Documentário “As Cores da Serpente” terá estreia nacional em março

As Cores da Serpente, um documentário de Juca Badaró

Por Silvana Inácio para o Portal Geledés 

O desafiador processo artístico de jovens grafiteiros em Angola, com a preocupação de fazer um registro que traduzisse o significado de colorir os Murais da Leba, uma estrada histórica com cerca de 20 quilômetros, na sinuosa Serra da Leba, no país africano, é a essência do documentário As Cores da Serpente, do diretor brasileiro Juca Badaró, que será lançado em São Paulo, com a presença de diretores e artistas, no dia 21 de março.

O filme também entrará em exibição na mesma data em Brasília (DF), Porto Alegre (RS), Curitiba (PR). Diretores e artistas também participarão das estreias no Rio de Janeiro (RJ), em 28 de março, e em Salvador (BA), em 4 de abril.

Não se trata de um documentário contemplativo, nem expositivo, porque não se propõe a defender uma linha de pensamento à empreitada, segundo o diretor, até a sua conclusão.

ARTISTAS DO Coletivo Murais da Leba DURANTE O desafio dE realizar a maior intervenção de grafite do continente africano, NA serra da leba, em angola: 6.000 M2 de arTE urbana (Cena do documentário “As Cores da Serpente”)

A pintura dos 6.000 m2 de paredões foi realizada entre agosto e novembro de 2015. O Coletivo Murais da Leba foi formado por 27 artistas angolanos, das províncias de Luanda, Namibe e Huíla. Em  2018, os grafiteiros baianos Annie Ganzala, Ananda Santana e Eder Muniz participaram de uma nova pintura no mural, por meio do projeto África e a Diáspora – Novas Conexões.

“Trabalhei na área de comunicação em Angola, e quando conheci o projeto, em 2015, resolvi registrar porque percebi que o que move os jovens artistas angolanos é a busca da própria identidade e das tradições, num país que viveu mais de 30 anos em guerra”, conta Badaró, com carreira consolidada em produções de TV, documentários e filmes de ficção no Brasil e no exterior.

A estrada-cenário de As Cores da Serpente começou a ser construída pelos portugueses no final do século XIX e só foi concluída às vésperas da independência de Angola, em 1974. Tornou-se um dos mais conhecidos pontos turísticos do país, na Serra da Leba, uma deslumbrante formação montanhosa que separa as províncias da Huíla e do Namibe. A via era necessária para facilitar o transporte de mercadorias e pessoas entre as duas províncias. O simbolismo e a mística do lugar são indescritíveis, inspiração que levou Badaró a imaginar um registro afetivo do processo de criação dos jovens artistas do grafite com suas motivações e desejos de transformação, desafiados a transfigurar os murais curvilíneos.

“Se imaginarmos uma intervenção artística capaz de dialogar com a história e o meio ambiente, estamos a falar de um bom motivo para fazer um filme”, defende o diretor.

Maior grafite da África

A ideia de criar a maior intervenção de grafite na África é do jornalista Vladimir Prata, que completará 40 anos em 8 de março. Nascido na capital Luanda, é diretor Jornal de Angola (o matutino oficial do país), na província de Namibe . Prata também foi o articulador da iniciativa. “Lançado em 2015, por ocasião do 40º aniversário da Independência Nacional de Angola, o projeto teve o propósito de transformar as pinturas da Serra da Leba na maior obra de arte em África a céu aberto”, conta.

“O Mural da Serra da Leba foi concebido para ser contínuo. Ou seja, de forma periódica, realizarmos novos grafites,  substituição daqueles que vão se deteriorando, entendendo que é um mural a céu aberto, submetido a alterações climáticas. Dos 6 mil metros quadrados de parede previstos, faltam cerca de 2 mil a pintar”.

O documentário também passa pelas experiências de artistas locais que trocaram conhecimento com grafiteiros de outros países, convidados pelo Coletivo.

Seja por meio da formação ou do intercâmbio cultural, a participação de artistas estrangeiros exerce um papel imprescindível no sentido de transcender os limites da arte de rua em Angola.

O objetivo maior é compreender o que se passa na consciência de artistas como esses, acostumados a não ter voz, e se vêm como protagonistas da maior intervenção artística de Angola numa transformação simultânea, que acontece dentro deles e no ambiente ao redor. Nesse sentido a narrativa do filme se apropria de uma linguagem em que a estética dos planos e o discurso fragmentado dos personagens dizem muito mais do que uma construção argumentativa, uma proposta cinematográfica condizente com a grandeza e poesia da Serra da Leba.

Um dos artistas protagonistas de As Cores da Serpente é o angolano António “Thó” Simões, de 46 anos. Ele pinta, faz colagens, cria arte urbana e digital, performances, instalações, filmes e fotografias. Filho da primeira geração de artistas do pós-independência, considera fundamental a passagem de conhecimentos e técnicas para os jovens artistas que entram no mundo da arte, encarando todo tipo de dificuldade para se estabelecer.

Artista angolano Rafa (Divulgação/As Cores da Serpente)

Um dos grafiteiros mais jovens a participar do projeto é o também angolano Manuel André Pedro, “Rafa”. Ele faz arte desde tenra idade, afirmando que nasceu com esse dom, o qual foi aperfeiçoando. “A arte é meu escape; eu vivo pela arte, assim como ela em mim vive”, diz.

O filme foi produzido com recursos próprios e apoios financeiros. A Distribuição, pela Salvador Filmes e produtora Domínio Público, recebeu verba de incentivo fiscal. do Fundo Setorial do Audiovisual, por meio do edital Prodecine 03, de Distribuição.

 

Roda de Conversa e grafite em São Paulo

 

Para marcar o lançamento do documentário As Cores da Serpente, o diretor brasileiro Juca Badaró, o jornalista Vladimir Prata e o artista Rafa, ambos angolanos, participam de uma Roda de Conversa no quilombo urbano Aparelha Luzia, em 17 de março, às 18h, na rua Apa, 78, Centro de São Paulo (SP). Com o tema Arte e Ancestralidade mais arte urbana e produção artística afrodescendente, eles debaterão com os convidados artistas brasileiros Diego Mouro e Zeh Palito. Outra ação do lançamento será a produção de um grafite em 15 e 16/03, em São Paulo, capitaneada pelo Instagrafite.


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