Sony e Tiririca ‘bombam’ na imprensa dos EUA, por Humberto Adami

A imprensa dos EUA tem “bombado” a notícia da sentença da condenação da SONY no caso TIRIRICA no Brasil.

Só na semana passada foram 4 publicações em sites importantes, citando a condenação do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, de como exemplo a ser seguindo, inclusive nos Estados Unidos.

A tradução da letra da música de “Veja os cabelos dela” tem causado maior irritação nas mulheres, especialmente as mulheres negras, (mas não apenas estas), pois até hoje, a empresa condenada vem justificando que a música dizia respeito apenas à mulher dele. “E onde ele arranjou este direito de falar da mulher dele assim?”, tem perguntado algumas das debatedoras e comentaristas dos sites e jornais.

O que se percebe é que mais do que a notícia esteja causando impacto no Brasil, é nos EUA que o caso tem sido identificado um exemplo a ser seguido inclusive para outras situações. Isto é importante pois os contrários à ação afirmativa no Brasil, cotidianamente acusam os defensores da ação afirmativa para negros de “importar americanismos”, como ação afirmativa, acusando publicamente a Fundação Ford.

Ivone Maggie, Ali Kamel, Demétrio Magnolli, Peter Fry, e mais recentemente, Roberta Kaufmann e o Senador Demóstenes Torres (DEM-GO), tem incluído em seu discurso anti-cotas essa cantilena de sempre. Um certo Antonio Militão também repetiu isto aqui e acolá.

Pois bem. O que a decisão do TJ RJ aponta, ao contrário de pelo menos outros quatro tribunais estaduais brasileiros ( SP, MG, BA, RS), é que o Brasil está “exportando” tecnologia jurídica de combate à discriminação racial, baseado em esforços de um grupo de advogados do movimento negro no Rio de Janeiro, aliado a militantes históricos deste mesmo movimento, que se juntaram para produzir umas das mais belas páginas da libertação do negro no Brasil, desde a escravidão, utilizando-se das ferramentas práticas do modelo capitalista. Construir este “know-how” ( para ficar nos “americanismos”) do uso do Judiciário na repressão às condutas racistas das corporações, é uma das principais metas do que chamo de “Advocacia de Combate”, título de meu livro em fase de revisão.

A ausência de percepção desses sutis movimentos por parte da imprensa brasileira, excepcionados poucos veículos e alguns jornalistas que rotineiramente tratam do tema, além de parte da “imprensa negra” atenta que acontece no assunto, constitui um vácuo no observar do cotidiano das relações no Brasil, e que frequentará a pauta do Supremo Tribunal Federal, ainda este ano, em diversas oportunidades.

Cito a reportagem do Huffington Post, cuja análise das referências e links dá a idéia do movimento da internet, como o grupo BLACK WOMAN WITH LONG HAIR, e o site do BRAZILIAN BLACK WOMEN, responsáveis por fazer chegar ao HP a notícia.

A reportagem completa de CNN Lawsuit highlights Brazil’s struggles with race – CNN.com  torna a discussão mais que internacional, e dá a devida importância que o fato adquiriu, como modelo e espelho para outras lutas mundo afora. Devido a chamada globalização os fatos são hoje intercomunicantes, e se influenciam entre si.

A reportagem do Sony Music Fined Over Half A Million Dollars Over Brazilian Song … do SITE BOSSIP, dá idéia do que achou da letra da música de Tiririca, traduzida para o ingles: simplesmente horrível.

A reportagem Sony’s Brazilian Arm Ordered to Pay Damages for Racist Song, com fundo musical de rapper, demonstra que o tema virou discussão em todos os segmentos do movimento negro norte-americano, e que deverá ser objeto de mais estudo ä frente.

Até o movimento White Power, dos neozistas do STORMFRONT, que volta e meia ameaçam ativistas de direitos humanos no Brasil, e que esconde grande números de brasileiros, entrou na discussão com identidades falsas, e que se podem ser vistas em http://www.stormfront.org/forum/t857987/ e http://www.stormfront.org/forum/ . Detestaram a decisão e aplaudiram a letra de Tiririca.

A imprensa brasileira deu alguns informes na época dos julgamentos, mas não tem entrado de fato no miolo, importância e significado do que ocorrido . Mesmo pequenos veículos dedicados à chamada “mídia étnica”, tem feito registros burocráticos tratando o assunto como se fosse uma sentença de juizado de pequenas causas. Não é.

É um caso histórico feito a muitas mãos, que ainda vai servir de referencia para muitas outras situações e canções no Brasil, e fora dele. A repercussão que o assunto vem tomando, quer seja pelo ineditismo da decisão; do porte economico da ré Sony; pela letra que consegue a repulsa imediata da maioria dos que a ouvem; da longa luta das entidades do movimento negro, em especial de mulheres negras de todo o Brasil; e pelo polêmico resultado do valor economico ir para o Fundo de Direitos Humanos do Ministério da Justiça, de acordo com a lei de ação pública, sugerem que o tema deveria ser tratado com mais interesse pela mídia brasileira, pois convencem a um observador atento, que o quadro muda, ainda que vagorosamente.

O Estatuto da Igualdade Racial ( Lei 12.288/2010) até hoje sem regulamentação pelo Governo Federal, e estaduais, no que pertine, e aplicação prática, no que possível independente da regulamentação, deveria chamar a atenção de todos para que as contas da desigualdade racial podem ficar cada vez maiores.

É a economia encostando na luta pela igualdade racial, seguindo os passos da luta pelo meio ambiente, que teve igual trajetória.

Materias relacionas

Lawsuit highlights Brazil’s struggles with race

 

Race Matters: Sony Ordered To Pay Half A Milli In Damages After Brazilian Song Calling Black Woman “Stinking Beast” And Comparing Her Hair To Scouring Pads Is Deemed Racist

 

Humberto Adami

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