Pérolas negras

Elas não têm medo de ousar na moda e assumem suas raízes. Conheça os perfis que andam ditando a rede e o que eles querem mostrar

Rihanna é uma daquelas garotas em que todo mundo se inspira – ou admira, em se tratando de moda. Na última semana, nossos olhos se voltaram novamente para a diva mor: Ela foi a escolhida para ser a primeira mulher negra a protagonizar uma campanha da Dior, maison que sempre prestigia nas temporadas, sentadinha na fila A. Méritos à parte, a cantora não se esqueceu de dizer algo que realmente muita gente queria ouvir. “É muito importante para mim, para minha cultura, para várias jovens meninas de qualquer raça”, declarou em entrevista à MTV Americana.W

PANDORA - 19.03.2015Solange Knowles in New York Fashion Week SS13FOTO : Event Photos NYC / Creative Commons
PANDORA – 19.03.2015 Solange Knowles in New York Fashion Week SS13FOTO : Event Photos NYC / Creative Commons

Na mesma onda de valorização e de levar cada vez mais a beleza negra ao topo do pódio, a carioca Farm buscou inspiração justamente na cultura afro para sua coleção de inverno. A campanha, intitulada “Black Retrô”, foi clicada só com modelos negras, incluindo as mineiríssimas Mari Calazan e Natiele Alves. Sem esquecer que a atriz Lupita Nyong’o, no ano passado, foi eleita a mulher mais bonita do mundo, pela revista norte-americana “People”. No mesmo momento em que a mídia começa a divulgar cada vez mais esses movimentos, muitas garotas (seriam as novas it-girls?) ganham destaque na internet e lançam tendências – que extrapolam a rede, inclusive – para quebrar estereótipos e valorizar suas raízes com projetos bacanérrimos. E o melhor: se orgulham de tudo isso, de tal maneira que se transformam em novas fontes de referências sobre beleza.

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E por falar em beleza, vale um dos destaques dessa nova safra de it-girls: A jovem de 27 anos Magá Moura, baiana que mora em São Paulo e faz sucesso na web com seu blog homônimo, que partilha tudo sobre “life e style”, como ela mesma intitula, mas sem fugir do usual “look do dia”, de maneira mais autoral, digamos. “Não estou copiando ninguém, tenho a minha própria identidade, e ela é forte e única como o meu estilo. Como cool hunter observo tudo, e como Magá adapto o que me interessa a minha maneira de ser e vestir. Mas musa mor e eterna pra sempre é a Rihanna”, confessa.

Tranças, a sensação

Magá não precisava nem de afirmar que estilo para ela não requer cópias ou esforço, afinal, as suas belas tranças coloridas – estampadas em nossa capa – já viraram sua marca registrada desde 2011. As madeixas trançadas têm nome: box braids, que nada mais são do que as antigas rastafári, dos anos 90, mais precisamente do Brooklyn, em Nova York, e que agora são repaginadas e fazem sucesso nas cabeças de famosas como Solange Knowles e Willow Smith, celebridades que estão na lista de “desejos” inspiradores dessas garotas. Afinal, não deixam de ser divas internacionais, o que vale, é claro, copiar um look aqui, outro acolá, pelo Instagram.

“Depois de sofrer uma agressão capilar absurda por causa de um processo químico terrivelmente mal-sucedido, uma cabeleireira mais experiente me deu duas opções: raspar ou fazer tranças com o pouco que me restava de cabelo. Fiquei superabalada! Foi quando voltei pra casa e vi a Solange Knowles no clipe ‘Party’, de sua irmã Beyoncé. Fiquei apaixonada por ela, maravilhosa “batendo trança” e corri pro salão. Durante uns anos passei por tranças pretas, douradas, californianas, ameixa, loironas… Me encontrei, capilarmente falando”, conta Magá orgulhosa em saber que seu estilo serviu de inspiração pra outras meninas, que assumem suas madeixas e deixam a chapinha e seu “estica e puxa” de lado, inclusive. Comportamento que, segundo Magá, sempre existiu, mas que não era divulgado da maneira como deveria. “Não se trata de um ‘novo padrão de beleza’, estamos há anos assumindo nossas raízes, usando nossos cabelos crespos como cabelos crespos, apenas não havia atração da mídia por nós”, acredita

Livre, leve e solto

Se por um lado algumas meninas desfilam cada vez mais cores e penteados com as suas box braids, por outro, as madeixas crespas têm vez e também voz. Todas elas prezam, em comum, maneiras simples de como amar os seus cabelos e compartilham tudo na web. Um dos perfis mais representativos é o Meninas Black Power, um coletivo que promove ações a fim de valorizar a cultura negra, inclusive para a eliminação do racismo, e conversa com as mulheres que querem assumir os cabelos crespos.

“Nas redes sociais, trabalhamos para que aconteça a circulação do movimento afroafirmativo em especial à mulher negra. Falamos de moda e beleza, olhando do ponto de vista político, do posicionamento, e centralizando todas as informações nessa mulher que muitas vezes não é representada em outros meios”, diz a carioca Élida Aquino, criadora da fanpage no Facebook, e que assume suas madeixas mais do que por uma questão de estilo, e sim por ser lindo assim, naturalmente. “Curto muito penteados, e ultimamente tenho praticado várias amarrações de turbantes. Sobretudo gosto de cuidar dele. Faço tratamentos regulares, sempre tento testar novos produtos e receitas. Meu ideal é conhecê-lo um pouco mais”, confessa.

Reconhecimento

De acordo com a consultora e professora do curso de design de moda da Fumec Carla Mendonça, esse movimento impulsionado por essas meninas era previsível com a emergência e visibilidade das diferenças em geral. “Além de ser interessante, acho que representa uma faceta mais bonita da moda, que é a de deixar ser quem você é e te fornecer meios para ser feliz, e não para negar quem e como você é. Acaba sendo até mesmo uma forma de posicionamento político por meio da estética”, explica.

Batendo na mesma tecla está a stylist Lídia Thays, que lançou com outros amigos (Suyane, Catarina e Santiago) uma espécie de revista virtual, a Catsu, que traz ensaios lindíssimos com pegada de editorial de moda gringa – um desses cliques foram para na nossa capa e recheio, inclusive. “Nosso trabalho busca retratar a moda brasileira com outros olhos, mostrando que aqui temos uma identidade tão forte quando as referências estrangeiras e, o melhor, trazendo mistura: a essência do povo brasileiro”, explica Lídia.

Filha de cabeleireira, Lídia (ou melhor, Lilly B., como é conhecida virtualmente) explora as mil e uma possibilidades de sua cabeleira, hoje exibindo um black power com alguns fios coloridos, com orgulho, um processo demorado para deixar os fios naturais. “Em tempos onde apenas o cabelo liso era sinônimo de beleza, modernidade e aceitação social, hoje temos ganhado espaço pra liberdade de escolha, mas ainda é um caminho longo a percorrer. Quando pude usar meu cabelo natural, vi que na verdade minha imagem se tornou apenas mais autêntica do que eu mesma imaginava”, finaliza.

Se “estilo” a define? Saiba que não é o melhor caminho. “Não gosto nem de usar a palavra ‘estilo’ porque acredito que o que me define vai muito mais pela tradução que aquilo faz sobre mim e sobre quem sou, independentemente de ser aprovado na moda”, diz, citando referências como Solange Knowles, Rihanna e Fka Twigs.

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