Mãe Beata: Contos da guerreira

Lançando livro no TJA, a ialorixá Mãe Beata de Yemanjá inaugura, amanhã, o projeto Divinas Palavras

 

Amanhã, no Theatro José de Alencar, ela lança a segunda edição da obra, a partir das 16 horas, no projeto Divinas Palavras. O lançamento abre uma série de encontros envolvendo os valores, crenças e saberes religiosos e contará com a presença da ialorixá, que ministra ainda palestra sobre o livro. O público será recebido pelo Grupo Dança Afro Alagba, que às 16 horas se apresenta nos jardins do TJA.

Uma feirinha com direito a serviço de massoterapia e tabuleiro de acarajé também será montada no lugar, ambientado pela exposição “Indumentária Fulô de Mandacaru”. O lançamento do livro acontece às 18 horas, com a palestra da Mãe Beata no Palco Principal. O ingresso tem o valor simbólico de dois quilos de alimentos não perecíveis que serão doados a Casa do Sol Nascente.

Contos

O livro foi o primeiro escrito por Mãe Beata, publicado originalmente em 1997 e reeditado em 2008. Natural de Iguape, no Recôncavo Baiano, foi no Rio de Janeiro que Beatriz Moreira da Costa, criou seu terreiro e tornou-se uma das figura mais respeitadas do Candomblé no Brasil.

Rebelde desde seu nascimento, como ela mesmo se define, militou intensamente em causas ligadas à cultura, religião e cidadania de populações afro-brasileiras, organizando encontros, mobilizando a luta por direitos e contra o preconceito, campanhas de solidariedade e realizando projetos sociais voltados às comunidades negras.

Entre as honrarias em reconhecimento ao seu trabalho, está o Diploma de Personalidade de Destaque da Comunidade Negra, outorgado em 1991 pela Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro; o Prêmio Orilaxé, do grupo Afro Reggae, concedido em 2002; a Medalha de Mérito Cívico Afro-brasileiro, homenagem prestada em 2005 pela Universidade da Cidadania Zumbi dos Palmares e o diploma Mulher-Cidadã Bertha Lutz de 2007, do Senado Federal. Atualmente, ela é a presidente de honra do grupo de mulheres negras Criola.

Repleta de marcas da oralidade, a linguagem é singela e direta, sem grandes artifícios literários. A força das histórias de Mãe Beata está em sua ancestralidade, como um registro em papel de ensinamentos transmitidos por gerações no dia a dia, em rodas de contação, nos conselhos das mães aos mais jovens, nos encontros nos terreiros. Intrigas de vizinhos, visagens, brigas de casais e até o gosto exagerado de uma mulher pelo samba servem de pano de fundo para os contos de lições de vida, conselhos morais e demonstração da força dos orixás.

Para quem não está acostumado ao universo místico e às práticas das religiões afro-brasileiras, é certo que algumas nuances passam despercebidas. A universalidade das situações, dos valores éticos e a própria imersão no cotidiano brasileiro permitem, no entanto, um entendimento em meio às descobertas, como crianças que escutam os avós anunciarem os mistérios da vida.

Em livro, a ialorixá publicou ainda “As histórias que minha avó contava”, em 2005, e participou da coletânea “O livro da saúde das mulheres negras”, em 2000, com o registro “Tradição e Religiosidade”, em que ela relembra sua luta desde a infância, das injustiças sofridas dentro da própria célula familiar, as dificuldades financeiras e de saúde, tendo como pano de fundo o preconceito e as investidas históricas contra a cultura trazida pelos escravos africanos.

Trajetória

Mãe biológica de quatro filhos, aos 81 anos de vida, Mãe Beata é hoje aposentada como costureira da Rede Globo de Televisão – onde trabalhou a partir da década de 1970, após mudar-se para o Rio de Janeiro – e segue como um nome forte na militância por melhorias para os negros. Além de ialorixá do Ilê Omi Oju Arô, é Conselheira da Rede Nacional de Religiões Afro-brasileiras e Saúde, que no Ceará tem coordenação de Leno Farias e Kelma de Yemanjá; além de apoiar iniciativas como o Projeto Ató Ire – Saúde dos Terreiros, da qual é conselheira, e a ONG Viva Rio.

Sua história de vida se confunde com as bandeiras que levanta em prol de melhorias para as comunidades negras. Identificada desde criança com Yemanjá, após uma infância atribulada, na década de 1950 mudou-se para Salvador, onde foi morar com sua tia Felicíssima e seu marido Anísio Agra Pereira, que era babalorixá. O apelido Beata, também de criança, sempre a acompanhou. De menina à Mãe Beata, sempre frequentou os terreiros e esteve ligada à religiosidade afro.

Vítima de preconceito dentro da própria família, após se divorciar do pai de suas crianças, Apolinário Costa, ela mudou-se para o Rio de Janeiro em 1969, em busca de melhores condições para criar os filhos. Entre a militância pelas causas dos negros, a dedicação ao candomblé e o trabalho na Rede Globo, somente em 1985, aos 54 anos, recebe a outorga de Mãe de Santo.

FIQUE POR DENTRO

Antropologia e a voz do povo do santo

O antropólogo cearense Ismael Pordeus Jr. é uma autoridade nas diversas manifestações religiosas luso-afro-brasileiras. Seu novo livro “A Jurema Sagrada- Do Nordeste Brasileiro à Península Ibérica” também traz a narrativa, em primeira pessoa, de um pai-de-santo. Ismael organizou os textos do babalorixá pernambucano Arnaldo Burgos, que vive em Portugal, e mostra a permanência desta religião que mistura elementos africanos e indígenas, nascida no Nordeste, e bem acolhida na Europa. Ainda sem data de lançamento, o livro já está pronto e deve chegar às livrarias nos próximos meses.

LIVRO

Caroço de Dendê

Mãe Beata de Yemanjá

Pallas

2012, 123 páginas

R$ 20

Mais informações:

Lançamento do livro “Caroço de Dendê”, de Beata de Yemanjá, com palestra da autora e apresentações culturais. Amanhã, às 17 horas, no Theatro José de Alencar (Rua Liberato Barroso, 525 – Centro ). Entrada: Doação 2kg alimento não perecível. Contato: (85) 9953.6493 e 3101.2567

FÁBIO MARQUES

REPÓRTER

 

 

 

Fonte: Diário do Nordeste 

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