Zika no carnaval: O zika e o aborto

tensão e tesão.

Por Lelê Teles , enviado pra o Portal Geledes

Reprodução/ Twitter

é carnaval, vai começar um festival de picadas.

mas, atentai bem, não é porque é carnaval que você vai levar a palavra picada ao pé da letra.

falo do mosquito.

atenção, falo aí quer dizer exatamente isso, do verbo falar.

o aedes vai picar muito neste carnaval.

e não tem sarocoteio de cadeiras de passista que impeça o danado do mosquito de beliscar bundas, peitos, braços, barrigas, tudo o que fica à mostra nos festejos de Momo.

o diabo é que já temos quase 4 mil casos de microcefalia que, alegam os médicos, foram provocados pela contaminação das gestantes pelo vírus africano.

suspeitam inclusive que o Zika pode ser transmitido na relação sexual.

não digo sexo entre mosquitos ou entre humanos e mosquitos, mas entre humanos e humanos.

um mano que foi picado e infectado pode infectar outro humano ao picá-lo.

nesse caso aí picada é picada mesmo.

agora é atenção dobrada, repelente contra uma picada e camisinha para prevenir a outra.

pois é melhor prevenir o que não se pode remediar.

a grávida Fernanda de Souza​ me pergunta, depois de tanto ouvir a propaganda na TV:

“pica-me uma dúvida: se a pessoa zikada fica com o vírus inativo em média entre 5 a 6 dias. O mosquito infectado por uma pessoa zikada fica com o vírus inativo por 8 a 12 dias. Como o carnaval, segundo nossos especialista e autoridades, pode causar uma explosão da epidemia?”

santo deus. a embarazada tem razão.

confesso que consultei meus alfarrábios em busca de uma explicação metafísica.

porque a conta não bate.

tentei com calculadora analógica e digital. cheguei a recorrer ao ábaco;

e nada.

se cai uma questão dessa no ENEM, o que será da nossa juventude?

a máquina de desinformação, a fábrica de midiotas, a usina do pânico e do medo como espetáculo, vai cantando sua marchinha.

zikando o carnaval.

vendendo mais um simulacro. tudo mercadoria.

agora me chega mais essa: especialistas – sempre eles – já aconselham mulheres a não engravidar nesse período.

veja que satanagem.

o mosquito transmissor da malária foi, durante muitas décadas, o maior defensor da floresta amazônica.

agora surge o aedes como um vetor de controle de natalidade.

e mais, governos estrangeiros dissuadem suas cidadãs grávidas de voarem até os trópicos para a festa da carne.

esse é o primeiro carnaval que até gestantes estarão sujeitas a picadura.

e quem já foi picada e engravidou?

aborta?

bom, aí é que entra a hipocrisia nossa de cada dia.

um conselho formado, em sua grande maioria, por homens brancos, cristãos e heterossexuais dirá que é melhor a mulher abortar que ter que conviver com um filho microcéfalo.

a igreja dirá: bom, nesse caso tudo bem. microcéfalos não costumam dar ofertas em igrejas.

enfim, esse será mais um caso em que se abrirá uma exceção para que a mulher possa abortar.

o aborto, senhoras e senhores, só não pode ser uma decisão unilateral da mulher, sobretudo da mulher pobre.

até um mosquito pode decidir o que uma mulher fará ou não com o seu próprio corpo; mas uma mulher, não.

é o fim da picada.

palavra da salvação.

 

** Este artigo é de autoria de colaboradores ou articulistas do PORTAL GELEDÉS e não representa ideias ou opiniões do veículo. Portal Geledés oferece espaço para vozes diversas da esfera pública, garantindo assim a pluralidade do debate na sociedade.

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