Foi no dia 14 de março de 2018, há 20 meses, que um crime mudou para sempre a História do Brasil e do mundo. Nesta data, foram brutalmente assassinados a defensora de direitos humanos e parlamentar no exercício do seu mandato Marielle Franco e seu motorista, Anderson Gomes. Suas mortes levaram consigo sonhos individuais e coletivos, a alegria de duas famílias e uma interlocutora fundamental para uma série de cidadãos e cidadãs do Rio de Janeiro que eram beneficiados pela atuação de Marielle, incluindo aí jovens, negros e negras, moradores de favelas, mulheres, pessoas LGBTI, policiais vítimas da política de segurança pública e seus familiares. A demora na solução deste caso arrasta consigo a credibilidade de autoridades e instituições brasileiras.
Infelizmente, Marielle não foi a primeira defensora de direitos humanos a ser vítima de violência no Brasil, mas a repercussão de sua história, somada à demora em dar respostas por parte das autoridades, ressoa cada vez mais alto nos ouvidos de todas as pessoas que atuam pela defesa do bem coletivo: vocês não estão seguros e seguras. Pior, somamos cada vez mais vítimas, como é o caso do indígena Paulo Paulino Guajajara, assassinado no início do mês no Maranhão. Ele era um guardião da floresta e defendia o território de seu povo.
Desde as primeiras horas dos assassinatos da Marielle e Anderson, a Anistia Internacional cobrou justiça. E, para nós, a justiça só estará garantida quando todos os envolvidos nessas mortes tiverem sido identificados, levados à justiça e submetidos a julgamentos justos, imparciais, transparentes e céleres. Hoje, 20 meses depois, estamos bem longe disso. O labirinto do caso Marielle Franco, que apresentamos no início deste ano e expressava 23 perguntas sem respostas relacionadas às execuções de Marielle e Anderson, só aumentou.
Nos últimos dias, assistimos a uma inundação de denúncias, acusações, disputas políticas, desencontros de versões e silenciamentos por parte daqueles que deveriam estar, desde o primeiro dia, trabalhando de forma colaborativa com o objetivo de esclarecer este caso: as autoridades políticas e policiais do Estado do Rio e do país. Como palco, a imprensa. A velocidade com que são publicadas e avidamente consumidas as inúmeras notícias com as reviravoltas das investigações mostram a sede da sociedade por informações sobre a elucidação do crime. É um sentimento legítimo de quem se vê, há tanto tempo, sem respostas.
Entretanto, é preciso ter calma. O que existe hoje não são respostas e há pouquíssimas e insuficientes versões oficiais. Assistimos a uma espetacularização em torno do caso, que traz consigo uma grande confusão e nos distancia cada vez mais da pergunta que realmente importa: quem mandou matar Marielle Franco, e por quê?
É fundamental que não fiquemos presos nas paredes desse labirinto. Nós, sociedade civil e comunidade global, que somamos mais de 780 mil pessoas que exigimos uma solução para o caso em petição entregue ao Govenador do Rio, Wilson Witzel, e ao Procurador Geral do Ministério Público do Rio de Janeiro, Eduardo Gussem, em março deste ano, precisamos estar vigilantes e atentos. A quem interessa o vazamento de tantas informações que supostamente deveriam estar sob sigilo? Quem está por trás destes vazamentos?
Vazamento não é resposta e transparência não é quebra de sigilo. Desde o início das investigações, demandamos a criação de uma comissão de especialistas independentes para acompanhar os trabalhos e atestar se estavam obedecendo a todos os procedimentos legais e corretos. A guerra de informações a que assistimos agora de forma atordoante é impulsionada pela falta de transparência.
É imprescindível que as autoridades responsáveis pelas investigações disponham de todos os recursos para identificar os envolvidos neste crime bárbaro, doa a quem doer. À sociedade, pedimos cautela. Às autoridades, exigimos transparência e resposta. Não descansaremos até que se faça justiça para Marielle e Anderson, e até que todos os defensores e defensoras de direitos humanos estejam seguros para atuar neste país.