Primeiras-damas ou damas decorativas com pimentões?

O banal programa para as esposas dos líderes na cúpula do G7 questiona o tradicional papel paralelo ‘feminino’

Por Silvia Ayuso, do El País

Desde a esquerda, Cecilia Morel, esposa do presidente chileno; Malgorzata Tusk, esposa do presidente do Conselho Europeu; Brigitte Macron, primeira dama da França, e Melania Trump, esposa do presidente norte-americano, em 25 de agosto de 2019 na cúpula do G7.REGIS DUVIGNAU (POOL)

A foto que desencadeou os gracejos nas redes sociais mostra as esposas de alguns dos mandatários reunidos na recente cúpula do G7 em Biarritz, num campo, de salto alto, posando sorridentes enquanto a anfitriã, a francesa Brigitte Macron, segura uma cesta com os famosos pimentões da localidade basca de Espelette. “D’Espelette Housewives”, tuitaram muitos usuários da Internet em referência ao título original da famosa série de televisão Desperate Housewives. Menos graça teve a mensagem no Instagram do presidente da Comissão Europeia, Donald Tusk. Ao lado de um vídeo que mostra Brigitte Macron, a norte-americana Melania Trump, a japonesa Akie Abe e sua própria esposa, Malgorzata, de costas olhando para o mar, Tusk escreveu: “Melania, Brigitte, Malgosia e Akie. O lado luminoso da Força (em uma referência a Star Wars)”.

A irritação de Danielle Bousquet ressoa do outro lado da linha telefônica. “É uma pena!”, exclama aquela que até junho presidiu o Alto Conselho para a Igualdade entre Homens e Mulheres, que monitora o sexismo na França. “É uma completa caricatura, não só é uma decepção, mas é praticamente um retrocesso. A imagem que foi dada das mulheres como seres superficiais, incapazes de se ocupar de coisas importantes, bem vestidas, sorrindo o tempo todo, é lamentável, pavorosa, acho que demos um bom passo para trás”, denuncia Bousquet.

A cúpula do G7 organizada pela França tinha na agenda a luta contra a pobreza, a promoção das mulheres na África e até um catálogo de leis em favor das mulheres, do qual os países participantes se comprometeram a implementar ao menos uma em um ano. Além disso, a presidência francesa do G7 não deixou de proclamar que promovia uma “diplomacia feminista” durante seu mandato no poderoso clube. Mas na mesa redonda em que os mandatários priorizaram questões como o Irã, a Rússia ou a Amazônia, somente uma mulher estava sentada, a alemã Angela Merkel. O resto das que participaram da cúpula o fizeram em segundo plano, como primeiras-damas — o marido de Merkel, Joachim Sauer, não acompanha a esposa — que cumpriram um programa paralelo que incluía um pouco de turismo, cultura local e uma demonstração de surf. Tudo acompanhado por trocas de roupa e sorrisos, muitos sorrisos.

Continue lendo Aqui

+ sobre o tema

Pedagogia de afirmação indígena: percorrendo o território Mura

O território Mura que percorro com a pedagogia da...

Aluna ganha prêmio ao investigar racismo na história dos dicionários

Os dicionários nem sempre são ferramentas imparciais e isentas,...

Peres Jepchirchir quebra recorde mundial de maratona

A queniana Peres Jepchirchir quebrou, neste domingo, o recorde...

Apenas 22% do público-alvo se vacinou contra a gripe

Dados do Ministério da Saúde mostram que apenas 22%...

para lembrar

15 coisas que você já ouviu sobre feminismo, mas que não passam de mentiras

'O feminismo é odiado porque mulheres são odiadas' A frase...

Guevedoces: o estranho caso das ‘meninas’ que ganham pênis aos 12 anos

Condição parece ligada a uma deficiência genética comum em...

Obesidade: Ofensas corporais e preconceito deixam as pessoas mais doentes

Chamar alguém de ‘gordo’ ou ‘magro’ pode ter sérias...

Seminário internacional Brasil/EUA debate violência contra mulher

Evento aborda programas para homens autores de violência Do MPSP O...
spot_imgspot_img

Educação antirracista é fundamental

A inclusão da história e da cultura afro-brasileira nos currículos das escolas públicas e privadas do país é obrigatória (Lei 10.639) há 21 anos. Uma...

Refletindo sobre a Cidadania em um Estado de Direitos Abusivos

Em um momento em que nos vemos confrontados com atos de violência policial chocantes e sua não punição, como nos recentes casos de abuso...

O homem branco brasileiro de condomínio e o ato simbólico de “descer”

No documentário Um Lugar ao sol (Daniel Mascaro, 2009), sobre moradores de coberturas, temos um clássico exemplo de como a arquitetura brasileira revela a...
-+=