Na noite daquela sexta-feira, 11/08, um público majoritariamente negro se reunia no Centro Cultural Olido, no centro de São Paulo (SP), para prestigiar o lançamento do documentário “Projeto Rappers: A Primeira Casa do Hip Hop Brasileiro – História e Legado”. A obra narra o pioneirismo do projeto administrado pelo Geledés – Instituto da Mulher Negra.
Criado há 30 anos, a iniciativa é resultado do encontro do hip hop com o feminismo negro. No final da década de 1980, com a chegada do hip hop no país, jovens inseridos nessa cultura eram alvo constante da violência policial. Era comum rappers serem retirados do palco por policiais enquanto se apresentavam em periferias.
Alguns deles contataram as mulheres do Geledés em busca de proteção. Na época, o SOS Racismo, serviço de assistência jurídica gratuita para vítimas de discriminação racial e violência sexual, ganhava visibilidade. Esse contato inicial se estendeu para um seminário entre rappers e feministas negras, dando origem ao Projeto Rappers.
Ativo entre os anos 1992 e 1998, reuniu jovens do movimento hip hop em formações e encontros que visavam aliar a atividade cultural com a ação política. Outro objetivo era potencializar suas vozes para enfrentar e questionar as questões sociais vividas no seu dia a dia. Desde então, para esses jovens, o feminismo negro passou de conceito desconhecido para um modo de interpretar a realidade.
Autoestima e conhecimento para a juventude negra
À frente da sala de cinema lotada, profissionais envolvidos no documentário e no Projeto Rappers responderam às perguntas e contaram lembranças sobre a iniciativa. Entre os presentes, estava Lady Rap, uma das participantes. “O Projeto Rappers trouxe autoestima para a juventude negra”, disse.
Aplaudida de pé, Sueli Carneiro também estava presente e pontuou que o projeto fez com o Geledés fosse “mais longe” do que as fundadoras achavam que poderiam, e que provou que basta oferecer chances reais para que a juventude negra expresse seus talentos e mostre resultados positivos.
“Trinta anos depois, nenhum de nós morreu nem está preso. Estamos em várias esferas: na academia, na política, na arte”, contou Clodoaldo Arruda, que dirigiu o documentário em parceria com Mc Sharylaine – ambos fizeram parte do Projeto Rappers.
O nome de Solimar Carneiro foi lembrado durante todo o lançamento. Falecida em julho deste ano, foi fundadora do Geledés e coordenadora da iniciativa. “Solimar foi aquela que deu a mão para que nos tornássemos o que somos hoje, ela nos acolheu, isso foi um diferencial na nossa vida, porque, até então, não tínhamos alguém que nos olhasse sem estereótipos, que nos olhasse com amor”, afirmou Lady Rap.
“Solimar, presente!”, gritou Sueli com o braço levantado e punho fechado. “Presente!”, respondeu o público.
Com 40 minutos, o documentário oferece ao público imagens de acervo e depoimentos. O pioneirismo do projeto é marcado principalmente pelas cenas em que os jovens têm formações sobre raça, gênero, classe e direitos humanos, com a participação de líderes sociais e intelectuais.
A obra deve fazer brilhar os olhos dos fãs do movimento hip hop, além de mostrar a potência do movimento de mulheres negras. O documentário será exibido no Circuito SPCine, rede de salas de cinema da Prefeitura de São Paulo. É possível conferir a programação nas redes sociais do circuito.