Raça e educação por Sueli Carneiro

Os estereótipos dos professores a respeito da educabilidade das crianças negras e pobres funcionam como profecias que se auto-realizam. Esses estereótipos estão na base de um sistema de mensagens que contribui a configurar a auto-estima das crianças. Essa parece ser uma área crucial de intervenção; já que não se destrói esse gargalo no sistema educacional brasileiro, continuará a funcionar um dos principais mecanismos de transmissão intergeracional das desigualdades raciais (Carlos Hasenbalg).

Por Sueli Carneiro

O racismo e a discriminação produzem exclusões no acesso à educação: nas possibilidades de adentrar e concluir os ciclos formais de escolaridade; de ver reconhecida e valorizada a diversidade das contribuições dos diferentes grupos étnicos e raciais e suas culturas no patrimônio da humanidade.

O reconhecimento desse problema na sociedade brasileira vem promovendo o desenvolvimento de inúmeras ações pelas organizações negras e outras instituições da sociedade civil empenhadas na superação do racismo e das desigualdades raciais presentes no âmbito da educação. Essas ações expressam-se em diferentes dimensões da temática da educação, enfocando criticamente a educação formal, o ensino público, os instrumentos didáticos, a formação de professores.

No que tange ao livro didático, apontaram-se a sedimentação de papéis sociais subalternos e a reificação de estereótipos racistas, protagonizados pelos personagens negros. Demonstra-se a medida em que essas práticas afetavam as crianças e adolescentes negros e brancos em sua formação, destruindo a auto-estima do primeiro grupo e, no segundo, cristalizando imagens negativas e inferiorizadas da pessoa negra, em ambos os casos empobrecendo o relacionamento humano e limitando as possibilidades exploratórias da diversidade racial/étnica/cultural.

Em relação aos currículos escolares, chama-se a atenção para a ausência dos conteúdos ligados à cultura afro-brasileira e à história dos povos africanos no período anterior ao sistema escravista colonial.

Várias iniciativas vêm sendo desenvolvidas de inclusão desses temas nos currículos formais de certas escolas, ou mesmo em redes de ensino de algumas cidades brasileiras. Entretanto, esbarra-se no problema da falta de formação do professorado para tratar tais questões em sala de aula, o que evidencia a urgência da capacitação de educadores e a produção de recursos didático-pedagógicos para esse fim.
Uma das experiências mais originais para a reversão das desigualdades no acesso à educação foi a criação de cursinhos pré-vestibulares para estudantes negros, cuja relevância se pode medir pela vertiginosa expansão que sofreram em todo o país e que vem com sua prática impulsionando o debate sobre a necessidade de políticas públicas para a democratização do ensino universitário. A emergência dos cursinhos decorre do fato de que apenas 2% dos negros têm curso superior, enquanto 11% dos brancos alcançam esse grau de instrução.

Apesar das resistências que envolvem o tema das ações afirmativas, projetos desse tipo começam, ainda que timidamente, a ser desenvolvidos a partir de parcerias estratégicas. Entende-se por ação afirmativa qualquer política que vise favorecer grupos socialmente discriminados em função de seu pertencimento racial/étnico, religioso, seu sexo e orientação sexual, e que, em decorrência disso, experimentem situação desfavorável em relação a outros segmentos sociais. As premissas da ação afirmativa são o reconhecimento de que pessoas sujeitas à desigualdade devem receber tratamento diferenciado e a promoção da justiça social.

O projeto Geração XXI, iniciativa da Fundação BankBoston em parceria com o Geledés – Instituto da Mulher Negra e a Fundação Cultural Palmares desenvolvida em São Paulo, é um projeto que tem por objetivo assegurar a 21 adolescentes negros de famílias de renda entre um e três salários mínimos, oriundos de escolas públicas e com histórico escolar excelente, a possibilidade de se formarem na carreira que escolherem.
É um projeto de nove anos de duração que, além de apoiar esses jovens até a conclusão do nível universitário, oferece capacitação em língua estrangeira, em computação, formação para a cidadania, seguro-saúde, alimentação e apoio às suas famílias para que elas possam prescindir do trabalho desses jovens e mantê-los na escola.

O projeto Geração XXI é uma experiência-modelo de ação afirmativa, por meio do qual se procura sensibilizar outras empresas brasileiras a incluir a promoção da igualdade racial entre as suas responsabilidades sociais.

Entre as visões que informam o senso comum, e grande parte dos cientistas sociais, a mais corrente é a que considera a situação de inferioridade social dos negros como fruto da magnitude do problema social brasileiro, sendo os negros mais apenados nesse contexto, pelo handicap negativo acumulado em função da escravidão.
Para o sociólogo Carlos Hasenbalg, ‘‘a interpretação das desigualdades raciais com as desigualdades sociais, econômicas e regionais sugere que, a curto, médio e longo prazos, políticas destinadas a combater a pobreza e melhorar a distribuição de renda deverão ter um impacto positivo sobre as desigualdades raciais, mesmo quando essas políticas não tenham uma inspiração especificamente racial (…) Um problema com os programas redistributivos desse tipo (programas de complementação de renda para famílias com filhos de idade escolar) é que, em princípio, eles não interferem com as práticas discriminatórias que provocam as desvantagens raciais”.
A sociedade civil vem fazendo a sua parte. Agora é com o Estado.

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