A cada três jovens brasileiros, um não trabalha nem estuda. Os dados são de um levantamento da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e mostram que a proporção dos chamamos “nem-nem” é maior em nosso país do que a média mundial. Cerca de 36% dos jovens brasileiros com 15 a 24 anos se encaixa na categoria.
Essa realidade aparece refletida em vários outros índices preocupantes. Durante a pandemia, a taxa de abandono escolar entre alunos do Ensino Médio mais que dobrou, passando de 2,3% em 2020 para cerca de 5% em 2021, de acordo com o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). No apanhado dos últimos anos, cresceu também o desemprego entre a população jovem, aquela com 18 a 24 anos, na esteira da crise econômica e social que o país enfrenta.
Aqui é importante observar que o Brasil registra uma tendência de queda na taxa de desemprego, mas não conseguimos ainda reduzir a desproporção entre o desemprego jovem e os índices gerais. Levantamentos recentes mostram um país com 22% de desocupação entre pessoas com 18 a 24 anos, mais que o dobro do índice geral, que hoje está na casa dos 9%.
O quadro, portanto, é de uma população jovem com muita dificuldade para prosseguir com os estudos e com poucas perspectivas de inserção no mercado de trabalho, levando a uma explosão no índice de “nem-nem”. Como reverter essa situação?
Não há solução mágica, mas é evidente que a resposta passa pela educação e pela tecnologia. Essa, aliás, é uma percepção compartilhada pelos próprios jovens. Pesquisas no Brasil e na América Latina mostram que a maioria deles considera que a falta de qualificação, de um curso de idiomas ou de uma especialização são fatores decisivos para sua dificuldade em conseguir o primeiro emprego ou em crescer dentro da carreira escolhida.
É justamente nesse ponto que as Edtechs podem ser grandes aliadas. O termo define as startups do setor de aprendizagem, empresas de tecnologia que vêm criando soluções inovadoras para o mercado da educação, não apenas para o chamado ciclo básico (ensinos Fundamental e Médio) como, principalmente, na oferta de cursos de extensão ou profissionalizantes, adequados às demandas dos jovens adultos.
Por atuarem no ambiente digital, as Edtechs conseguem criar soluções personalizadas, mais adaptadas às demandas e limitações de cada jovem. Essa individualização do processo de aprendizagem é, talvez, o maior atrativo do modelo.
Horários de estudo podem ser flexíveis, por exemplo. O mesmo vale para os temas abordados ou a ordem em que determinados conteúdos são vistos: a tecnologia permite que cada um construa sua própria trilha de conhecimento, baseado em suas dificuldades ou afinidades particulares com determinado tema.
A primeira vantagem desse modelo é permitir que o jovem se engaje mais em seu próprio processo de aprendizagem, o que ajuda a reduzir as taxas de abandono dos cursos.
Mas há ainda um fator de redução das desigualdades: sabemos que os jovens de menor renda são aqueles com mais dificuldade para conseguir qualificação e, consequentemente, boas posições no mercado de trabalho. Nesse universo, temos uma maioria esmagadora de jovens pretos e pardos. Há ainda um recorte de gênero, pois, de acordo com incontáveis levantamentos, as jovens negras ocupam desproporcionalmente os cargos mais baixos e de pior remuneração.
As soluções oferecidas pelas Edtechs facilitam a introdução do estudo na rotina dessa população, que muitas vezes têm poucas horas por semana para se dedicar à própria qualificação profissional ou precisaria fazer deslocamentos demorados e custosos para comparecer a um curso “tradicional”, isto é, presencial.
A questão, portanto, é democratizar o acesso a essas ferramentas. O crescimento das Edtechs deve levar a uma redução gradual no preço de seus cursos e serviços, tornando-as mais acessíveis para os mais jovens de baixa renda.
É preciso também aprimorar suas metodologias, não apenas para mensurar mais precisamente a evolução de cada estudante, mas também para garantir o engajamento dessa população com menos acesso aos direitos que, por enfrentar inúmeras dificuldades sociais, profissionais, financeiras ou familiares, apresenta índices maiores de abandono dos cursos.
Os jovens, especialmente os jovens negros das periferias, possuem o potencial e a energia necessária para construírem o presente e futuro do país. A ideia, já transformada em clichê, precisa ser constantemente relembrada se quisermos garantir, via soluções educacionais mais eficientes e tecnológicas, a oportunidade de desenvolvimento profissional da população jovem brasileira.
* Talita Matos é formada em Antropologia e Ciências Sociais pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e possui mestrado em educação inclusiva na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). É cofundadora da Singuê, consultoria de diversidade, equidade e inclusão.
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