Cientista publica primeiro genoma de homem negro

Esta semana está sendo especial para os negros não só no campo da política. Ontem, um dia após Barack Obama discursar como presidente eleito dos EUA, cientistas publicaram o primeiro genoma individual de um homem africano.

O trabalho, que sai na revista “Nature” juntamente com o genoma de um asiático, é um marco, dizem especialistas, pois amplia os dados que ajudam a revelar quantas e quais são as diferenças genéticas entre pessoas de etnias distintas.

A data de divulgação do estudo, porém, foi “mera coincidência”, disse à Folha David Bentley, da empresa de biotecnologia Illumina, que liderou o trabalho. “Nós não sabíamos que Obama seria eleito.”

O trabalho da Illumina e da equipe chinesa que seqüenciou um homem asiático não são exatamente análises do significado das diferenças genéticas entre indivíduos. Eles criam, porém, um material inédito sobre o qual outros cientistas poderão trabalhar.

A grande contribuição dos dois grupos foi descobrir novas “letras” do DNA humano que podem variar de uma pessoa para outra. São os chamados SNPs (polimorfismos de nucleotídeo único, no jargão biológico). Como toda pessoa tem duas versões de cada gene –uma herdada do pai, outra da mãe–, quando as duas são diferentes é possível achar novos SNPs dentro de cada um dos novos genomas.

Os dois trabalhos também compararam seus dados aos outros dois genomas individuais disponíveis (os dos biólogos americanos James Watson e Craig Venter) e com o banco de dados dbSNP, que tem informações parciais de variações entre europeus.

No genoma do africano, 26% da variabilidade achada era ainda desconhecida. “Significa 1 milhão de SNPs nunca vistos, saídos do seqüenciamento de uma única pessoa”, diz Bentley. “É um bocado de individualidade.” No seqüenciamento do chinês, feito no Instituto de Genômica de Pequim, 13,6% dos SNPs eram novos.

“Desracialização”

O que mais impressiona nos dados, porém, são as semelhanças, em vez das diferenças.

“Se olharmos o genoma do Venter, 30,1% dos SNPs presentes são exclusivos dele –não estão no dbSNP–, e no do Watson esse número dá 33%.. O do chinês agora apresenta uma diferença de 31,8%”, diz o geneticista Sérgio Danilo Pena, da UFMG, que leu os estudos na “Nature” a pedido da Folha. Grosso modo, isso significa que Venter é tão diferente de Watson quanto Watson é diferente de um chinês.

Os novos estudos, diz Pena, reforçam a tese de que dividir a humanidade em “raças” diferentes é uma idéia insustentável do ponto de vista da genética. Bentley, também, diz que prefere nem ouvir essa palavra.. “Estamos comparando indivíduos, não dissemos nada sobre raças”, afirmou.

Marcelo Nóbrega, geneticista da Universidade de Chicago, diz que os trabalhos na “Nature” chamam à atenção pela tecnologia usada, uma leitura expressa do DNA “picotado” em fragmentos muito pequenos. “Achava-se que essas tecnologias não dariam conta de seqüenciar o genoma humano, porque o tamanho das seqüências geradas é muito baixo, de 15 a 25 letras”, disse. “Montar um texto de 3 bilhões de letras a partir de peças assim parecia impossível. Os estudos mostram que é possível.”

Bentley diz que seu trabalho custou US$ 250 mil, mas a Illumina já está reduzindo o custo da técnica a migalhas. “No próximo ano esperamos que custe menos de US$ 10 mil”, afirma.

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