12 ativistas trazem esperanças para futuros feministas sem … Certas formas de fundamentalismos

Todas as pessoas que trabalham em questões que rodeiam os temas de gênero e fundamentalismos religiosos são confrontadas com um problema de representação.

Por Isabel Marler, do awid

Não que não haja cobertura suficiente para estas questões. De fato, o oposto pode ser verdade; frequentemente somos bombardeadas/os por notícias sobre atrocidades cometidas contra mulheres em nome da religião e contra as pessoas com não conformidade de identidade de gênero e sexualidade.

O problema com o que vemos e ouvimos sobre gênero e fundamentalismos é tanto a invisibilidade como a hipervisibilidade. Certas formas de fundamentalismos são supervisíveis, enquanto outras permanecem largamente desconhecidas. Mulheres e pessoas queer têm se tornado supervisíveis como vítimas, enquanto o papel que desempenham como agentes de mudança e as soluções progressistas que oferecem frequentemente permanecem invisíveis.

Os corpos das mulheres e das pessoas cujas sexualidades e identidades de gênero não se encaixam na “norma” são desproporcionalmente afetados por fundamentalismos. Elas/eles também ocupam invariavelmente os primeiros lugares da violência policialesca praticada por estados, comunidades e famílias em nome da religião e da cultura. Mas apesar disso (e por isso!), há inúmeras pessoas confrontando fundamentalismos em formas inventivas e verdadeiramente radicais. Enquanto a atuação ativista dessas pessoas passa despercebida, convencionalmente se recai em soluções que apenas alimentam o ciclo de violência – militarismo, criminalização e o fechamento de espaços da sociedade civil.

É por esta razão que a AWID formou uma equipe com a ilustradora Carol Rosetti para celebrar os indivíduos que desafiam os fundamentos religiosos a partir de uma perspectiva feminista. Damos uma olhadela em parte deste trabalho executado por 12 ativistas que participaram de uma recente convocatória da AWID. Ao mostrar estes retratos no Fórum AWID 2016, nosso objetivo é, em nossa pequena escala, provocar rupturas na narrativa hegemônica.

Aqui estão somente 12 pessoas inspiradoras e um vislumbre do trabalho que fazem, em diferentes situações e de diferentes formas. Mas além destas 12, há milhares e milhares de feministas em todo o mundo que estão na linha de frente da resistência aos fundamentalismos religiosos. Elas não estão resistindo apenas à vontade de recuar, mas ativamente criam alternativas – construindo novos mundos feitos de igualdade, justiça e paz.

Quem é sua/seu heroína/herói no desafio aos fundamentalismos religiosos? Há uma pessoa ou grupo que conheça e que faça um grande trabalho nesta área? Comente abaixo ou partilhe via Twitter, Instagram ou Facebook. Lembre-se de nos marcar @AWID e de usar as hashtags #FuturosFeministas – você pode até partilha em uma sexta-feira e tornar a sua contribuição parte do #FeministCrushFriday!

1. Zainah Anwar

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 “Deus não pode ser Deus se Deus é injusto”.

Zainah Anwar, a Diretora de Musawah acredita que para romper com as forças conservadoras no campo da religião e das políticas públicas feministas vivendo em contextos mulçumanos é preciso ganhar conhecimento e coragem para oferecer uma visão alternativa que concilie o islamismo com os direitos das mulheres. O livro de Musawah Homens no comando? Repensando a autoridade na tradição legal mulçumana é inovador em seu desmantelamento do “DNA do patriarcado” na tradição legal mulçumana, e seu Marco para Ação é usado por defensoras/es que exigem reforma por igualdade de gênero em todo o mundo.

2. Ana Francis Mor

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“Precisamos pensar em nós mesmas/os como criadoras/es de nossas próprias verdades.”

Ana Francis Mor é uma artista mexicana e escritora cujo grupo de cabaréLas Reinas Chulas leva discussões sobre gênero e religião para fora da academia e diretamente para pessoas nas ruas, nos teatros e oficinas, e por meio do rádio e da televisão – tudo com uma dose generosa de humor irônico. Uma das personagens mais conhecidas de Ana é Santa Rita, que descreve a si mesma com santa padroeira da comunidade LGBT e membro do Coletivo VSV – Virgens que têm Sexo com Virgens! Este trabalho, Ana diz, é uma forma de “criar nossas próprias verdades”, rompendo com o monopólio que as autoridades patriarcais têm sobre os discursos espirituais.

3. Isatou Touray

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“O silencia mantém o status quo. Eu decido falar. Eu decido me levantar.”

Isatou Touray dedicou sua vida a acabar com a mutilação genital feminina em seu país natal, Gâmbia, e em aumentar globalmente a consciência sobre o tema. Sua organização, GAMCOTRAP, trabalha dentro das comunidades buscando alcançar um consenso: “deixar cair a faca” usando uma combinação de oficinas de conscientização, envolvimento de líderes locais e programas para proporcionar empregos alternativos pessoas que executavam a mutilação. Isatou diz que a luta pelo fim da prática tem mudado os paradigmas em Gâmbia; anteriormente os homens eram vistos como os únicos repositórios do saber, mas agora as mulheres estão se referindo aos textos religiosos para justificar suas reivindicações por direitos, rompendo com o controle da informação pelos religiosos e alimentando novas formas de liderança feminista.

