Os seres humanos só têm uma casa, que estão a destruir, e ainda não perceberam que são “da mesma família”, que, na origem, é africana, afirmou hoje o arcebispo sul-africano Desmond Tutu, numa conferência na Fundação Gulbenkian, em Lisboa.
Recorrendo a histórias bíblicas e com o riso que lhe é característico, Desmond Tutu realçou que uma das “lições de deus” é a de que “não podemos ser humanos em isolamento, precisamos dos outros para nos complementar”.
Acreditando que os seres humanos são originalmente bons e que é “um incrível privilégio fazer deste o nosso mundo”, o Nobel da Paz sul-africano falou do “cuidado pelo outro”, que “é da mesma família”, para, após uma gargalhada daquelas que o caracterizam, dizer: “Lamento informar-vos, mas somos todos africanos.” “Imaginem, se realmente acreditássemos nisto, investiríamos tanto em instrumentos de morte e defesa como fizemos até agora?”, questionou, comparando os “escandalosos orçamentos” gastos em defesa e armamento à pequena parte canalizada para “dar água limpa e comida suficiente às crianças do mundo”.
Manifestando-se impressionado com os jovens e com o seu “incrível idealismo, acreditando que é possível ter um mundo diferente”, o arcebispo e Nobel da Paz referiu-se ao movimento Occupy Wall Street, nos Estados Unidos, para realçar que a falta de tolerância com as desigualdades “não está a acontecer só em países pobres, mas em todo o lado”.
Desmond Tutu partilhou a conferência “Diálogos sobre a paz e o desenvolvimento sustentável” com Jorge Sampaio, que, reconhecendo que “os indivíduos são essenciais”, sublinhou que “nada realmente acontece sem esforço coletivo”. “Temos diálogo todos os dias, mas o diálogo que interessa é sobre as diferenças e sobre o que temos em comum, aquele que obriga a negociar o tempo todo”, destacou o ex-Presidente da República português e atual presidente da Aliança das Civilizações.
Sublinhando que “uma crise em algum lado é uma crise em todo o lado”, Jorge Sampaio afirmou que importa questionar se a democratização, “uma necessidade absoluta”, tem de “ser apenas ocidentalização”, antecipando necessidades de “compromisso”. Elogiando o atual momento de ativismo, Jorge Sampaio justifica os recentes protestos realizados um pouco por todo o mundo como a prova de que desenvolvimento sustentável e justiça social “são duas coisas básicas”.
Enumerando os números negros da pobreza, da literacia, da saúde, da água e do saneamento, recordou o último encontro com Desmond Tutu, em 2008, na Faixa de Gaza, “sítio onde não é fácil entrar e de onde não é fácil sair”.
Reconhecendo não ter a capacidade para citar as escrituras sagradas, o assumidamente não crente Jorge Sampaio reconheceu que é preciso ter “fé”, no sentido de “capacidade para acreditar”.
Fonte: SIC Notícias