Prisão de jovens negros com pouca quantidade de drogas é estratégia racista

Enviado por / FonteUOL, por Jeferson Tenório

Nos últimos dias, um vídeo do TikTok sobre um teste social com um homem negro cego pedindo ajuda e um outro homem branco, também na mesma situação, viralizou nas redes sociais. No vídeo, as pessoas repelem automaticamente o braço do homem negro ao serem tocadas, ao passo que há uma predisposição à solidariedade para com o homem branco.

O experimento procura mostrar o quanto a sociedade, de modo geral, ainda enxerga homens negros como uma possível ameaça. Nenhuma novidade até aí. A quantidade de pessoas negras assassinadas pela polícia ou os números absurdos de encarceramento nos presídios comprovam que ainda estamos longe de uma igualdade racial.

É o que sugere uma pesquisa inédita do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), coordenada pelo pesquisador Alexandre dos Santos Cunha, que analisou casos de 5,1 mil réus por tráfico de drogas em tribunais de Justiça estaduais no primeiro semestre de 2019.

A pesquisa traça um panorama representativo de 41,1 mil réus desse tipo de crime. O recente estudo foi patrocinado pela Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas do Ministério da Justiça e Segurança Pública e revela que o encarceramento de jovens negros com baixa quantidade de provas é bastante comum e corriqueiro. O mais assustador é que, em muitos casos, segunda a pesquisa, não há sequer apreensão de qualquer substância ilícita com réus.

A conquista de uma gramática antirracista, ou seja, de um vocabulário antirracista e que trouxe expressões e palavras como “branquitude“, “lugar de fala”, “privilégio branco“, “racismo estrutural“, ganhou mais espaço no meio social. Entretanto, esta mesma gramática ainda não penetrou de fato no Judiciário, que segue encarcerando pessoas negras com uma lógica baseada no perfilamento racial. Diante desses dados, não há como negar que a prisão de pessoas negras e periféricas, que são a maioria nos presídios, faz parte de um sistema injusto e racista.

A mudança de mentalidade de uma sociedade não se faz apenas com leis, mas também através de uma educação antirracista continuada, não só nas escolas, mas em todos os setores da sociedade. A questão é que, por mais que pesquisas como essas comprovem injustiças relacionadas à cor da pele, a visão do Estado permanece a mesma há séculos. As discussões raciais, tão avançadas no meio acadêmico brasileiro, não chegam aonde deveriam chegar. Pois pessoas negras continuam sendo encarceradas ou mortas.

Creio que a representatividade, por si só, não resolve o problema. Entretanto, é urgente que homens e mulheres negras ocupem postos de decisão no Judiciário. É desse modo que também podemos não só mudar a mentalidade social, mas também dar lugar à diversidade nesses setores importante da sociedade.

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