Alvo de racismo em SP: ‘Não queria chorar na frente do meu filho’

Enviado por / FonteO Globo, por Silvia Amorim

O auxiliar de serviços gerais Leandro Antonio Eusdácio Xavier, de 39 anos, foi vítima de injúria racial no sábado passado no Jabaquara, bairro de classe média em São Paulo. Uma mulher que o agrediu na rua com xingamentos de “macaco, chimpanzé e orangotango”. Xavier estava caminhando com o filho, de 11 anos, para um ponto de ônibus quando foi alvo das agressões. Ele filmou tudo com o celular, e as imagens viralizaram. O rapaz disse que a agressão foi gratuita e que nunca tinha visto a agressora na vida. Quatro dias após o episódio, Xavier contou ao GLOBO como tudo aconteceu e que sua maior preocupação era com o filho. Ele diz que nunca havia se sentido discriminado por sua raça.

Foi assim

Leandro Antonio Eusdácio Xavier, de 39 anos

“Era sábado e tinha cinco meses que eu não via meu filho, que mora com a mãe. A gente ia passar o fim de semana junto. Quando subíamos para pegar o ônibus essa mulher vinha na rua também. Quando eu olhei ela fez um gesto. Não achei que era pra mim e virei para o lado para ver se ela estava falando com alguém. Não tinha ninguém. Quando ela se aproximou começaram as ofensas. Na minha cabeça na hora veio a ideia de filmar porque seria a única prova que eu teria daquilo. Ninguém ia acreditar em mim se eu não filmasse.

 

“A gente vê essas coisas acontecendo com outras pessoas e fica chateado. Quando acontece com você, ainda mais com meu filho junto, dói muito.”

Nunca tinha visto essa mulher na minha vida. Tudo começou do nada. Quando vi que ela não parava, eu parei de filmar, peguei meu filho e continuei subindo para o ponto de ônibus. Mesmo assim dava pra ouvir ela xingando. A moradora de uma casa saiu no muro e falou para eu não ligar para aquilo. Nisso a mulher começou a ofender a moça também. A gente vê essas coisas acontecendo com outras pessoas e fica chateado. Quando acontece com você, ainda mais com meu filho junto, dói muito. Eu não sabia se ele estava entendendo o que estava acontecendo. Quando ele virou pra mim e disse ‘nossa, pai, que mulher louca’, deu vontade de… Mas eu falei pra ele não ligar que eu ia resolver depois e fomos embora.

“Minha vontade era de chorar ali e eu não queria chorar na frente dele (o filho)”

Minha vontade era de chorar ali e eu não queria chorar na frente dele. Ele é branco, mora com a mãe e eu estava sem ver meu filho há cinco meses por causa da pandemia. Eu queria ficar com ele. Fui na delegacia denunciar só na segunda-feira. Em casa, minha família conversou com ele. Todos ficaram indignados com o que tinha acontecido. Eu chorei em casa e, olha, que sou difícil de chorar. Me senti inútil, não tive reação de botar a mão nela porque jamais faria isso, não é da minha índole bater em mulher. De vítima eu ia virar o culpado. Mas não é fácil. Só consigo pensar que ela deve ter algum problema mental. Não tem justificativa uma pessoa fazer o que ela fez. Ela é racista mesmo e foi o primeiro contato do meu filho com uma situação de racismo. Ele é branco. Comigo também nunca tinha acontecido. Se alguém fez alguma discriminação racial comigo eu nunca percebíi.

“Esquecer acho que eu não vou esquecer. Fazendo a Justiça, acho que vou ficar mais tranquilo…”

Desde que aconteceu não consigo dormir direito. Acordo à noite e vem no pensamento a imagem dela. Eu não quis mais ver o vídeo. Não vejo mais as reportagens na televisão. O filho do síndico onde eu trabalho indicou um advogado pra mim. O que eu mais quero é Justiça. Estou esperando a polícia encontrar essa mulher para eu fazer o reconhecimento presencial. Se eu ficasse cara a cara com ela… eu queria perguntar por que ela fez isso. Mas, pra falar a verdade, eu nem queria mais ver. Esquecer acho que eu não vou esquecer. Fazendo a Justiça, acho que vou ficar mais tranquilo e deitar minha cabeça no travesseiro sabendo que eu fiz a minha parte.”

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