Até 2022, eu não achava que fôssemos sobreviver. Era a época do governo de Jair Bolsonaro, um senhor que afundou o país no buraco de lama e desgraça, o que a gente sempre soube que aconteceria. Sabe quando você “entrega para deus”, essa coisa que falam quando a gente abre mão e deixa a “vida me levar”?
Vou ser bem repetitiva aqui. Vocês já devem ter visto todos os tipos de textos, reportagens, campanhas e absurdos sobre a crise climática que está pegando o Brasil. Se você não está sabendo, camarada, é isso que vou te contar aqui.
O mundo vai acabar e vamos todos morrer! Alguns vão morrer antes, porque a esteira das desigualdades sociais deixa na linha de frente os mais pobres, a população negra, indígenas, quilombolas, periferias inteiras, mulheres e crianças.
As cidades estão em frangalhos. Chuvas avassaladoras, um calor absurdo de morte, morte e morte. Lembra? Todos vamos morrer.
Cada semana, a ministra Marina Silva está em uma cidade diferente para tomar medidas e prestar solidariedade por tanta fumaça de queimada, tanta chuva, tanta morte por falta de adaptação climática. Os prefeitos andam contando os corpos, alguns pagam propaganda em grandes jornais para tentar a reeleição.
As sociedades estão entrando em uma zona de risco extremo. Afinal, qual civilização conseguirá se adaptar aos impactos descontrolados das mudanças climáticas, da extinção da biodiversidade, do racismo, da disparada das desigualdades sociais, da falta de água e da poluição industrial? O tempo está se esgotando e talvez não haja saída. Mas eu acho que o problema maior é que não há intenção de mudar.
O 1% mais rico do mundo ficou com quase 2/3 de toda riqueza gerada desde 2020, cerca de US$ 42 trilhões, seis vezes mais dinheiro do que 90% da população global – 7 bilhões de pessoas – conseguiram no mesmo período. Na última década, esse mesmo 1% ficou com cerca de metade de toda riqueza criada. Pela primeira vez em 30 anos, a riqueza extrema e a pobreza extrema cresceram simultaneamente. Os dados são da Oxfam, divulgados no relatório “A Sobrevivência” do mais rico – por que é preciso tributar os super-ricos agora para combater as desigualdades”, lançado em janeiro de 2023.
Ok, assumo que encaminhei esse texto para o extremo do pessimismo. O título deste artigo é a frase que inicia o manifesto Emergência climática: SOS de 700 cientistas, lançado pelo jornal Libération em setembro de 2018. Inevitavelmente, teremos um aquecimento futuro maior do que o de agora e quaisquer que sejam as medidas de mitigação não darão conta do que temos pela frente. Veja, o manifesto é de 2018. Em 2023, registramos o ano mais quente da história.
Dá tempo? Os mais otimistas dizem que vamos conseguir se os governos se comprometerem de verdade. Eu oscilo entre esperança, medo e raiva. Milhares de famílias estão agora em suas casas esperando dias melhores, saúde, qualidade de vida, transporte de qualidade, segurança, moradia e uma praça para brincar.
Temos um país sofrido demais, que acorda todos os dias com fome e com jovens negros assassinados pelo Estado. Os governos precisam se responsabilizar e transformar a política de morte em políticas pela vida das pessoas.
Mariana Belmont
É jornalista nascida em Colônia (extremo sul da cidade de São Paulo), trabalha com articulação e comunicação para políticas públicas. Atuou em cargos no governo sobre questões ambientais e de habitação na Prefeitura da cidade de São Paulo. Trabalhou como coordenadora de comunicação e articulação do Mosaico Bocaina de Áreas Protegidas pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Também é ativista, parte de movimentos ambientalistas e periféricos. Atualmente é Assessora sobre Clima e Racismo Ambiental de Geledés – Instituto da Mulher Negra.