Deputados do ES protestam contra titulação de terras quilombolas

Fonte: SeculoDiario –

 

“O Incra considerou quase todo o território do município de São Mateus para a demarcação de terras quilombolas, o que eu considero um absurdo”. A declaração é do deputado Freitas (PSB), que participou do debate em protesto contra a demarcação de terras quilombolas em São Mateus. Na última semana, o Instituto Nacional de Reforma Agrária (Incra) reconheceu as terras das comunidades de Serraria e São Cristóvão, em São Mateus como tradicionalmente quilombolas.

Os deputados contestam a interpretação do decreto 4.887/2003, que regulamenta identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades quilombolas. E que, também, determina a retirada das famílias da área no prazo máximo de 90 dias, abrangendo, inclusive, os proprietários que possuem documentação.

Entretanto, alertam os negros, as terras quilombolas foram ocupadas de forma ilegal e este processo se estendeu aos atuais proprietários, que possuem conhecimento sobre a causa e não serão retirados de “suas propriedades” sem a devida indenização baseada no valor de mercado atual.

As terras das comunidades de Serraria e São Cristóvão foram reconhecidas oficialmente no último dia 6, quando foi publicada a Portaria nº 329, do INCRA, no Diário Oficial da União. O processo de reconhecimento chegou a ficar parado em Brasília e era aguardado desde o último dia 9 de julho, data marcada para a publicação da portaria.

Segundo os negros, as terras tradicionalmente quilombolas foram ocupadas de forma irregular por posseiros que há anos lutam para não devolver os direitos a estas comunidades. Como reconhecimento, 45 famílias teriam seu direito à terra reconhecido e poderiam viver e produzir na região, garantindo assim a sua sustentabilidade em 1.129 hectares de terras.

As famílias foram cadastradas durante a elaboração do Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) para levantamento do território daquela comunidade quilombola. O estudo levantou a legitimidade dos direitos quilombolas e ainda a forma como as terras foram ocupadas.

Os quilombolas do Estado são marcados pela expulsão de suas terras por posseiros e grandes produtores, como a ex-Aracruz Celulose, que ocupa cerca de 50 mil hectares de terras quilombolas no norte do Estado. Sem suas terras e forçados a viver dos restos de eucalipto para a produção de carvão, há anos este povo luta para recuperar suas terras.

Neste ano, esta foi a segunda portaria publicada reconhecendo o direito dos negros descendentes de quilombolas no Estado. Em agosto, a área de Retiro (519 hectares) havia sido reconhecida em prol de 77 famílias. A partir do momento em que as terras são devolvidas aos negros, sua titulação é coletiva e inalienável.

Após o reconhecimento do Incra, o processo é ainda enviado à Casa Civil da presidência da República para a edição do decreto presidencial de desapropriação por interesse social da área, possibilitando o início das vistorias de avaliação dos imóveis.

Além da portaria para titular as comunidade de Serraria e São Cristóvão, os negros aguardam ainda o reconhecimento das comunidades de São Domingos, Angelim I e São Jorge. Segundo os quilombolas, há mais de um ano os estudos nas comunidades de São Domingos, Angelim I e São Jorge são aguardados pelas comunidades.

 

A lei e os quilombolas


Os quilombolas têm direito à propriedade da terra por determinação do artigo 68 da Constituição Federal. E o direito à autoidentificação das comunidades quilombolas é reconhecido apenas pelo Decreto 4.887/03. A recém-instituída Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT), fixada pelo Decreto Nº. 6.040, de 7 de fevereiro de 2007, a garante.

O direito à autoidentificação das comunidades quilombolas é garantido, ainda, pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). O Brasil é signatário da Convenção pelo Decreto Legislativo 143, de 20 de junho de 2002, e promulgada pelo Decreto 5.051, de 19 de abril de 2004.

A aplicação da legislação brasileira garantirá aos negros a retomada de 50 mil hectares no Espírito Santo. A maior parte do território ocupado é explorado pela Aracruz Celulose. Os territórios são ainda ocupados por empresas que produzem álcool e açúcar e por fazendeiros.

As pesquisas realizadas pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) por solicitação do Incra apontam que os negros foram forçados a abandonar suas terras: em Sapê do Norte existiam centenas de comunidades na década de 70, e hoje restam 37.

Ainda na década de 70, pelo menos 12 mil famílias de quilombolas habitavam o norte do Estado: atualmente resistem entre os eucaliptais, canaviais e pastos cerca de 1,2 mil famílias. Em todo o Espírito Santo existem cerca de 100 comunidades quilombolas.

O projeto Territórios Quilombolas no Espírito Santo também pesquisou e confirmou serem territórios quilombolas 500 hectares de São Pedro, em Ibiraçu, onde vivem 24 famílias. E 1,5 mil hectares em Monte Alegre, em Cachoeiro de Itapemirim (sul do Estado), onde vivem 102 famílias negras. Nestes dois municípios há grandes fazendeiros ocupando as áreas dos negros.

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