4. Sandra Mazo

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“Precisamos entender nosso poder e energia, precisamos ser conscientes que somos fortes.”

Católicas pelo Direto de Decidir – Colômbia, a organização na qual Sandra Mazo trabalha, lidera uma campanha por um estado laico na Colômbia e por toda a América Latina. A CCD-Colômbia articula as vozes das mulheres católicas que não se sentem representadas pelas visões das/os católicas/os ortodoxas/os e não aceitam a imposição da Igreja em suas visões sobre as políticas estatais.  Os vídeos da campanha têm trazido um melhor entendimento do real significado do secularismo e a promessa que mantém de uma sociedade democrática na qual os direitos de todas as pessoas sejam garantidos.  Quando se fala sobre as reações negativas que ativistas pelos direitos das mulheres enfrentam, Sandra vê o lado positivo, dizendo ser este um sinal de que os caminhos feministas estão ganhando. Isto reflete-se na frase escolhida para seu retrato.

 

5. Dawn Cavanagh

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“Amor e compaixão são centrais para nosso ativismo. Porque não podemos esperar por alegria. Alegria é uma luta em si mesma”.

Dawn Cavanagh e sua organizaçãoo, a Coalização das Lésbicas Africanas(CAL) acredita no poder do diálogo e das ideias. O domínio que as ideias refletem é o mecanismo por meio do qual os fundamentalismos exercem controle sobre as escolhas e vidas das pessoas. Com base neste pensamento, a Coalizão emprega uma estratégia que chamam de abordagem “pense por si mesma/o”. As discussões são facilitadas a partir de ideias comuns, centradas em questões como “a quem esta ideia realmente pertence”? e “o que exatamente são suas ideias sobre esta ideia?” Por meio desta provocação, as pessoas constroem as ferramentas de análise crítica para resistir tornando-se “consumidoras/es complacentes das ideias de outras/os”. Um futuro feminista de acordo com a Coalizão é aquele onde todas as pessoas são agentes de suas próprias vidas e funcionam como seres autônomos, ao mesmo tempo em que são parte de múltiplas relações sociais com as quais dialogam – tudo em um contexto de justiça social onde um dano é em verdade um dado para todas/os.

 

6. Nilza Iraci Silva

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“ Nós negras ousamos resignificar o conceito do Bem Viver, apostando na utopia de uma vida plena, com dignidade, justiça e prazer. É simples assim.”

Nilza Iraci Silva é Presidenta e Coordenadora de Comunicações do Geledés – Instituto da Mulher Negra, no Brasil. Geledés tem preenchido lacunas vitais no cenário da justiça social do Brasil, trabalhando na interseção de raça e gênero. Quando se trata de questões ligadas a religião, isso significa lidar com a invasão de atores evangélicos e católicos conservadores na vida pública e os efeitos desastrosos que isto tem nas vidas das mulheres negras em particular. O que também significa denunciar o racismo dos discursos religiosos dominantes, que exclui e prega o ódio contra as religiões de matriz africana. Nilza trabalha há três décadas nas lutas feministas e antirracistas brasileiras e atuou também no processo de redemocratização do Brasil.

7. Cynthia Rothschild

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 “Precisamos estar na luta, sempre ferozmente, e com sabedoria, cuidado e compaixão”.

Cynthia Rothschild é uma ativista, autora e formadora há mais de 25 anos. Em 2011 e 2015, ela atuou como consultora para o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, onde fez contribuições para dois relatórios inovadores sobre discriminação e violência com base em orientação sexual e identidade de gênero. Cynthia acredita na utilização estratégia dos sistemas de direitos humanos internacionais, tanto a nível regional como a nível das Nações Unidas, para promover as agendas de direitos e recuar contra os ataques de atores conservadores nestes espaços. Enquanto a oposição se mantiver lá – tão poderosa e com bons recursos –feministas também devem estar lá. Segundo ela, é fundamental dizer “estamos de olho, estamos participando e vamos lutar por nossas prioridades e comunidades.”

8. Sussan Tahmasebi

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 “O extremismo é sobre poder político, não religião. Ao combatê-lo, as mulheres oferecem alternativas progressivas que defendem os direitos, a pluralidade e a diversidade.”

Sussan Tahmasebi é uma ativista da sociedade civil e pelos direitos das mulheres há mais de duas décadas. Ela foi membro fundadora daCampanha Um Milhão de Assinaturas que envolveu diretamente iranianas/os de todas as representações da sociedade para recolher assinaturas em oposição às leis discriminatórias com base em gênero. Sussan é a diretora de programa da ICAN para o Oriente Médio e o Norte da África, uma organização que apoia o ativismo da sociedade civil para a promoção dos direitos das mulheres, paz, e segurança humana nos países afetados pelo conflito, transição e espaços políticos fechados. Sussan é apaixonada pelo poder do diálogo Sul-Sul, criando oportunidades para troca de conhecimentos entre ativistas de vários países do Sul Global. Este é um dos princípios por detrás da última iniciativa do ICAN chamada WASL Women’s Alliance for Security Leadership), uma aliança independente que trabalha para impedir e lutar contra todas as formas de extremismo.

