O que paciente vivenciou na ginecologista é chamado de racismo científico

Recentemente, uma matéria circulou destacando um incidente lamentável envolvendo uma ginecologista que fez um comentário preconceituoso e equivocado sobre o odor íntimo das mulheres negras.

Como médica ginecologista e mulher negra, já atendi diversas pacientes que, ao entrarem no consultório, sentiram alívio e conforto ao me ver, pois já foram vítimas de situações de racismo ao longo de suas vidas.

Infelizmente, muitas vezes a falta de capacidade, insensibilidade ou simples falta de atenção de profissionais de saúde resultam em justificativas inadequadas que afetam a qualidade do atendimento prestado.

Frases como “mulheres negras têm odor mais intenso” ou “mulheres negras têm mais corrimento vaginal” tornam a consulta ginecológica, um momento extremamente íntimo e vulnerável, algo ainda mais angustiante.

Isso faz com que as pacientes se sintam culpadas por qualquer desfecho negativo, seja por uma suposta fraqueza ou pela cor da pele.

O que essa paciente vivenciou é conhecido como racismo científico. É fundamental entender que o racismo científico é considerado crime. Negar a igualdade entre as raças, disseminar teorias infundadas e propagar o preconceito racial são atos ilegais.

O racismo científico é uma triste realidade que precisa ser enfrentada. Ao longo da história, teorias pseudocientíficas foram utilizadas para tentar justificar a suposta superioridade de determinadas raças, causando danos profundos e perpetuando desigualdades.

É importante compreender que o racismo científico não possui fundamentos reais e é apenas uma forma cruel de discriminação. Devemos nos unir na luta contra essa prática.

Ao pesquisar sobre o assunto, diferentemente da médica que alegou ter encontrado artigos que corroboram sua tese infundada sobre o odor das pessoas negras devido à melanina, não encontrei estudos desse tipo no Pubmed, um dos maiores bancos de dados do mundo.

Encontrei apenas um intitulado “Contribuição da síntese do óxido nítrico para a vasodilatação cutânea e sudorese em homens de ascendência negra-africana e caucasiana durante o exercício no calor”, que, embora não esteja diretamente relacionado à afirmação da médica, foi o mais próximo com um bom desenho metodológico comparando brancos e negros em relação à atividade física e sudorese.

No entanto, a conclusão desse estudo foi de que a etnia por si só não influencia a vasodilatação cutânea dependente do óxido nítrico e a sudorese em homens jovens e saudáveis de ascendência negra e caucasiana durante o exercício em ambiente quente e seco.

Devemos construir um mundo onde todas as pessoas sejam respeitadas e valorizadas, independentemente de sua raça ou etnia.

Quero oferecer meu acolhimento e espaço para trocas a todas as pessoas que já se sentiram violentadas durante um atendimento médico.

É importante lembrar que, independentemente das opiniões alheias, sua saúde e bem-estar são prioridades. Juntos, podemos lutar por um sistema de saúde inclusivo e igualitário.


Referências:

Muia, C. M., McGarr, G. W., Schmidt, M. D., Fujii, N., Amano, T., & Kenny, G. P. (2019). Contribution of nitric oxide synthase to cutaneous vasodilatation and sweating in men of black-African and Caucasian descent during exercise in the heat. Experimental physiology, 104(12), 1762-1768. https://doi.org/10.1113/EP088115

+ sobre o tema

Por que mandaram matar Marielle Franco? Essa agora, é a pergunta que não se cala…

Seis anos depois e finalmente o assassinato de Marielle...

Mulheres sambistas lançam livro-disco infantil com protagonista negra

Uma menina de 4 anos, chamada de Flor de...

Poesia: Ela gritou Mu-lamb-boooo!

Eita pombagira que riscaseu ponto no chãoJoga o corpo...

para lembrar

Outubro rosa: saiba como identificar o câncer de mama

Por: MAYARA RABELO Os números assustam. Estimativas do Inca (Instituto Nacional...

DIU de cobre: Os mitos que rondam este contraceptivo injustiçado

Eu sou a louca do DIU. Confesso. Como médica...

Casos de câncer devem aumentar 77% até 2050 ligados ao envelhecimento da população

À medida que a população mundial envelhece, um novo relatório...

O isolamento é um fantasma presente: mulheres mães negras e formas de insurgência na Pandemia

Primeiramente, eu peço licença as minhas ancestrais e as...
spot_imgspot_img

Brasil finalmente considera mulheres negras em documento para ONU

Finalmente o governo brasileiro inicia um caminho para a presença da população afrodescendente no processo de negociação de gênero na Convenção-Quadro das Nações Unidas...

Tempo para início de tratamento de câncer de mama é 3 vezes maior que o previsto em legislação

O tempo médio para o início do tratamento de câncer de mama no SUS (Sistema Único de Saúde) é quase o triplo do período previsto pela Lei...

Casos de câncer devem aumentar 77% até 2050 ligados ao envelhecimento da população

À medida que a população mundial envelhece, um novo relatório alerta que o número de pessoas com câncer pode aumentar 77% até 2050. No relatório, publicado na quinta-feira...
-+=