Marcha das Mulheres Negras 2018: Uma mistura de emoção e militância

Uma mistura de emoção e militância, ocorreu durante a marcha das Mulheres Negras 2018. Mulheres negras demonstraram sua força política enquanto marchavam contra o racismo, a violência e pelo bem viver. A marcha aconteceu ao som do grupo Ilú Oba de Min que resgata e valoriza a cultura africana. Flashes de vários momentos, olhos marejados com cada detalhe registrado e compartilhado nas redes sociais… O coração acelera e ainda sinto a forte energia de cada abraço trocado e cada beijo dado nesse grande reencontro de mulheres de várias partes de São Paulo.

Por Lu Santana para o Portal Geledés 

Marcha das Mulheres  Negras 2018 (Foto: Natália Sena /Geledés Instituto da Mulher Negra)

Sim, fiquei tão impactada emocionalmente com o nosso feito, que desde o dia do evento, tento expressar de maneira fiel o que foi participar desse ato histórico e deveras importante para a comunidade negra brasileira, mas me faltam palavras. Arrisco dizer que a região escolhida, cenário de grandes transações comerciais e seus contrastes sociais, foi ocupada por centenas de Marias Pretas. Tantas, que não seria capaz de contar…Tantas, que nem sei o nome, mas que me enxergo em cada uma delas, através dos laços de nossa ancestralidade.

Todas essas experiências, sem exceção, são destacadas pelos elos de sociabilidade e solidariedade, que se constituem, de forma geral e espontânea. Acredito que por partilharem histórias parecidas, bem como vontades e receios, as Mulheres Negras reconhecem-se umas nas outras, sem o dever de apresentações refinadas ou tempo de amadurecimento para estabelecer relações de amizade, credibilidade e ação conjunta.

Foi lindo! Presenciei mulheres negras em rede: Avós, mães, irmãs, tias, filhas, amigas, engenheiras, advogadas, professoras, escritoras, jornalistas, artistas em rede, ensinando, aprendendo, e construindo… Mulheres resolutas, firmes e bondosas. Vi disposição, solidariedade, engajamento, promessa cumprida e evolução.

Durante a marcha ouvi frases de cuidado trocadas mutuamente entre as integrantes da marcha como por exemplo: Uma sobe e puxa a outra… Não esquece de mandar mensagem quando chegar em casa… Quem mexeu com você? Estamos juntas!

Senti que embora as mulheres negras caminhem por uma rota alternada por batalhas e vitórias, estabelecida pelas nossas ancestrais, ainda não tiveram a oportunidade de vivenciar um contato direto com essa história de luta na prática. Senti que ser Mulher Negra faz parte de uma construção coletiva, que não se dá apenas por meio de pesquisas ou livros, às vezes essa transformação se dá apenas após a experiência vivida. Que o nosso combustível é a urgência de nossas necessidades. Senti que conhecer a nossa história e requerer nossa ancestralidade nos faz nos entendermos enquanto mulheres negras para nós mesmas e posteriormente, para o mundo.

Após a marcha aprendi que solidariedade e sociabilidade são ferramentas para a vida social da classe popular, nesse caso da Mulher Negra. A habilidade com o exercício de ambas ferramentas, poderia ser interpretada como uma forma de capital social, que se transforma em capital político, viabilizando ações sociais transformadoras, ainda que apenas no meio no qual ocorrem. Sendo assim, resultaria em mudanças de dentro para fora.

Em muitos lares, a terça-feira a noite é reservada para a família e posso afirmar que, em quase 100% deles, lá estão as mulheres preparando a refeição com o que tiverem em casa. Mas, desta vez, estas mesmas mulheres, continuaram, sim, cuidando de suas famílias e de sua própria existência, indo para rua denunciar, protestar, exigir, para dar voz, volume e cor às nossas pautas.

Durante todo o percurso, cantamos e dançamos ao som do grupo Ilú Oba de Min, dos batuques e vozes do Bloco de Jongo Filhos da Semente. São em encontros como esse, que restauramos nossas forças. Angela Davis disse: __ “Quando uma mulher negra se movimenta, toda a estrutura da sociedade se movimenta com ela”. E se é de movimento que é feita a vida, sigamos!


** Este artigo é de autoria de colaboradores ou articulistas do PORTAL GELEDÉS e não representa ideias ou opiniões do veículo. Portal Geledés oferece espaço para vozes diversas da esfera pública, garantindo assim a pluralidade do debate na sociedade.

+ sobre o tema

A cretinice de quem vaza – e compartilha – vídeo íntimo

Fran, de Goiânia, teve um vídeo íntimo divulgado pelo...

A capa do mundo é nossa – Por: Cidinha da Silva

A capa do mundo é nossa Com a Lupita Não há...

Semana da Visibilidade Trans apresenta alerta à saúde LGBT

Semana da Visibilidade Trans apresenta alerta à saúde LGBT. A...

Mulher negra e feminismos

Texto de Ana Rita Dutra com colaboração de Bia...

para lembrar

Especialização em Gênero, Sexualidade e Direitos Humanos: inscrições até 17/12

Estão abertas, até 17 de dezembro, as inscrições para...

Por que Hollywood tem problemas com garotas pouco femininas?

Na série de ficção científica da Netflix “Stranger Things”,...

Vigiar e estuprar

Como mulher estuprada, eu gostaria de poder nunca mais...

Parem de nos matar – por Maria Clara Machado

Em crônica publicada em janeiro de 1915, intitulada “Não...
spot_imgspot_img

TSE realiza primeira sessão na história com duas ministras negras

O TSE realizou nesta quinta (9) a primeira sessão de sua história com participação de duas ministras negras e a quarta com mais ministras...

Em reunião com a ministra das Mulheres, movimentos denunciam casos de estupros e violência em abrigos para atingidos pelas enchentes no RS

Movimentos feministas participaram de uma reunião emergencial com a ministra da Mulher, Cida Gonçalves, no final da tarde desta terça-feira (7), de forma online....

Documentário sobre Ruth de Souza reverencia todas as mulheres pretas

Num dia 8 feito hoje, Ruth de Souza estreava no Theatro Municipal do Rio de Janeiro. O ano era 1945. Num dia 12, feito...
-+=