Por quê, irmãos? por quê?

por que os negros são identificados como descendentes de escravos e os brancos nunca são chamados de descendentes de escravizadores?

Enviado por Lelê Teles via Guest Post para o Portal Geledés 

Reprodução/ Twitter

hummmm, por essa você não esperava, hein?

aí tem coisa, você dirá.

e tem mesmo, e essa coisa chama-se discurso.

e na ordem do discurso, irmãos, a ideologia é um dos fatores mais importantes.

porque o lugar de fala daquele que fala fala muito sobre o quê aquele que fala tá falando.

se é que você me entende.

se liga nessa. essa construção narrativa sobre a escravidão já traz consigo diversas distorções, e todas elas calculadas.

vejamos esse exemplo, ninguém descende de escravos coisíssima nenhuma, descende-se de pessoas que foram escravizadas.

e que diferença isso faz, se pergunta o midiota.

ora, Pequeno Gafanhoto, quando eu digo pessoa que foi escravizada eu estou fazendo questão de mostrar que há um sujeito ativo naquela ação, onde o escravizado é o passivo.

é colocar a mão branca a segurar o chicote.

é preciso, de uma vez por todas, colocar os brancos escravizadores, e seus descendentes, dentro deste contexto.

porque se temos descendentes de pessoas que foram escravizadas, temos igualmente descendentes de pessoas que as escravizaram.

elementar.

afinal, se a escravidão jamais deverá ser esquecida, por que lembrar somente dos agentes passivos desta aberração histórica, econômica e social, esquecendo os agentes ativos, os que se beneficiaram do tráfico negreiro e até hoje se beneficiam de suas consequências históricas, econômicas e sociais?

aí é demais.

e ademais, eu gosto sempre de lembrar disso, não há um povo no mundo que mais deveria carregar consigo a marca da escravidão do que o povo hebreu.

tá na Bíblia, aqueles caras foram cativos no Egito, na Babilônia, no diabo a quatro. porém, nunca vi um único indivíduo chamar um judeu de descendente de escravos.

é que seus escravizadores desapareceram do mapa e não ficaria nenhum pouco bem carregar nas costas as marcas da escravidão de forma unilateral, como o querem fazer com os negros.

os judeus são conhecidos como filhos do holocausto, vítimas da perseguição cruel e brutal dos nazistas.

toda vez que pensamos em holocausto, a imagem do nazista é a primeira a vir em nossa mente. enxergamos nessa narrativa tanto as vítimas quanto quem as vitimou.

sobretudo quem as vitimou.

a narrativa da escravidão, à brasileira, evidencia apenas um dos lados.

que tal passarmos a usar a expressão descendentes de escravizadores só para provocarmos um estranhamento.

aí você vai dizer, mas no Brasil nem todos os brancos descendem de pessoas que escravizaram negros;

sim, mas por outro lado, nem todo negro descende de alguém que foi escravizado no Brasil.

entende a narrativa, a construção do discurso?

porque é preciso ter em mente que na ordem do discurso opressor e escravagista ainda se vê o negro como quase humano, e nunca se vê os brancos como desumanos, afinal foram os brancos que perpetraram os atos mais desumanos vista pela humanidade como o nazismo, as chacinas do comunismo, a Inquisição, as cruzadas, as colonizações cheias de estupros e genocídios…

no entanto, ainda se desumaniza o povo negro com a figura do macaco.

a desumanização, eu já o disse e insisto, é um recurso semântico utilizado em diversas culturas como xingamento, mas é sempre individual, sempre pessoal.

procura-se nos indivíduos que queremos atacar alguma semelhança física ou comportamental com um animal, por isso dizemos seu porco, sua galinha, seu burro, sua baleia, sua vaca, seu viado…

observe que o porco é sempre um indivíduo, aquele que joga lixo no cão, aquele que não se importa em viver no lixo, a chafurdar.

o burro é o midiota, o que não pensa e vive como um boneco de ventríloquo etc.

mas e o macaco?

o que leva um negro a ser identificado com um macaco, aí é que está a coisa. aí está o discurso e o lugar de fala de quem fala isso.

o negro não tem rabo, vive nas cidades e não está em um zoológico ou num circo; aliás, está na Casa Branca a presidir a nação mais poderosa do planeta.

mas aí, meu camarada, se você faz uma pesquisa no google, verá diversas imagens de Obama e Michelle como macacos, e sempre chimpanzés.

qual é a semelhança de Obama com um chimpanzé? zero.

o chimp tem pelos no corpo, típicos no homem branco e raros no homem negro. o chimpanzé tem os lábios finos, novamente típicos do homem branco e por baixo dos pelos, veja que coisa curiosa, o chimpanzé tem a pele branca.

ou seja, ele guarda mais semelhanças com um branco que com um negro.

mas o discurso te faz ver um negro ou ver o chimp.

e porque o chimp? porque ele tem quase 99% de semelhança genética com o homem, mas não é um homem, é semi racional, limitado, naturalmente selvagem e incivilizável.

entendeu agora o lance do lugar de fala de que falava Foucault?

palavra da salvação.

 

 

** Este artigo é de autoria de colaboradores ou articulistas do PORTAL GELEDÉS e não representa ideias ou opiniões do veículo. Portal Geledés oferece espaço para vozes diversas da esfera pública, garantindo assim a pluralidade do debate na sociedade.

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