Espectadores se concentram em torno das obras de Cheryl McIntosh na Casa Ernst Moritz Arndt, uma sucursal do Museu Municipal de Bonn. Quem quer ver todas as instalações e colagens tem que ser paciente: sua exposição Counter thoughts. Counter images (Pensamentos contrários. Imagens contrárias) tem atraído grande atenção.
O evento faz parte do projeto da cidade alemã Aktive Erinnerungskultur (Cultura Ativa da Memória), que enfoca aspectos do colonialismo, racismo, resistência e reconhecimento. Natural da Jamaica, McIntosh justamente usa sua arte para abordar a história colonialista.
Numa instalação à entrada da vila, o público é logo confrontado com palavras do primeiro chanceler federal da Alemanha, Konrad Adenauer, que comandou o país entre 1949 e 1963: “O Reich Alemão tem que se empenhar de todo modo pela aquisição de colônias. No próprio Reich não há espaço suficiente para a grande população.”
Essa citação de 1927, antes de o político conservador assumir a chefia de governo, é provavelmente desconhecida pela maioria dos alemães. Segundo a artista jamaicana, estes, aliás, sabem muito pouco sobre a história colonialista de seu país: “Devia haver mais discussões sobre o assunto. As escolas deveriam tratar mais dele, para que as crianças tenham ciência do que aconteceu 100 anos atrás.”
Passado colonial quase obliterado
De 1885 a 1919, a Alemanha foi a terceira maior potência colonial da África. Suas possessões incluíam os atuais Namíbia, Burundi, Ruanda e Tanzânia (sem Zanzibar), além do Togo, Camarões e áreas de Gana. Durante a conquista dos territórios, os ocupadores esmagaram brutalmente toda resistência.
Resquícios desse período ainda se encontram na Alemanha. O comandante militar Lothar von Trotha, que desempenhou um papel crucial em reprimir a resistência e as revoltas, está, por exemplo, enterrado em Bonn. Na qualidade de chefe das tropas coloniais da África Sudoeste Alemã, hoje Namíbia, em 1904 ele expediu uma “ordem de extermínio”, resultando na supressão sangrenta da rebelião do povo herero, com o assassinato de milhares de civis.
Calcula-se que até 100 mil representantes dos herero e nama tenham sido vítimas dos crimes colonialistas alemães. Mas o túmulo de Von Trotha não traz nenhuma menção ao passado assassino do militar.
Um frequentador de Counter thoughts. Counter images comentou a atualidade do tema: “A história colonial ainda nos marca hoje em dia, por isso acho que é muito importante educar e informar a respeito.” Outro explicou onde ainda vê acima de tudo a influência da era colonial.
“Todo o nosso mundo do consumo é baseado em ter sido possível nos locupletarmos com os recursos de outras regiões do mundo ao longo de certos períodos, ou nos beneficiarmos na troca de mercadorias, e vivenciamos isso ainda hoje em dia.”
“É preciso iniciar uma narrativa e uma reflexão”
Para McIntosh, os efeitos da era colonial vão muito além de estruturas econômicas, devido à desigualdade das relações de poder. Portanto esse passado está também indissoluvelmente ligado à discriminação racial na Alemanha: “Enquanto pessoa negra, já fui verbalmente atacada. Para mim, isso é colonialismo.” Talvez por isso, desde o início racismo e colonialismo foram a força motriz por trás de seus trabalhos.
Uma visitante que se ocupa intensamente do racismo frisa a importância desse tópico: “É mais do que claro que o racismo desempenha um papel grande na nossa sociedade, o modo como crescemos e como o passado é. É importante tomar consciência de quando se pensa ou age de modo racista.”
Após quase dez anos elaborando esses temas de forma artística, McIntosh torce para que suas obras agucem a percepção que os espectadores têm do passado colonialista e gere maior conscientização sobre suas consequências: “Eu gostaria que a gente passasse a falar e trocar ideias sobre o que aconteceu no passado. Acho que precisamos iniciar uma narrativa e uma reflexão.”
Counter thoughts. Counter images vai até 28 de março de 2024 na Casa Ernst Moritz Arndt, em Bonn.