9. María Consuelo Mejía

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 “Reconhecer a liberdade de consciência própria de qualquer pessoa é essencial para a autodeterminação, um caminho seguro na busca pela felicidade.”

Maria Consuelo Mejía é Diretora das Católicas pelos Direitos de Decidir México (CDD-México), uma organização que defende os direitos humanos das mulheres e jovens a partir de uma perspectiva ética, católica, feminista e perspectiva laica. Uma das estratégias mais efetivas da CDD-México tem sido através de uma série de quadrinhos chamada Catolicadas. Catolicadasapresenta a Irmã Juana como sua protagonista, uma freira que sensibiliza o clero e sua congregação sobre os direitos LGBT e os direitos das mulheres, incluindo seus direitos sexuais e reprodutivos. A série oferece uma visão diferente daquela da igreja institucional, uma que veja a sexualidade como uma fonte de prazer e alegria, sem renunciar à sua fé ou alimentar a culpa.

10. Arvind Narrain

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 “Para ser plenamente humano precisamos parar de viver irrefletidamente em conformidade com o que dita a sociedade”

Arvind Narrain é a Diretora para Genebra da ARC Internacional e membro fundadora do Fórum de Direito Alternativo em Bangalore, Índia. Em 2008 e 2009 houve uma onda de violência vigilante no estado de Karnataka; grupos hindus nacionalistas estavam atacando jovens homens e mulheres que eram de diferentes contextos religiosos, somente por se associarem umas/uns com as/os outras/os. O Fórum de Direito Alternativo trabalha com três outros grupos, montando um desafio legal para levar justiça aos perpetradores. O foco do seu trabalho encontra-se em mostrar que a violência contraria os princípios fundamentais do país, conforme exposto na Constituição. Arvind descreve esta abordagem como agir como uma “âncora” contra o fundamentalismo na Índia, usando valores constitucionais como uma linguagem comum durante um momento de profunda polarização.

 

11. Janette Akhilgova

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“O mais importante é não sentir-se sozinha/o nesta luta. Nossos contextos são diferentes mas nossa causa é a mesma.”

Janette Akhilgova trabalha com a Peacebuilding UK na região Norte do Cáucaso, Rússia, e atua também como Líder do Conselho da RC-DEV, uma ONG local in Ingushetia. A Rússia é uma sociedade multiconfessional e enfrenta diversas formas de fundamentalismo. Em uma região majoritariamente mulçumana, o governo e o a sociedade civil têm desenvolvido algumas ações para o enfretamento aos crescentes fundamentalismo. Entretanto, Janete percebe que esses esforços sempre negligenciam a dimensão de gênero do problema. Por isso ela luta por plataformas mais fortalecidas de discussão e conscientização sobre o fundamentalismo e seus impactos sobre as mulheres, com esperança de alcançar mais solidariedade com aquelas/es que se opõem ao fundamentalismo na Rússia em sua região e através de alianças com pessoas e instituições em outros países.

12.  Khouloud Mahdhaoui

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 “A opressão política de gênero não pode ser vencida se não for por uma solidariedade política de gênero”.

Khouloud Mahdhaoui é Presidenta da Choug, uma organização na Tunísia que em 2014 começou um projeto chamado Choufhouhonna, um Festival Internacional de Arte em Tunes. Choufhouhonna foi a resposta para a falta de espaço público disponível para a expressão das mulheres, um problema conectado à predominância de discursos fundamentalistas na Tunísia pós-revolucionária. Khouloud descreve o festival de arte como desafiador da norma fundamentalista ao “abrir as ruas para as vozes e os corpos das mulheres “. A frase na fotografia de Khouloud captura a ideia de que a opressão baseada em gênero pode apenas ser superada por meio de uma política de solidariedade entre aquelas pessoas que experimentam esta opressão. Khouloud enxerga um feminismo inclusivo e diverso incorporado por Choufhouhonna como emblemático de sua visão de um futuro feminista:  um mundo no qual as pessoas podem ser diferentes mas manterem-se iguais, e reunirem-se por amor”.

 


A exibição “Futuros Feministas sem Fundamentalismos” será apresentada no Fórum AWID 2016 em Costa do Saúpe, Bahia, de 8 a 11 de setembro. A AWID estende os seus agradecimentos  a Akanksha Mehta por suas fotografias que foram usadas como base para alguns dos retratos.

Quem é sua/seu heroína/herói no desafio aos fundamentalismos religiosos? Há uma pessoa ou grupo que conheça e que faça um grande trabalho nesta área? Comente abaixo ou partilhe via Twitter, Instagram ou Facebook. Lembre-se de nos marcar @AWID e usar as hashtags #FuturosFeminias & #FeministFuture – você pode até partilha em uma sexta-feira e tornar a sua contribuição parte do #FeministCrushFriday!

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