ela informou que estava tentando entrar na garagem de casa quando um Ford/Ka parou na sua frente, atrapalhando a passagem, e dois homens desceram do veículo: um de “camiseta escura e boné de cor escura” e o outro de camiseta “cinza-claro e boné branco”, ambos “jovens de pele morena”.

O Ford/Ka também tinha sido roubado no mesmo dia em Diadema.

O Voyage tinha rastreador, a vítima informou que voltou para casa e o marido entrou em contato com a polícia enquanto rastreava o veículo. O carro foi encontrado estacionado em frente ao bar em que os jovens estavam.

“Eles já estavam há muito tempo antes bebendo com o pai no bar. Em um determinado momento eles atravessaram a rua para fumar e encostaram no veículo, que já estava parado naquela rua. Como tinha rastreador a polícia militar se dirigiu até o local e se deparou com dois jovens negros encostados no carro. Imediatamente eles efetuaram a prisão dos jovens, não quiseram ouvir ninguém, até porque são dois jovens negros”, afirmou Ewerton Carvalho, advogado da família.

Falhas no reconhecimento

Pela lei, segundo o artigo 226 do Código de Processo Penal, o suspeito deve ser colocado ao lado de outras pessoas com características parecidas com as dele para que as vítimas façam o reconhecimento (leia mais abaixo).

Segundo a defesa, os jovens foram colocados do lado de um único homem que não tinha semelhanças com eles. “Eles foram colocados do lado de um jovem com uma estatura corporal muito diferente da deles. Eles são magros, negros. Colocaram eles do lado de apenas uma pessoa, o que já estava errado”, afirma Monique Marques, advogada da defesa.

“Era um direito deles responder em liberdade, de toda pessoa, mas eles já estavam respondendo por um crime que não tinham sido condenados ainda, respondendo sumariamente”, completou.

Em nota, a Secretária de Segurança Pública de São Paulo (SSP) informou que “o caso foi registrado pelo 3º DP de Diadema. Na ocasião, os suspeitos foram reconhecidos por duas vítimas. O inquérito policial foi encaminhado para análise do Poder Judiciário e, até o momento, não retornou à unidade para novas diligências”.

Luiz e Gustavo ficaram um mês presos injustamente em Diadema — Foto: TV Globo

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