Hoje, ouvi um relato sobre um assalto. O ônibus retornava da cidade de Aparecida (SP) e foi interceptado por assaltantes armados com Calibre 12. Quem contou disse que o motorista foi obrigado a conduzir o ônibus até um canavial. Lá, durante um tempo que pareceu a eternidade, os passageiros foram aterrorizados com gritos, ameaça e obrigados a tirar a roupa (ficaram apenas com as roupas íntimas). Devotos e devotas de Nossa Senhora Aparecida, as vítimas rezavam fervorosamente. Longe de apaziguar ou sensibilizar os assaltantes, isto, segundo o relatado, os irritavam ainda mais. “Eles não têm Deus no coração; alguém que comete um ato desse não é de Deus”, disse. Após contar os detalhes, a pessoa, ainda visivelmente traumatizada, falou que não queria que os bandidos fossem presos, mas sim mortos. “É o que mereciam”, enfatizou. Nas circunstâncias, considerei melhor apenas ouvir. Mas fiquei a pensar: como alguém que se afirma cristão pode querer a morte de outro ser humano? A religião não ensina a perdoar?
Por Antonio Ozaí da Silva Do Antonio Zai
Compreendo a revolta. Ninguém sai psicologicamente ileso de uma experiência como esta. A violência causa traumas irreparáveis e destrói os alicerces da ética e da humanidade. Esta pessoa desejou a morte dos bandidos, sem mesmo a prisão e julgamento. Pode ter sido apenas um desabafo, uma manifestação impensada motivada pelo trauma. “Não pensava assim antes do ocorrido” afirmou. Contudo, se esta opinião for mantida, é mais um que, muito provavelmente, será a favor da pena de morte. Relatos como este, que enfatizam a crueldade, a forma desumana de tratamento, reforçam os argumentos de quem defende a pena de morte.
Não faltam argumentos favoráveis à pena de morte. Há até mesmo quem encontre fundamentação bíblica favorável à pena de morte. A religiosidade não é necessariamente empecilho ao desejo de morte. Há quem argumente que o sistema prisional não cumpre a função de ressocialização do criminoso, não regenera. Pelo contrário, alimenta a espiral de violência e mantém a possibilidade da reincidência. Ou seja, a sociedade tem o direito de se proteger e a melhor forma de proteção é “cortar o mal pela raiz”. A morte de determinados indivíduos, considerados irrecuperáveis, seria positivo para o sistema prisional e eliminaria de vez o perigo. Além disso, a pena de morte contribuiria para diminuir a lotação dos presídios – seja pela eliminação física ou pela intimidação, os indivíduos pensariam melhor antes de cometerem crimes – e diminuiria a influência maléfica sobre os demais prisioneiros, ampliando as chances de reabilitação.
Outro argumento é que determinados indivíduos são, por natureza, incapazes de sentir remorso, de empatia, de reconhecer a humanidade no outro; são psicologicamente incuráveis. Não são humanos, mas sim monstros. Não devem, portanto, serem tratados humanamente. Se tiverem chances, inevitavelmente irão reincidir. O melhor para a sociedade é livrar-se deles de forma definitiva. Por que a sociedade deveria arcar com os custos de manter vivos tais indivíduos – ainda que condenados à prisão perpétua?
Talvez o argumento mais forte seja conceber que a pena de morte é justa, ou seja, que ela restitui a justiça à parte atingida. Trata-se de uma leitura enviesada da “lei do talião”: a dor e o sofrimento infligidos à vítima e sua família exigem a morte do assassino. Só assim é possível restaurar o equilíbrio, consolar e amenizar o sofrimento. A punição com a morte é preço cobrado pela vida que foi ceifada.
O ser humano é capaz de matar, e também capaz de encontrar argumentos e justificativas para a morte de quem matou – em nome da justiça. Façamos o esforço da compreensão, pois é demasiadamente humano. Todavia, o que aqui denomina-se de “justiça” é, de fato, vingança. Eis a motivação principal de quem defende a pena de morte: o desejo de vingança!