Mulheres assumem a linha de frente contra Cunha e contra o impeachment

Após a abertura do pedido de impeachment contra a presidenta Dilma Rousseff, aceito pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, diversos movimentos sociais têm questionado a legitimidade da ação, entre eles e, sobretudo, o movimento feminista.

Do Sputniknews

Nesta segunda-feira (7), a Sputnik falou sobre o tema com Talita Tanscheit, doutoranda em Ciência Política do IESP-UERJ e destacada militante da Marcha Mundial das Mulheres.

A seguir, você confere a entrevista na íntegra.

Sputnik: Fale-nos um pouco sobre o movimento “Mulheres contra Cunha” – como o presidente da Câmara dos Deputados afeta o movimento feminista e qual é seu papel na questão do impeachment? 

Talita Tanscheit: Na realidade, o Cunha é um opositor antigo dos direitos das mulheres e das conquistas que a gente vem tendo no Brasil, mas desde que ele assumiu a presidência da Câmara, ele tem posto uma clara agenda de restrição de direitos – e não apenas dos direitos das mulheres, mas também dos direitos LGBT, dos direitos da população negra e de direitos da classe trabalhadora.

Em relação à agenda de direitos das mulheres, é uma restrição principalmente aos nossos direitos sexuais e reprodutivos: uma ofensiva incessante para que não tenhamos autonomia sobre nossos corpos e nossas vidas, uma restrição ao atendimento a vítimas de violência de estupro, toda espécie de restrição dos avanços que a gente conquistou nas últimas décadas no Brasil. Então, as mulheres se organizam contra o Cunha porque ele é a principal figura do conservadorismo no país, porque é a pessoa que leva à frente e que se expressa publicamente, com mais veemência, contra qualquer tipo de política pública que possa garantir autonomia social e econômica para as mulheres.

S: O que interfere mais nesse processo de retirada dos direitos das mulheres: o fato de Cunha representar a bancada evangélica ou as suas outras ligações políticas na Câmara e nos círculos políticos em geral?

TT: Isso está ligado tanto à relação do Cunha com a bancada evangélica quanto às suas relações com os outros grupos que ele representa. Ele representa a chamada ‘bancada da bala’, a bancada ruralista, a bancada dos grandes meios de comunicação e a bancada evangélica também, que se organiza sempre no sentido de restrição de direitos, de um movimento fundamentalista muito grande, que eu acho que hoje se articula coletivamente no Brasil: a agenda comportamental e essa agenda econômica neoliberal.

Cunha aparece como a representação de tudo que há de pior e de mais conservador no Congresso e na sociedade brasileira, e avança uma agenda muito forte de restrição de direitos que é encampada pela bancada evangélica – e aí tem o PL5069, de restrição de direitos relacionados ao aborto legal, o Estatuto da Família, em que ele define a família como homem e mulher, a redução da maioridade penal…

S: Hoje, às 19h, haverá um ato no Centro do Rio de Janeiro em defesa de Dilma no poder, contra o impeachment, e da saída de Eduardo Cunha. O que você espera desse ato? Como as mulheres estão se organizando?

TT: Uma coisa muito legal é que as mulheres têm sido protagonistas nesses movimentos pela saída do Eduardo Cunha e de defesa da Dilma. Tem se falado sobre uma “primavera feminista”, termo de que nem gosto muito, mas nós estamos ocupando as ruas e nós estamos na linha de frente de todos esses movimentos.

Acho que isso tem relação tanto com a figura do Cunha, que é uma expressão muito forte do que é o machismo e de como ele está a todo momento presente nas nossas vidas, quanto com o golpe que o Cunha está querendo dar contra a Dilma Rousseff, que é uma mulher, uma militante histórica do Brasil, que foi muito importante na resistência à ditadura, que foi muito importante na nossa democracia e que foi democraticamente eleita em 2014. Cunha está querendo dar um golpe, organizado com outros setores, com o Aécio Neves, do PSDB, por não aceitar o resultado das urnas, que é um resultado legítimo.

Por isso, acho que a gente tem que defender a Dilma Rousseff independentemente de ter votado nela ou não, de ser alinhado a ela ou não, porque defender a Dilma é defender a democracia, o voto popular e a participação para além de outros interesses de cunho privado, que são normalmente os interesses que o Eduardo Cunha tem colocado. Inclusive, porque é importante colocar que contra a Dilma não tem nenhuma denúncia, não tem nada operando contra ela, e no caso do Cunha é totalmente o oposto disso. Contas dele na Suíça já foram descobertas e confirmadas, há vários imóveis no nome da esposa dele, além de uma série de relações que ele fez desde que ele atua na política, desde 1998, e que comprovam que ele sim é uma afronta à democracia brasileira e ao Estado Democrático de Direito. Dilma deve ser respeitada e nós temos que pressioná-la para que ela possa retomar uma agenda mais progressista e de efetivação de direitos na democracia.

 

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