O Brasil é arrastado para o centro do debate sobre a violência policial. Num informe apresentado nesta segunda-feira pela ONU e realizado a partir da morte de George Floyd, nos EUA, a violência da polícia brasileira é citada como um dos casos no qual existe racismo sistêmico nas forças de ordem diante das ações e morte de afrodescendentes.
A ONU fez um apelo para que governos não deixem os responsáveis pelos crimes sem punição e alertou que a atual situação, no Brasil e no mundo, é insustentável.
Nas semanas que seguiram ao caso do assassinato do americano, em 2020, uma resolução foi aprovada no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, dando um mandato para que a entidade realizasse uma investigação sobre a violência policial e racismo.
Ainda que o trabalho se concentre principalmente nos EUA, a opção da ONU foi a de ampliar as investigações e avaliar o comportamento da polícia em outras partes do mundo. Assim, o governo brasileiro passou a ser alvo de pressão por conta das seguidas denúncias de execuções e crimes.
No documento que foi resultado da investigação, o país é usado como exemplo de um racismo sistêmico por parte da polícia.
Um dos casos citados como exemplo desse comportamento é de Luana Barbosa dos Reis, morta em 2016 em Ribeirão Preto. Negra, lésbica e mãe, ela se tornou símbolo de mobilização social. Outro caso é de João Pedro Matos Pinto, adolescente morto em uma operação da Polícia Federal e da Polícia Civil em São Gonçalo em 2020.
A ONU ainda cita Marielle Franco, vereadora carioca assassinada, como um exemplo de pessoas que tentaram se levantar contra a situação da população negra.
Em outro trecho, o documento ainda cita dados nacionais do Brasil, indicando como a mortalidade em 2019 por conta de intervenções policiais foi 183,2% superior para afro-brasileiros que para a população branca.
Além dos casos brasileiros, o informe denuncia o racismo das forças de ordem e traça um duro perfil da situação da população negra em diferentes partes do mundo, como na Colômbia e EUA.
Itamaraty tentou enfraquecer resolução da ONU
Não por acaso, quando a resolução foi aprovada há um ano, o governo de Jair Bolsonaro foi um dos poucos no mundo a ficar ao lado do presidente Donald Trump e tentar esvaziar o mandato investigador. Naquele momento, a então embaixadora do Brasil na ONU, Maria Nazareth Farani Azevedo, foi uma das poucas a fazer um discurso no qual sugeria que o papel da polícia fosse reconhecido de forma positiva. Seu discurso foi alvo de duras críticas por parte de embaixadores estrangeiros.
Não apenas a ação da diplomacia brasileira ajudava o então aliado na Casa Branca, mas Brasília também considerava que uma eventual investigação global colocaria o foco sobre a violência policial no Brasil e racismo.
Genocídio negro
Nos debates nesta segunda-feira na ONU, o Brasil ainda vai ser denunciado pela entidade Justiça Global por genocídio da população negra, principalmente de sua juventude.
Durante a mesma sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, outros dois informes apontarão para a violência policial no país. Num deles, sobre execuções sumárias, o Brasil é colocado ao lado de Venezuela, Filipinas e Nigéria.
“O maior número de mortes por policiais ocorreu no contexto das chamadas guerras contra drogas e contra atividades criminais, levando a relatoria a emitir dezenas de cartas de pedidos de ação urgente sobre assassinatos ilegais de residentes de comunidades pobres nas Filipinas, Venezuela, Brasil, Nigéria e outros”, aponta.